Posts inventam projetos sobre incesto, pedofilia, liberação do roubo e mudança de sexo

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Postagens nas redes sociais compartilham uma lista com oito projetos de lei inventados ou distorcidos para afirmar que eles teriam o objetivo de “destruir a família e a sociedade” (veja aqui). Além de falsificar os termos dos projetos, mentindo sobre liberação de incesto, pedofilia, abuso sexual, mudança de sexo de crianças sem consentimento e proibição de evangelização na TV, os posts citam projetos que não estão em tramitação na Câmara dos Deputados ou que já foram arquivados, sem prazo para votação.

Uma versão da publicação desinformativa circula no WhatsApp e Telegram, nos quais não é possível estimar o alcance (fale com a Fátima). Outra foi encontrada com centenas de compartilhamentos no Facebook.

Reprodução de postagem que lista oito projetos de lei distorcidos ou inventados.

Confira abaixo, ponto a ponto, o que checamos da lista, que circula com pequenas variações sobre números de projetos e propostas.


Selo falso

Ideologia de Gênero nas redes de ensino. PL 8035/2010

A “ideologia de gênero” não existe. O termo é usado por setores conservadores desde o final dos anos 1990 dentro de uma teoria conspiratória de que discussões relacionadas a gênero e sexualidade seriam parte de um plano para minar a heterossexualidade e a família cristã. Para embasar a alegação falsa, a peça cita um projeto de lei que foi alterado antes da sanção, o PL 8.035/2010, que trata do Plano Nacional da Educação.

Na época em que o projeto foi discutido, setores conservadores consideraram que a frase “superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da igualdade racial, regional, de gênero e de orientação sexual” consistia em uma defesa da suposta “ideologia de gênero”. O texto foi alterado para “superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da cidadania e na erradicação de todas as formas de discriminação” em abril de 2014.

A palavra “gênero” é mencionada duas vezes para tratar de políticas de prevenção à evasão motivada por preconceito e discriminação e para prever uma proposta de “projeto político pedagógico participativo, que tenha como fundamento: a autonomia, a qualidade social, a gestão democrática e participativa e a diversidade cultural, étnico racial, de gênero, do campo”.

Em outra versão compartilhada no Facebook, é citada a Lei 9.394/96, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional e não faz referência a “ideologia de gênero”.


Selo falso

Família do Século XXI. PL 3369/2015. Pais poderão se casar com filhos. Este PL libera o incesto, pedofilia e abuso sexual.

O PL 3.369/2015 não libera o incesto, da pedofilia nem discriminaliza o abuso sexual, como afirma a postagem. Proposto pelo deputado Orlando Silva (PC do B-SP) e ainda em tramitação, o projeto reconhece diferentes estruturas familiares pelo poder público, mas não revoga o artigo 1.521 do Código Civil — que proíbe o casamento entre pais e filhos — nem altera os itens do Código Penal que tratam dos crimes sexuais.

As alegações desinformativas sobre o projeto surgiram após críticas de deputados governistas em 2019, quando o projeto estava na Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara. Neste momento, o PL segue nessa comissão, sem prazo para ser votado.


Selo falso

PL 4240/2021. Liberação do roubo. Projeto de Lei quer descriminalizar o furto de itens básicos e de pequeno valor.

O PL 4.240/2021 não tem qualquer relação com descriminalização do furto de itens básicos ou de pequeno valor. Proposto pelo deputado Sergio Souza (MDB-PR), o texto concede ao município de Cruzeiro do Oeste (PR) o título de Vale Nacional dos Dinossauros, e ainda não foi votado.

Um projeto semelhante ao colocado pela peça desinformativa é o 4.540/2021, da deputada Talíria Petrone (PSOL-RJ). O texto não descriminaliza o furto de itens básicos e de pequeno valor, e sim determina penas alternativas quando o autor do crime estiver em situação de pobreza e o bem roubado tem o objetivo de saciar necessidade básica. Em janeiro deste ano, o Aos Fatos desmentiu uma desinformação envolvendo o projeto.


Selo falso

Banheiro unissex. PL 0558/2017. Em escolas e repartições públicas, meninos e meninas, usarão o mesmo banheiro sob alegação de inclusão social.

Não existe projeto na Câmara dos Deputados que obrigue meninos e meninas a usarem o mesmo banheiro sob alegação de inclusão social. O único projeto que trata de “banheiros unissex” é o 2.431/2022, do deputado José Nelto (PP-GO), e pressupõe que estabelecimentos comerciais disponibilizem essa opção para pessoas com deficiência ou crianças acompanhadas dos responsáveis, sem estabelecer obrigatoriedade para qualquer usuário. O projeto está em tramitação e não foi votado.

As peças confundem o projeto com o PL 558/2017, da Câmara Municipal de São Paulo, proposto pelo vereador Ricardo Teixeira (União Brasil). Após um parecer negativo da Comissão de Constituição e Justiça da casa legislativa, que viu inconstitucionalidade por configurar “indevida ingerência do Poder Público no âmbito da atividade econômica privada”, o projeto foi retirado pelo próprio autor.


Selo falso

PL 5002/2013. Crianças poderão mudar de sexo sem o consentimento dos pais.

O PL 5.002/2013, de autoria de Jean Wyllys, na época deputado do PSOL pelo Rio de Janeiro, não autoriza crianças a mudar de sexo sem o consentimento dos pais. O projeto prevê o direito à identidade de gênero, que pode envolver mudança no nome social e cirurgia, mas com condições: o cidadão deve ter idade superior a 18 anos e em caso de menores de idade deve haver acompanhamento e autorização dos representantes legais. Caso o adolescente não tenha o consentimento dos representantes, ele poderia recorrer à assistência da Defensoria Pública. O projeto foi arquivado em janeiro de 2019.

Em outra versão que circula no Facebook, é citado o PL 4.293/2012 que, na verdade, trata da regulamentação da profissão de teólogo.


Selo falso

Assédio Religioso. 4257/2018. Ficará proibido atitudes de proselitismo religioso que violem a liberdade de crer, do não crer e a privacidade em ambientes públicos e privados, constituindo assédio religioso.

Não existe nenhum projeto de lei de número 4.257/2018 registrado na Câmara dos Deputados. O projeto, na verdade, é de autoria do deputado estadual Átila Nunes (MDB) e tramita na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro). O texto não proíbe o proselitismo, ou seja, a busca ativa de uma religião por novos fiéis, e sim o assédio religioso em ambientes públicos e privados no estado do Rio de Janeiro e define como assédio religioso a “prática, o induzimento ou a incitação à discriminação ou preconceito”, o que pode envolver insultos pessoais, ameaças, invasão da intimidade e da privacidade, entre outros.


Selo falso

Proibição de programas de evangelização em rádio e TV

Nenhum dos quatro projetos citados proíbe programas de evangelização em rádio e TV.

  • O PL 4.021/2012, de Ivan Valente (PSOL-SP), prevê o impedimento da sublocação da concessão de rádio ou televisão para terceiros, sem vedar conteúdo religioso. O projeto foi desarquivado em 2019 e segue em tramitação.
  • Já o PL 4.549/2008, de autoria de Edson Duarte (PV-BA), regulariza o arrendamento de espaço na grade horária das emissoras de rádio e televisão, cedidos para terceiros. O PL prevê pagamento de 60% de imposto federal sobre contratos com terceiros e está em tramitação.
  • Outros dois tratam de questões relacionadas ao imposto de renda da pessoa física (PL 2837/2011 e PL 4539/2021) , não tendo relação alguma com a transmissão do evangelho em rádio ou TV.

Uma versão da peça desinformativa que circula no Facebook cita outros projetos, como o PL 4539/2001 (em tramitação), que determina que as emissoras de rádio e TV não podem ceder ou arrendar canais ou horários, e o PL 2897/2011 (desarquivado em 2019), que proíbe a subconcessão, arrendamento ou aluguel de serviços de radiodifusão.


Selo não é bem assim

Transformar a prostituição em profissão. PL 4211/2012

É verdade que o Projeto de Lei 4.211/12, de autoria de Jean Wyllys, na época deputado pelo PSOL do Rio de Janeiro, prevê a regulamentação da atividade das profissionais do sexo. Porém, ele foi arquivado em janeiro de 2019 e não teve movimentações desde então. O projeto considerava profissional do sexo “toda pessoa maior de dezoito anos e absolutamente capaz que voluntariamente presta serviços sexuais mediante remuneração”, e proibia a exploração sexual.

Esta checagem também foi feita por Agência Mural.


Aos Fatos integra o Programa de Verificação de Fatos Independente da Meta. Veja aqui como funciona a parceria.

Referências

  1. Aos Fatos (1 e 2)
  2. Câmara Legislativa (1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17 e 18)
  3. UOL
  4. Planalto (1 e 2)
  5. Congresso em Foco
  6. Radar Municipal
  7. Alerj
  8. Agência Mural

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