Voltou a circular fora de contexto um vídeo de maio de 2020 em que Flávio Dino (PSB), atual ministro da Justiça e então governador do Maranhão, afirma que médicos têm liberdade para receitar remédios que se provaram posteriormente ineficazes para prevenir ou tratar a Covid-19, como a cloroquina e a ivermectina. A entrevista antiga tem sido utilizada em publicações nas redes sociais que tentam fazer crer que o governo Lula agora seria favorável ao uso desses medicamentos contra a doença, o que é falso.
O vídeo descontextualizado aparece em posts que acumulam ao menos 8.000 curtidas no Instagram e 80 mil visualizações no TikTok. O conteúdo também circula no Telegram e no WhatsApp (fale com a Fátima).
Agora já se pode usar remédios preventivos contra a Codvi (sic)? Bolsonaro sempre teve razão 02/03/2023
Posts nas redes tratam como recente uma entrevista concedida à TV Mirante em maio de 2020 pelo então governador do Maranhão, Flávio Dino, atual ministro da Justiça, em que ele afirma que médicos têm liberdade para receitar remédios que se provaram ineficazes contra a Covid-19, como a cloroquina, a ivermectina e a azitromicina. O trecho é utilizado nos posts como uma suposta prova de que o governo Lula agora estaria recomendando essas substâncias para prevenir ou tratar a doença, corroborando a posição do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Nada disso é verdade.
A entrevista foi gravada nos primeiros meses da pandemia, quando ainda não havia um consenso entre cientistas sobre a ineficácia desses medicamentos. Protocolos de saúde nacionais e internacionais inclusive autorizavam o uso das drogas em fases graves da doença.
Confira abaixo o trecho completo da entrevista:
Repórter: Sobre o uso da cloroquina, que passou a ser indicada, tá sendo distribuída aqui no estado, como o senhor avalia essa situação em meio a essa polêmica nacional toda que a gente vive em relação à prescrição do medicamento?
Flávio Dino: Polêmica totalmente desnecessária, porque desde o mês de março eu afirmo e reitero que a cloroquina pode ser receitada pelos médicos. Nós sempre oferecemos aos médicos a oportunidade de receitar cloroquina, azitromicina, ivermectina, Kóide-D, todos esses remédios que experimentalmente têm sido vistos por alguns profissionais como eficazes. Nós não cuidamos de casos leves; o estado cuida de casos graves. E há muitas semanas pacientes graves estão recebendo, nos nossos hospitais, cloroquina e outros medicamentos — de acordo, sempre, com a prescrição médica. A politização é estranha, porque não é o governador — infelizmente, eu não sou médico — quem decide qual remédio que concretamente o médico vai dar para cada paciente.
Com a evolução da pandemia, no entanto, diversos estudos duplo-cego randomizados — considerados o padrão-ouro das pesquisas científicas — não comprovaram que a cloroquina e a hidroxicloroquina, bem como a ivermectina e a azitromicina, seriam benéficas para prevenir ou tratar a Covid-19 em suas diferentes etapas.
Em junho de 2020, poucos dias depois da fala de Dino à TV Mirante, a Secretaria de Saúde do Maranhão divulgou novas diretrizes de tratamento que desaconselhavam o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina. De acordo com o documento, “esquemas com estas drogas não demonstraram benefício em pacientes internados,com aumento do risco de complicações cardiológicas”.
Há atualmente diversos medicamentos aprovados pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para o tratamento da Covid-19: alguns exemplos são os anticorpos monoclonais Evusheld e Sotrovimabe e os antivirais Molnupiravir, Paxlovid, Remdesivir. A melhor forma de se prevenir é a vacinação.
A despeito de uma série de evidências contrárias, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) defendeu ao longo de toda a pandemia o uso de cloroquina e hidroxicloroquina contra a Covid-19. Poucos dias antes da entrevista de Dino, em 15 de maio de 2020, o então ministro da Saúde, Nelson Teich, anunciou sua demissão da chefia da pasta por divergências com o presidente relacionadas à liberação da droga para pacientes com casos leves da doença — até então, as drogas eram autorizadas para internados em estado grave. Antecessor de Teich, Luiz Henrique Mandetta (União Brasil) deixou o governo por motivo similar.