🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Novembro de 2023. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

Debate qualificado sobre inovação é essencial para a construção de um futuro humano

Por Alexandre Aragão

1 de novembro de 2023, 18h12

Desde que foi lançada, há quatro meses, a Plataforma tratou de assuntos tão diferentes entre si quanto direito antitruste, futebol, satélites, o Supremo Tribunal Federal e novelas.

A partir de entrevistas, livros, eventos públicos e documentos, este espaço busca sempre analisar e explicar parte da bagunça que é o mundo digital. A edição de hoje é sobre tudo ao mesmo tempo agora.


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No texto “A Metrópole e a Vida Mental”, clássico da sociologia, o alemão Georg Simmel escreve sobre o efeito que os crescentes estímulos da vida moderna causam nos indivíduos. O ano era 1902.

Naquela época, a revista ilustrada Fon Fon — cujo título era uma onomatopeia da modernidade — estreava no Rio de Janeiro e declamava:

Salve-se quem puder! Arreda! Arreda!
Vim de automóvel para chegar cedo!
E hei de tudo levar de queda em queda
Pois de tudo saber trago o segredo!

O atropelo da tecnologia já fazia estragos.

Mais de um século depois, a humanidade novamente está diante de inovações que abalam estruturas sociais. Na segunda (30), o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, anunciou uma ordem executiva que trata do “desenvolvimento e uso seguro, protegido e confiável de IA”.

A principal medida do texto, que tem força de lei, é obrigar empresas a informarem o governo sobre modelos de IA que estejam treinando a partir de determinada capacidade. Na prática, a regra estabelecida deve abarcar a próxima geração de modelos. A ordem também define quais órgãos do governo são responsáveis por cada aspecto da fiscalização.

“Eu juro por Deus, dê uma olhada nisto. É alucinante”, exclamou Biden, 80 anos, ao comentar que golpistas podem emular a voz de qualquer pessoa usando apenas três segundos de gravação. “Todos têm o direito de saber quando o áudio que estão ouvindo ou o vídeo a que estão assistindo foi modificado por inteligência artificial”, ele defendeu.

Especialistas que acompanham o debate nos Estados Unidos apontam que a ordem executiva é um início promissor para a regulação da tecnologia, mas não substitui eventuais projetos do Legislativo. A iniciativa do governo Biden deu amplo espaço para as empresas se manifestarem, e o texto final contempla riscos e oportunidades (Plataforma #15).

No Brasil, o tema não ocupa a mesma centralidade que tomou nos Estados Unidos e ocorre principalmente em círculos especializados, como a partir de falas de autoridades e na comissão sobre o tema no Senado (Plataforma #07 e Plataforma #16).

A tramitação de projetos de lei relacionados à economia digital tem permanecido estacionada enquanto o principal deles, o PL 2.630/2020, parece distante de chegar ao plenário. Não há consenso sequer sobre um eventual arranjo regulatório (Plataforma #05).

Enquanto isso, as timelines continuam coalhadas de mentiras sobre temas do noticiário — no momento, o conflito entre Israel e Hamas — e ajudando a financiar o ecossistema desinformativo (Plataforma #04).

No X, sem funcionários de moderação e segurança e contando apenas com “notas da comunidade”, Elon Musk manteve o poder e jogou fora a responsabilidade de pautar conversas relevantes (Plataforma #01, Plataforma #14).

Musk que, aliás, tem outros interesses envolvendo Estados nacionais. A Starlink, que revolucionou o acesso à internet na Amazônia e passou a oferecer planos corporativos no Brasil (Plataforma #09), é peça-chave na guerra entre Rússia e Ucrânia. E, após Musk dizer nesta semana que ofereceria conexão em Gaza, virou motivo de disputa com Israel.

No mundo em que empresários têm tanto poder quanto Estados, Estados também agem como influenciadores, como faz a Arábia Saudita, escolhida nesta semana pela Fifa para sediar a Copa do Mundo de 2034. A monarquia ditatorial tem bilhões de dólares à disposição para pôr em prática um plano que envolve as milhões de curtidas trazidas por estrelas do futebol como Neymar (Plataforma #02).

Tudo isso enquanto nós, os usuários das redes, mudamos a forma como consumimos conteúdo e permanecemos sujeitos a teorias conspiratórias, desinformação e campanhas de influência (Plataforma #08, Plataforma #10) — com a democracia sob ataque perene (Plataforma #06, Plataforma #11).

Como se vê, as mudanças profundas pela qual passamos envolvem múltiplos e interconectados fatores, e o debate sobre esses temas é essencial para a construção de um futuro humano. A Plataforma está aqui para contribuir.

Depois de tanto estímulo, este escriba se dedicará nas próximas semanas ao ócio improdutivo. Mas a Plataforma volta na semana que vem, sob a pena de Leonardo Cazes, chefe de reportagem do Aos Fatos.

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