🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Janeiro de 2022. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

Ivermectina e antiviral da Pfizer não agem da mesma forma contra o novo coronavírus

Por Priscila Pacheco

28 de janeiro de 2022, 17h03

A ivermectina e o paxlovid, medicamento antiviral da Pfizer para Covid-19, não têm o mesmo mecanismo de ação contra o novo coronavírus, como alegam nas redes (veja aqui). Apesar de pesquisas iniciais terem visto potencial no antiparasitário para inibir a protease 3CLpro, enzima essencial para a multiplicação do Sars-Cov-2, estudos mais avançados ainda não comprovaram que esse efeito pode ser reproduzido em pessoas. O paxlovid, por sua vez, já teve esta ação confirmada em ensaios clínicos com humanos.

A postagem enganosa conta com ao menos 1.542 compartilhamentos no Facebook nesta sexta-feira (28) e também tem sido publicada no Instagram.


Selo falso

O “novíssimo” medicamento da Pfizer (Paxlovid) possui o mesmo mecanismo bioquímico da ivermectina, (inibição da protease 3CL), só que custando 20 vezes mais.

Ivermectina e Paxlovid inibem protease 3CL da Covid-19, diz publicação enganosa

Não há evidências de que a ivermectina seja capaz de inibir em humanos a protease 3CLpro, enzima responsável pela replicação do vírus da Covid-19, como faz o medicamento paxlovid, antiviral lançado pela Pfizer recentemente. Apesar da existência de estudos preliminares que apontam eventual ação do antiparasitário, faltam pesquisas mais sólidas que confirmem o efeito de inibir a replicação do vírus no organismo. Ação do paxlovid sobre a enzima foi confirmada por meio de testes clínicos.

Um dos estudos que investigou a possível ação antiviral da ivermectina foi publicado na revista Nature em janeiro de 2021. Por meio de uma triagem in silico, que são simulações feitas por computador, a pesquisa indicou que o antiparasitário teria potencial de inibir a protease 3CLpro, citada na peça desinformativa. De acordo com o artigo, a investigação in silico serve para uma triagem mais rápida de medicamentos já existentes que possam ser candidatos para o tratamento de enfermidades.

Como o aparecimento de falsos positivos é uma das limitações do método computacional, foram feitos ensaios in vitro enzimáticos (interação da droga em solução com a enzima em laboratório), o que mostrou que o antiparasitário havia bloqueado mais de 85% da atividade da 3CLpro. Entretanto, a equipe afirma que estudos mais avançados são necessários para validar a eficácia no organismo humano e calcular uma dosagem segura.

Os pesquisadores relatam que um estudo liderado pelo Instituto de Biomedicina da Universidade de Monash, na Austrália, havia apontado em 2020 que a ivermectina havia diminuído a replicação do RNA viral, material genético do Sars-Cov-2, em células chamadas vero (provenientes do rim do macaco verde africano), em laboratório. No artigo também é citado que um estudo italiano investigava se a dosagem necessária para reproduzir esse efeito era segura em pessoas e se teria potencial para diminuir a carga viral da doença.

No entanto, a pesquisa australiana não publicou novos resultados que possam indicar ou descartar o uso da ivermectina. O estudo italiano em humanos não foi concluído por falta de voluntários para os testes. Apesar de não citarem a protease, as pesquisas exemplificadas no artigo também têm como alvo a inibição do vírus na fase inicial da doença.

Ana Paula Hermann, professora de Farmacologia da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), explica que, após a pesquisa in silico, a droga deve ser pesquisada em culturas de células, modelos animais e, por fim, em humanos para determinar sua eficácia e segurança. Porém, até o momento, os estudos concluídos são insuficientes para sustentar que há evidências científicas de que a ivermectina seja útil contra a Covid-19.

Em julho de 2021, por exemplo, uma metanálise (compilação de resultados de pesquisas) publicada pela Cochrane, entidade especializada em revisões sistemáticas, avaliou 14 estudos randomizados publicados até o fim de maio e disse que as conclusões não sustentavam a eficácia e segurança da ivermectina para prevenir ou tratar a infecção pelo novo coronavírus, pois as pesquisas eram pequenas e poucas tinham qualidade. Outra metanálise publicada na Clinical Infectious Diseases chegou à mesma conclusão.

Um artigo de revisão publicado em dezembro de 2021 pela Nature avaliou a literatura disponível sobre ivermectina de janeiro de 2008 a setembro do ano passado, o que incluiu estudos antigos que já investigavam o potencial antiviral da droga em outras doenças, como zika e chikungunya. A conclusão foi de que, embora atividades antivirais da ivermectina tenham sido relatadas, ainda não está claro se alguma dessas ações observadas é capaz de prevenir ou tratar a Covid-19.

Por fim, um documento publicado em 11 de janeiro pela Paho (Pan-American Health Organization), representante da OMS (Organização Mundial da Saúde) na América Latina, também observou a necessidade de mais pesquisas. O antiparasitário possui, ao total, 48 ensaios clínicos em andamento.

No Brasil, a ivermectina é autorizada para tratar verminoses e infestação de ácaro, piolho e outros insetos. O seu mecanismo de ação consiste em ampliar a permeabilidade das membranas celulares dos parasitas, o que os leva à paralisia e morte.

Antiviral. O medicamento produzido pela Pfizer para combater a Covid-19, paxlovid, se mostrou eficaz contra a reprodução do novo coronavírus em humanos, ao contrário da ivermectina. Ele passou por testes in vitro e por ensaios clínicos randomizados, duplos-cegos e controlados por placebo em diferentes fases (saiba mais sobre tipos de estudos aqui).

A droga é composta pelo antiviral nirmatrelvir, desenvolvido pela Pfizer especificamente para inibir a protease 3CLpro do Sars-Cov-2, e pelo ritonavir, um antirretroviral já usado para tratar a infecção pelo HIV, vírus causador da Aids. O nirmatrelvir bloqueia a atividade da protease em um estágio anterior à replicação do RNA viral, que faz com que o novo coronavírus se espalhe pelo corpo.

Já o ritonavir, coadministrado em dose baixa, ajuda a retardar o metabolismo do nirmatrelvir para que a substância permaneça ativa no corpo em concentrações mais elevadas e por mais tempo, e, assim, combata o vírus e impeça o avanço da doença. Segundo a fabricante, o remédio pode reduzir em 89% o risco de hospitalização e morte por Covid-19.

O paxlovid é indicado para pessoas a partir de 12 anos de idade com Covid-19 em estágio leve ou moderado. A prescrição deve ser feita por um médico em um período de cinco dias após o aparecimento de sintomas, sendo dois comprimidos de nimatrelvir (300 mg) e um de ritonavir (100mg) tomados duas vezes por dia durante cinco dias. O medicamento não deve ser consumido por um período maior nem usado para prevenção da doença.

O antiviral já recebeu autorização emergencial em alguns países, como Estados Unidos, Canadá, França e Austrália. A Pfizer ainda não enviou à Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) o pedido para o uso emergencial do medicamento no Brasil.

Em outubro, Aos Fatos também checou uma desinformação que comparava a ivermectina e o paxlovid, que ainda estava em fase de pesquisa.

Referências:

1. Aos Fatos (Fontes 1 e 2)
2. Revista Nature (Fontes 1 e 2)
3. Antiviral Research
4. Clinical Trials (Fontes 1 e 2)
5. Universidade de Monash
6. Cochrane
7. Clinical Infectious Diseases
8. Paho
9. Anvisa (Fontes 1 e 2)
10. Drugs.com
11. Pfizer (Fontes 1, 2, 3 e 4)
12. FDA
13. Governo do Canadá
14. Le Figaro
15. TGA


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