Não é verdade que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) entregou a terra indígena Raposa Serra do Sol, no norte de Roraima, ao empresário e filantropo húngaro George Soros. Diferentemente do que afirmam as peças de desinformação que circulam nas redes (veja aqui), o território foi demarcado como área indígena em 2005 e sua homologação foi confirmada em 2009 pelo STF (Supremo Tribunal Federal).
A postagem distorce ainda quando diz que a região seria a maior reserva de nióbio do mundo. Segundo o CPRM (Serviço Geológico do Brasil), o mineral está presente principalmente nos estados de Minas Gerais, Amazonas e Goiás. Por mais que haja indícios de que Roraima tenha reservas, não há informações sobre o seu tamanho real.
No Facebook, posts com as informações incorretas reuniam ao menos 3.200 compartilhamentos até a tarde desta quinta-feira (17). Todos foram marcados com o selo FALSO na ferramenta de verificação da rede social (entenda como funciona).
Circulam nas redes sociais peças que afirmam que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) teria entregue a região de Raposa Serra do Sol, terra indígena localizada no norte de Roraima, ao investidor George Soros. As publicações, que não apontam a fonte da alegação, ainda dizem que a área seria a maior reserva de nióbio do mundo. Nada disso, no entanto, é verdade.
A reserva Raposa Serra do Sol é uma terra indígena que foi homologada por decreto presidencial em 2005. Segundo o Instituto Socioambiental, a área possui cerca de 1,7 milhão de hectares e abriga cerca de 26 mil índios de cinco etnias.
A demarcação da região gerou uma polêmica entre esferas governamentais, agricultores e índios. Após o decreto assinado por Lula, diversos setores questionaram a decisão na Justiça e a área acabou sendo palco de invasões e protestos. A homologação da reserva indígena só foi efetivada em 2009 após votação no STF (Supremo Tribunal Federal).
O Aos Fatos não encontrou nenhuma citação ao nome de Soros em nenhum momento da demarcação. Na verdade, as únicas menções ao empresário aparecem em teorias da conspiração que dizem que as ONGs (organizações não governamentais) se beneficiariam com a demarcação de terras porque, assim, poderiam explorar riquezas das áreas povoadas por uma minoria “aculturada e nômade”.
Terras demarcadas, no entanto, são de exploração exclusiva dos povos nativos da região. Conforme determina o artigo 231 da Constituição, “as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes”. O texto determina ainda que a exploração de recursos só pode ocorrer “com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei”.
Segundo o projeto Terras Indígenas no Brasil, não há, no momento, nenhum projeto na região com participação de empresas ligadas a Soros.
A atividade garimpeira em terras indígenas também é proibida pelo mesmo artigo. Esse impedimento, porém, está sendo questionado pelo atual governo, que assinou um projeto de lei (PL 191/2020) para tentar legalizar a atividade nas áreas demarcadas mesmo sem o consentimento da população local.
Nióbio. A região demarcada possui reservas de nióbio, mas não há informações de que seria a maior jazida do mundo. Essa, na verdade, está na região de Araxá (MG), que seria responsável hoje por 75% de toda a produção mundial do minério, segundo a CBMM (Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração).
Conforme apresentado pelo Programa Levantamentos Geológicos Básicos do Brasil, feito em 1999, o estado de Roraima possui “simples ocorrências” de nióbio e outros minerais, ou seja, foi detectada a presença do material, mas não há estimativa da quantidade. O documento não diz nada sobre a região abrigar a maior reserva do mundo do mineral.
Em outro artigo, esse publicado em 2016, o CPRM (Serviço Geológico do Brasil) estima que o país possui 842,6 milhões de toneladas de nióbio nos estados de Minas Gerais (75%), Amazonas (21%) e Goiás (3%). Segundo o texto, “há reservas pequenas também em Roraima, mas elas, como as do Amazonas, estão em região de fronteira ou em áreas de reservas indígenas, e não há previsão de abertura de novas minas no país além das atualmente em lavra”.
A única informação verdadeira da peça de desinformação é a foto: de fato, trata-se de um encontro entre o ex-presidente Lula, o ex-ministro da Fazenda Antônio Palocci e George Soros. Na ocasião, os três participavam do 33º Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, em janeiro de 2003, ano da posse do petista. O registro é de Ricardo Stuckert.
Referências:
1. Planalto (Fontes 1 e 2)
2. ISA (Fontes 1 e 2)
3. Repórter Brasil
4. Câmara dos Deputados
5. Codemig
6. CPRM (Fontes 1 e 2)
7. EBC