Dos 27 senadores que farão a sabatina de Flávio Dino para a vaga de ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), sete já desinformaram ou fizeram insinuações falsas tentando associar o ministro da Justiça do governo Lula (PT) com o crime organizado ou com a tentativa de golpe de Estado em 8 de janeiro. Desses, cinco se posicionaram contra a aprovação de Dino. Apenas Sergio Moro (União Brasil-PR) e Marcos do Val (Podemos-ES) não declararam seus votos nas redes.
Levantamento feito pelo Radar Aos Fatos mostra que esses parlamentares da oposição recorreram à desinformação e devem retomar a estratégia ao vivo, na TV Senado e em todas as retransmissões, durante a sessão da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) nesta quarta-feira (13).
- De janeiro a novembro de 2023, sete senadores fizeram 72 publicações com desinformação (25) ou insinuações (47) sobre Dino em suas páginas de Facebook;
- Juntas, elas somaram mais de 360 mil interações na plataforma;
- A principal acusação — falsa — contra o ministro é de suposta associação com os atos terroristas do dia 8 de janeiro, presente em 47 das publicações;
- Em segundo lugar, 19 posts fazem insinuações sem provas ou com base em falsas correlações, tentando associar Dino a organizações criminosas
O senador Marcos do Val foi quem mais repetiu essa retórica, com 36 publicações. Desde junho, por decisão judicial, ele está com seus perfis em redes sociais bloqueados no Brasil. Do Val é alvo de inquérito no STF que investiga sua participação em um plano para, durante o governo Bolsonaro, implementar um golpe de Estado.
O parlamentar também é investigado pela divulgação de documento confidencial em que a Abin (Agência Brasileira de Inteligência) alertava sobre a possibilidade de manifestações violentas no dia 8 de janeiro. Com base nesse relatório, o senador fez 13 publicações acusando falsamente o ministro Flávio Dino, o presidente Lula (PT) e o ministro do STF Alexandre de Moraes de serem responsáveis pelos atos golpistas e outras 12 insinuando a participação deles nos ataques.
“Atenção Brasil! O Lula, o Flávio Dino e o General G. Dias, já sabiam dos ataques desde o dia 02 de janeiro. Lula disse: deixem acontecer para acabarmos logo com a Direita, com os Bolsonaristas. Na CPMI, irei mostrar as provas”, prometeu Do Val em publicação no dia 22 de abril deste ano. Exceto pelo ex-ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional) Gonçalves Dias, nenhum dos outros acusados por Do Val foi indiciado pela CPMI ou investigado pelo Supremo em inquéritos que apuram os atos de 8 de janeiro.
As publicações do senador ainda alegam que, diante dos ataques, Flávio Dino “permaneceu inerte, assistindo pela janela do seu ministério aos atos de vandalismo”. Porém, documentos mostram que o ministro pediu o bloqueio da Esplanada ao menos duas vezes, mas teve sua solicitação negada pelo governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB).
Os posts foram feitos antes do banimento das contas de Do Val e seguem disponíveis no Facebook em outros países. O Radar Aos Fatos teve acesso ao conteúdo das postagens por meio da ferramenta CrowdTangle. Embora o perfil de Do Val esteja bloqueado por ordem judicial, vídeos antigos em que o senador faz as falsas acusações seguem disponíveis no YouTube no Brasil.
As alegações enganosas também foram disseminadas pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) em pelo menos duas publicações. Em uma delas, que chegou a quase 85 mil interações, além de acusar Dino de “manipulação e omissão”, ele sugere que havia “infiltrados” nos ataques e que o governo teria tido “participação nos atos de vandalismo”.
O senador foi o segundo que mais publicou acusações falsas ou insinuações contra Dino desde o início do ano. Ele fez oito posts que associam o ministro com o crime organizado. Dois deles usam como base um vídeo falso que mostra supostos traficantes comemorando a vitória de Lula na disputa presidencial ou a alegação enganosa de que Dino teria entrado no complexo de favelas da Maré, no Rio de Janeiro, sem escolta policial.
Também com base na falsa ligação da sigla CPX com facções criminosas — na verdade se trata de abreviação da palavra “complexo” —, o senador Magno Malta acusou Dino e o atual governo de quererem “instaurar um regime autoritário no Brasil”.
Insinuações. Em outras seis publicações, Flávio Bolsonaro não faz acusações diretas contra Dino, mas insinua uma conexão (inexistente) entre o ministro e o crime organizado. “Por que a Dama do Tráfico ficou tão confortável para ir ao ministério de Flávio Dino?”, questionou, em referência às reuniões entre integrantes do Ministério da Justiça e Luciane Barbosa Farias, esposa do traficante conhecido como Tio Patinhas e condenada em segunda instância por lavagem de dinheiro, associação para o tráfico e organização criminosa.
O senador também fez uma suposta piada que levanta suspeitas. “Atenção Policiais de todo o Rio de Janeiro: antes de sair do Batalhão não esqueça de pegar seu colete à prova de… quer dizer, sua máscara do Flávio Dino!”, publicou após a visita do ministro ao Complexo da Maré.
A estratégia de fazer insinuações também foi usada em 10 publicações dos senadores Esperidião Amin (PP-SC), Marcos Rogério (PL-RO), Carlos Portinho (PL-RJ) e Sergio Moro. Os parlamentares não usaram em seus posts alegações enganosas, mas, por meio de sugestões, disseminaram desinformação.
Portinho, por exemplo, levantou suspeitas sobre a transferência do traficante Marcola para uma penitenciária em Brasília, determinada por Dino no final de janeiro. “Muito estranho”, escreveu.
No mesmo dia, o senador Marcos Do Val usou o fato para acusar falsamente Dino. “Lembro aqui que durante a campanha presidencial Marcola torcia para a vitória de Lula. Ressalto que a investigação na qual estou trabalhando contra Flávio Dino, e que ainda não posso tornar pública, faz cada vez mais sentido. O Brasil está indo por um caminho perigoso.” Na verdade, o líder do PCC não manifestou apoio à candidatura de Lula em 2022.
Já o senador Moro lançou dúvidas sobre a ineficiência da pasta comandada por Dino durante os atos de 8 de janeiro. “Por qual motivo a Força Nacional do MJSP não impediu as invasões e depredações dos Três Poderes do dia 08/01?”, questionou, comparando com episódios de sua atuação como ministro da Justiça. O senador omite que o governo do Distrito Federal era responsável pela segurança da Esplanada dos Ministérios na ocasião.
Em forma de meme, o senador Portinho também fez insinuações sobre a exclusão de vídeos de algumas das câmeras do Ministério da Justiça no dia 8 de janeiro. No post, ele questiona por que Dino teria “apagado as imagens”.
A pasta enviou à CPMI imagens de quatro câmeras e afirmou que o restante não estava disponível, pois havia sido excluído devido à capacidade limitada de armazenamento. "As imagens consideradas importantes pelas autoridades competentes para os inquéritos em curso foram preservadas”, afirmou o ministério ao jornal O Estado de S. Paulo. Mesmo assim, o senador Marcos Rogério classificou a ação como “queima de arquivos”.
A acusação foi retomada pelo senador Esperidião Amin após a indicação de Dino ao STF, que anunciou seu voto contrário. “O atual ministro da Justiça, durante a CPMI do 8/1, afrontou na questão dos alertas da Abin, na questão das imagens das câmaras do Ministério da Justiça, e na questão da inação, ou seja, falta de atuação da Força Nacional, ele afrontou a verdade e dificultou as investigações. Por isso eu votarei CONTRA a sua indicação”, publicou.
Os senadores Flávio Bolsonaro e Magno Malta também voltaram a desinformar e fazer insinuações sobre o ministro após a indicação. "Ele [Flávio Dino] sabe o que ele praticou, o que ele vem praticando. Ele sabe o que ele fez contra o Brasil no dia 8", sugere o capixaba em áudio compartilhado nas redes sociais. Os dois senadores convocaram seus eleitores para participar de manifestações contra a aprovação de Dino para o STF que ocorreram no domingo (10).
Malta participou das manifestações ocorridas em São Paulo e em Brasília. Em seus discursos, o senador voltou a insinuar a omissão do ministro da Justiça nos atos de dia 8 de janeiro e associou o atual governo com o crime organizado. “Passaram a mão na cabeça de assassinos, de ladrões, mas fizeram cidadãos de bens, de bandidos. Praticaram a injustiça contra eles e passaram a mão na cabeça do crime organizado”, disse.
Outros lados. Aos Fatos procurou os senadores sobre as publicações feitas sobre Dino. O senador Carlos Portinho afirmou que não fez acusações contra o ex-ministro. "Em ambas publicações são feitas perguntas sobre decisões de Flávio Dino como Ministro da Justiça", diz.
Os outros parlamentares não responderam até a publicação da reportagem. O espaço permanece aberto para manifestações.