Bolsonaro promete provas de fraude, mas apresenta alegações já desmentidas sobre as urnas eletrônicas

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O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) prometeu apresentar em sua transmissão ao vivo desta quinta-feira (29) provas de fraude nas urnas eletrônicas, mas trouxe alegações antigas que circularam nas redes sociais e que já foram desmentidas por Aos Fatos. É o caso, por exemplo, da falsa denúncia de que o equipamento completou o voto no número do PT nas eleições de 2018, cujo vídeo provou ser uma montagem, e da suspeita infundada de que a uniformidade da votação em São Paulo no pleito municipal de 2020 seria sinal de fraude.

Em resumo, o que checamos:

  1. É FALSO que urnas eletrônicas completaram automaticamente votos no candidato Fernando Haddad (PT) nas eleições de 2018. O vídeo que circulou no dia do pleito era uma montagem que foi desmentida à época por técnicos do TRE-MG (Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais).
  2. A estabilidade na ordem dos candidatos nos resultados parciais da apuração nas eleições de São Paulo em 2020 não é um indício de fraude, o que torna a declaração do presidente FALSA. O resultado aponta apenas a homogeneidade dos votos recebidos.
  3. Especialistas ouvidos por Aos Fatos apontaram erros na fórmula matemática usada para sugerir que Dilma Rousseff e Aécio Neves se alternaram na liderança durante o segundo turno das eleições de 2014. Isso torna FALSO o argumento do presidente de que teria havido fraude no pleito.
  4. Também é FALSO que o atual sistema de votação brasileiro não seja auditável. Segundo o TSE, há uma série de recursos no equipamento que permitem o procedimento, como o Registro Digital do Voto, o log da urna eletrônica e as auditorias pré e pós-eleição.
  5. É FALSA a afirmação de que as urnas não foram modernizadas desde sua implantação em 1996. De lá para cá, foram implementadas uma série de mudanças como o Registro Digital do Voto e a alteração do software.
  6. Apesar de afirmar ter invadido o sistema do TSE, o hacker Marcos Roberto da Silva foi preso por vazar dados do Serasa e não por invadir computadores do tribunal. Por isso, a declaração do presidente é IMPRECISA.


E outros [indícios de fraude] também de pessoas que, no dia das eleições, foram votar e o nome do seu candidato não apareceu na tela. Por incrível que pareça, as reclamações só tinham uma mão: queriam votar no 17 e apareciam nulo ou automaticamente o 13. Quem queria votar no 13 não aparecia 17 e nem nulo.

A declaração é FALSA porque a denúncia mencionada pelo presidente foi desmentida ainda durante as eleições de 2018. Após o primeiro turno, circulou nas redes sociais um vídeo que sustentava que urnas teriam completado automaticamente o número do candidato do PT, Fernando Haddad. O TRE-MG (Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais) analisou as imagens e concluiu que se tratava de uma montagem.

À época, Aos Fatos também verificou que o vídeo tinha claros indícios de edição. Em nenhum momento da gravação, por exemplo, a tela e o teclado onde o voto é digitado aparecem ao mesmo tempo. Quando a urna supostamente preenche automaticamente o número 3, apenas a tela do equipamento era exibida no vídeo.

Menções a essa falsa denúncia de fraude já foram feitas por Bolsonaro ao menos seis vezes, segundo o contador do Aos Fatos de declarações falsas e distorcidas do presidente.


Com 0,39% das urnas apuradas [nas eleições municipais de São Paulo], o sistema travou. Daí, nós pegamos do primeiro ao oitavo candidato mais votado. Olha, 0,39%. (...). Quando o sistema voltou a funcionar lá na frente, já com quase 100% [do resultado eleitoral] apurado, a ordem dos candidatos permaneceu exatamente a mesma.

É FALSO que a estabilidade na ordem dos candidatos nos resultados parciais durante a apuração dos votos nas eleições municipais de São Paulo em 2020 seja um indício de fraude, como sugere o presidente neste trecho da live. Na época em que esta alegação circulou nas redes sociais, durante o pleito do ano passado, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) informou que a ocorrência indicava "apenas homogeneidade nos votos recebidos durante a totalização".

Também é possível observar a homogeneidade no mapa do G1 com a apuração nas zonas eleitorais. O prefeito e candidato à reeleição, Bruno Covas (PSDB), teve o maior número de votos nas 58 seções eleitorais da capital paulista. E, em apenas duas delas – Parelheiros e Grajaú, redutos eleitorais da família Tatto –, o candidato do PSOL, Guilherme Boulos, não aparece como segundo colocado, perdendo a posição para Jilmar Tatto (PT).

Em checagem anterior, o professor do Instituto de Computação da Unicamp e representante da SBC (Sociedade Brasileira de Computação) nos testes públicos de segurança do TSE, Paulo Lício de Geus, afirmou ao Aos Fatos que a constância da porcentagem de votos durante a apuração não é algo inesperado e não indica irregularidades na apuração.


Você, em 4 horas de apuração [do segundo turno das eleições de 2014], 240 minutos [Dilma e Aécio se intercalaram na primeira posição], 240 vezes você jogar uma moeda pra cima, hora da cara, hora dá coroa, hora da cara, hora dá coroa…

A declaração é FALSA porque, neste trecho da live, Bolsonaro faz alusão à informação enganosa de que Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB) teriam se revezado mais de 240 vezes na primeira posição durante a apuração de votos das eleições de 2014. Essa troca na liderança não aconteceu, de acordo com o TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

A apuração minuto a minuto daquele pleito mostra que Aécio estava na frente no início da totalização de votos. Depois, ao longo da contagem, a diferença entre o tucano e a petista cai progressivamente. O gráfico de porcentagem de votos dos dois candidatos se cruza em apenas uma ocasião, às 19h31, quando Dilma registra 49,98% dos votos válidos e Aécio, 50,02%. A partir desse ponto, a petista sobe, registrando ao fim da apuração, às 2h13, 51,64% dos votos válidos.

O gráfico mostrado por Bolsonaro na live é o mesmo que foi mostrado em um vídeo publicado por Naomi Yamaguchi, suplente de deputada federal pelo PSL. Ela mostrou uma tabela na qual, supostamente, o índice de aceleração do crescimento dos votos dos dois candidatos ficaria se intercalando por 240 minutos, e que seria baixa a probabilidade desse fenômeno ocorrer.

Conrado Gouvêa, doutor em Ciência da Computação pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e especialista em Segurança da Informação, analisou a tabela apresentada por Yamaguchi e mostrou que foi usada uma fórmula errada para fazer a análise dos votos.

De acordo com Leandro Tessler, pesquisador do departamento de Física da Unicamp, o autor da tabela forjou uma fórmula para que os resultados indicassem a alternância, não importando o número de votos que cada candidato tivesse naquele minuto. Gouvêa, inclusive, inseriu dados aleatórios e o resultado foi o mesmo (veja a aba C dessa tabela).


Agora, quem não quer mudar o sistema é porque tem certeza que o voto não auditável servirá para eleger quem não tem voto

A afirmação de Bolsonaro a respeito de o voto não ser auditável é FALSA, pois as urnas usadas pelo sistema eleitoral brasileiro permitem que haja auditoria. Segundo o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), os equipamentos possuem recursos que permitem o procedimento.

Entre eles estão o Registro Digital do Voto, o log da urna eletrônica, as auditorias pré e pós-eleição, a auditoria dos códigos-fonte, a lacração dos sistemas, a tabela de correspondência, o lacre físico das urnas, a identificação biométrica do eleitor, a auditoria da votação e a oficialização dos sistemas.

Os sistemas de votação também podem ser requisitados para análise e verificação a qualquer momento e pelo período necessário para se realizar uma auditoria completa. Inclusive, após as eleições de 2014 para a presidência, o PSDB solicitou a auditoria do resultado do segundo turno que havia dado a vitória a Dilma Rousseff (PT) contra Aécio Neves (PSDB). A análise foi realizada, mas não encontrou nenhuma violação ou adulteração.


Mas a tecnologia da mesma [urna eletrônica], a sua segurança, quase nada mudou de lá [dos anos 1990] para cá.

A declaração de Bolsonaro é FALSA porque a Justiça Eleitoral fez uma série de atualizações de segurança nas urnas eletrônicas desde que o sistema de votação foi adotado no país, em 1996.

Entre as mudanças mais importantes, está a assinatura digital do sistema, implementada em 2002. O dispositivo assegura que todas as urnas eletrônicas funcionem apenas com os programas desenvolvidos e lacrados pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral). No ano seguinte, a adoção do RDV (Registro Digital do Voto) passou a permitir recontagem eletrônica dos votos sem a violação do sigilo do eleitor.

Em 2005, o TSE passou a desenvolver inteiramente o software da urna e, em 2008, todos os equipamentos começaram a operar apenas com o sistema operacional Linux. Em 2009, as urnas ganharam um módulo de segurança para proteger melhor a transmissão dos dados de totalização dos votos.

Atualmente, as urnas têm mais de 30 camadas de segurança, de acordo com o presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso. Entre elas, lacres físicos, sistema de controle de versões, assinaturas digitais dos arquivos, criptografias e boletim de urna impresso.


Por que tem um hacker preso que entrou nos computadores do TSE...

Neste trecho, Bolsonaro se refere ao hacker Marcos Roberto da Silva, que de fato está preso em Uberlândia (MG) desde março deste ano. Apesar de alegar que invadiu os sistemas do TSE, Silva não foi detido por isso, mas por suspeita de participação no vazamento de 223 milhões de dados do sistema do Serasa. Assim, a fala é IMPRECISA.

Silva foi alvo de uma operação de busca e apreensão da PF (Polícia Federal) em novembro de 2020 para apurar a invasão do sistema do TSE, que expôs os dados administrativos da corte antes do primeiro turno das eleições. Um suspeito dessa invasão foi preso em Portugal. Segundo análise da PF, os hackers invadiram o Portal do Servidor do tribunal e acessaram dados disponíveis entre 2001 e 2010, sem relação com o processo eleitoral.

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