Fabio Rodrigues Pozzebom/AgBr

🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Fevereiro de 2018. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

Jungmann cita dados errados sobre sistema carcerário; checamos seu discurso de posse

Por Bárbara Libório e Luiz Fernando Menezes

28 de fevereiro de 2018, 19h40

Raul Jungmann assumiu a pasta da Segurança Pública na última terça-feira (27). Em seu discurso de posse, errou dados sobre o sistema carcerário e exagerou informações sobre as despesas dos estados com segurança.

Durante seu discurso, ele listou dados sobre o sistema carcerário, o tráfico de drogas e os recursos orçamentários para a segurança pública. Aos Fatos selecionou algumas declarações do ministro para serem checadas. O resultado você pode ver abaixo.


FALSO

O nosso sistema carcerário nos últimos 16 anos cresceu 171%.

O número de presos no sistema carcerário brasileiro cresceu 212% entre os anos de 2000 e 2016, segundo os dados do último Infopen, o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias do Departamento Penitenciário Nacional. Em 2000, eram 232.755 presos. Em junho de 2016, 726.712.

Já a taxa de aprisionamento aumentou em 157%. Em 2000, existiam 137 pessoas presas para cada grupo de 100 mil habitantes. Em junho de 2016, eram 352,6 pessoas presas para cada 100 mil habitantes.


VERDADEIRO

Mas o déficit de vagas cresceu 269%. Hoje, esse déficit já se encaminha para alguma coisa próxima, algo como 400 mil vagas.

O ministro acertou em relação ao crescimento do déficit de vagas. Em 2000, o déficit era de 97.045, enquanto em 2016 passou para 358.663, um crescimento de 269%, segundo os dados do último Infopen.

Neste ano, um levantamento do G1 feito com base nos dados mais atualizados dos 26 estados e do Distrito Federal mostrou que são 686,5 mil presos para uma capacidade total de 407 mil pessoas — um déficit de 279 mil vagas.


FALSO

Quatro entre cada um dos apenados hoje no sistema carcerário brasileiro estão na condição prisão preventiva ou temporária.

Aos Fatos entende que o ministro se confundiu e queria dizer que “Um em cada quatro dos apenados estão na condição prisão preventiva ou temporária”. Mesmo assim a declaração está errada, pois Jungmann subestimou o dado.

De acordo com o Monitor da Violência do G1, com dados do NEV-USP (Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo) e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, no começo do ano eram 236,1 mil encarcerados em regime provisório (cerca de 34,4%), ou seja, cerca de um em cada 2,9 dos apenados. No começo de 2017, eram 247,8 presos na mesma situação (cerca de 37,6% dos presos).

Os dados do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) publicados no ano passado, relativos a 25 tribunais estaduais brasileiros, também mostram uma porcentagem parecida: dos 654.372 presos brasileiros, 221.054 eram provisórios, o que dá mais ou menos 34% do total.


VERDADEIRO

Aproximadamente 27% a 30% dos que se encontram entre as grades hoje estão lá por drogas.

Segundo dados de 2016 do Infopen, os crimes de tráfico correspondem a 28% das incidências penais pelas quais as pessoas privadas de liberdade foram condenadas ou aguardavam julgamento à época.

A maior frequência de crimes ligados ao tráfico de drogas dá-se entre as mulheres: 62%. Entre os homens, os crimes ligados ao tráfico representam 26% dos registros.

Em fevereiro de 2017, o G1 realizou um levantamento junto aos governos estaduais e tribunais de Justiça. Constatou que um em cada três presos no país respondiam, à época, por tráfico de drogas. Em quatro anos, o percentual de presos por tráfico subiu de 23,7% para 32,6% — nenhum estado tem menos de 15% de presos por tráfico.


IMPRECISO

Segundo dados do Gaeco, no ano de 2016 tínhamos 97 membros do famigerado PCC presos no Paraguai.

Esse número aparece em reportagem do jornal Folha de S.Paulo, em um especial sobre o PCC produzido em abril do ano passado. Segundo a reportagem, existem 97 membros do PCC no Paraguai. Eles não estão necessariamente presos. A estimativa foi feita pelo Ministério Público de São Paulo com base em documentos apreendidos. A mesma matéria também diz que o comissário da Polícia Nacional do Paraguai, Abel Cañete, afirma que existem ao menos 40 detentos brasileiros ligados ao PCC no país.


EXAGERADO

O senhor [Temer], que destinou mais de R$ 2 bilhões para o sistema carcerário...

Logo depois do site Contas Abertas revelar que o Funpen tinha R$ 3,3 bilhões “parados”, o governo anunciou que haveria um repasse de R$ 1,2 bilhão do fundo aos estados — a maior parte destinada à construção de penitenciárias e o restante em projetos de cidadania e qualificação de serviços — e um investimento de aproximadamente R$ 2,2 bilhões na área.

O repasse do Funpen realmente ocorreu, porém, de acordo com um relatório do Depen (Departamento Penitenciário Nacional), apenas 3,72% do total foram utilizados pelos estados. Inicialmente, o prazo para utilização dos recursos era até o final de 2017, mas uma portaria do Ministério da Justiça o prorrogou até o fim deste ano. Uma das dificuldades apontadas foi a burocracia e a rigidez das normas exigidas para a aprovação de projetos.

Além disso, de acordo com o jornal O Estado de S. Paulo, nenhum dos projetos aprovados tinha sido iniciado até dezembro de 2017. Ou seja, houve o repasse, mas não foram construídos presídios nem criadas novas vagas. Para se ter uma ideia, a estimativa é de que haja um déficit total de 358.663 vagas prisionais.

Em relação ao investimento de R$ 2,2 bilhões, não há qualquer notícia sobre se esse valor foi empregado e como.

Para 2018, foram liberados mais R$ 590,6 milhões do Funpen, cerca de metade do montante do ano passado. De acordo com o diretor do Depen, Jefferson de Almeida, não é que houve redução, mas que o saldo se encontra menor do que no ano anterior.


VERDADEIRO

Temos hoje, segundo os dados do Anuário Estatístico da Segurança, no ano de 2016, 61 mil mortes.

Segundo o 11° Anuário Brasileiro de Segurança Pública, publicado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, ocorreram 61.283 mortes violentas intencionais em 2016. O número corresponde à soma das vítimas de homicídio doloso, latrocínio, lesão corporal seguida de morte e mortes decorrentes de intervenções policiais em serviço e fora. A taxa foi de 29,7 mortes a cada 100 mil habitantes. A variação foi de 4% em relação a 2015.


IMPRECISO

Dos R$ 81 bilhões gastos com segurança pública em 2016, o esforço maior ficou com os estados, R$ 78 bilhões; a União, com R$ 9 bilhões; e os municípios, com R$ 5 bilhões.

De acordo com 11º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, em 2016 o total de despesas com a função de Segurança Pública foi de R$ 81,2 bilhões: R$ 8,8 bilhões gastos pela União e R$ 5,1 bilhões gastos pelos municípios. Os gastos dos estados, no entanto, foram de R$ 67 bilhões e não R$ 78 bilhões, como afirmou o ministro.

Houve queda nos investimentos de quase todos em relação a 2015. A União gastou 10,3% menos e os Estados, 1,7% menos. Os municípios aumentaram as despesas em 0,6%.


FALSO

Um dos estados que tivemos GLO [Garantia da Lei e da Ordem], há 12 anos não realizava concursos para as suas polícias.

No Rio Grande do Norte, estado ao qual se refere Jungmann, o último concurso público para a Polícia Militar ocorreu, realmente, há 12 anos. Entretanto, a Polícia Civil do Rio Grande do Norte teve uma seleção para delegados, agentes e escrivães civis substitutos em 2008 e que só teve seu resultado divulgado em 2010. Mesmo que ainda seja muito tempo, a declaração é FALSA, já que houve, sim, um concurso para uma das polícias durante os últimos 12 anos.

O último concurso da Polícia Militar do Rio Grande do Norte abriu 1.000 vagas para praças. As inscrições foram realizadas no final de 2005 e o resultado saiu no final de 2006. Vale ressaltar que o estado possui, hoje, 8.316 policiais militares, sendo 7.641 praças e 469 oficiais.

A GLO ocorreu no final de 2017, quando o Rio Grande do Norte recebeu 2.000 militares da Marinha, do Exército e da Aeronáutica devido à recusa dos policiais militares e civis de voltarem a suas atividades por causa do atraso dos salários.


VERDADEIRO

A Constituinte de 1988 fez a separação anterior que existia entre segurança nacional e segurança pública e alocou nos estados praticamente 80%, 90% da responsabilidade com segurança pública. A União ficou com a parte residual e não colocou dentro do sistema de segurança, uma grande e grave falha, as nossas cidades, nossas capitais, a região metropolitana que é fundamental e não tem nenhuma atribuição constitucional.

O artigo 144 da Constituição Federal de 1988 dispõe que a segurança pública é “dever do Estado” e deve ser exercida pelas polícias federal, rodoviária federal, civis, militares e corpos de bombeiros militares.

A responsabilidade, nesse conceito, passa a ser prioritariamente dos estados, por serem eles os responsáveis pela gestão das polícias civil e militar. Assim, os governos estaduais e do Distrito Federal realizam a segurança pública direta, organizando e mantendo o policiamento ostensivo, que é realizado pela Polícia Militar, e devem manter e organizar a Polícia Civil e os órgãos técnicos de investigação dos crimes comuns.

À União compete a defesa dos seus interesses e dos seus órgãos, o policiamento da faixa de fronteira e o combate ao tráfico internacional e interestadual de drogas. Os municípios podem desenvolver ações de prevenção à violência e também podem criar guardas municipais para a proteção de bens, serviços e instalações.

Aos Fatos já mostrou que há estados, como o Rio de Janeiro, em que os repasses do governo federal para a área de segurança pública representam menos de 1% da verba do estado para segurança. E a transferência de recursos, mesmo com a grave crise de segurança pública, vem caindo nos estados mais perigosos do país — no Rio, hoje sob intervenção, a queda foi de 41% nos últimos dois anos.

Em 2016, dos R$ 81 bilhões gastos com segurança pública, R$ 67 bilhões foram gastos pelo governo, R$ R$ 8,8 bilhões pela União, e R$ 5,1 bilhões pelos municípios. Ou seja, as unidades da federação arcaram com 82,7% dos gastos com segurança pública no país.

Outro lado. A reportagem entrou em contato com a assessoria de imprensa do ministro Jungmann por e-mail para eventuais comentários. Porém, até a última atualização desta reportagem, Aos Fatos não havia recebido retorno.


Esta reportagem foi publicada de acordo com a metodologia anterior do Aos Fatos.

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