Pré-candidato pelo Podemos, o senador Alvaro Dias (PR) tem uma participação bem ativa nas redes sociais: está sempre lembrando seus seguidores de seus projetos e missões. Aos Fatos checou algumas das declarações feitas pelo senador em seus perfis no Facebook e no Twitter sobre foro privilegiado e gastos com sistema prisional e educação. Dias cometeu erros em ambas.
Veja, abaixo, o resultado.
Um preso no Brasil custa R$ 2,4 mil por mês e um estudante do ensino médio custa R$ 2,2 mil por ano.
Esta declaração já tinha sido feita em 2016 pela atual presidente do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia, e foi repetida pelo senador Alvaro Dias em seu perfil de Twitter oficial. Além de serem dados de dois anos atrás, também não há pesquisas comprovando os números.
Segundo dados do Ministério da Justiça enviados a Aos Fatos, o custo médio mensal de um preso no Sistema Penitenciário Federal, em 2016, era de R$ 4.600, desconsiderando despesas com pessoal. Já o valor referente aos presos nos sistemas penitenciários estaduais varia de estado para estado: em São Paulo, por exemplo, em 2016, a média era de R$ 1.400 mensais.
Como esses dados são responsabilidade das administrações penitenciárias estaduais, não há nenhum estudo que tenha realizado a média brasileira e a declaração não especifica qual tipo de preso — se é encarcerado em penitenciárias federais ou estaduais ou qual a estrutura e finalidade da unidade prisional —, não é possível ter uma média exata do valor.
De acordo com uma pesquisa realizada pelo IDados, publicada em 2017 com dados de 2014, um aluno do ensino médio custa, em média, cerca de R$ 5.500 anuais. Porém, o estudo ressalta que a média de gastos por aluno não é uma boa medida de custo, já que ela fica muito acima do que a maioria das cidades realmente gasta por aluno porque existem municípios com custos muito elevados. Exemplo disso é que, no ensino médio, os estados do Mato Grosso do Sul e do Sergipe gastaram mais de R$ 9.000 por aluno ao ano. Na Paraíba, no entanto, custou menos de R$ 2.000 no mesmo período.
Já segundo o último relatório sobre educação da OECD (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), também com dados de 2014, o Brasil gasta, em média, $ 3.837,00 por estudante do ensino médio (sem levarmos em conta custos com transporte, comida ou alojamento). Para efeitos de comparação, a média da Argentina, outro país da América Latina, é $ 4.790,00, e dos países da OECD $ 10.106,00.
Vale ressaltar que, mesmo com essa média por preso, o Brasil é o país da América Latina que tem o menor gasto de custeio com seu sistema prisional. O país gasta apenas 0,06% do seu PIB, de acordo com o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento). Se levarmos em consideração os gastos com atividades policiais e justiça criminal, no entanto, o Brasil passa a ser o país latinoamericano que mais gasta: cerca de 3,14% do PIB.
Poucos países do mundo ainda mantêm o foro privilegiado.
De acordo com três fontes consultadas por Aos Fatos, ao menos 20 países têm algum tipo de foro para suas autoridades. De democracias ricas e desenvolvidas a países emergentes com regimes autoritários, a diferença fundamental é que só o Brasil dá privilégio a tantas pessoas e cargos tão diversos.
No Facebook e no Twitter, o pré-candidato do Podemos tem repetido uma de suas principais propostas, que é acabar com o foro privilegiado, um mecanismo garantido pela Constituição e que garante tratamentos diferentes em processos. Ele é autor da PEC 10/2013, que extingue esse foro nos casos de crimes comuns, e já foi aprovada na Câmara dos Deputados.
No Brasil, têm o foro privilegiado o presidente da República, os ministros (civis e militares), todos os parlamentares, prefeitos, e todos os integrantes do Poder Judiciário, do Tribunal de Contas da União (TCU) e do Ministério Público.
Outros países no mundo também possuem o foro privilegiado: de acordo com o estudo de 2016 intitulado “Foro Privilegiado: pontos negativos e positivos”, da consultoria legislativa da Câmara dos Deputados, Colômbia, Áustria, Alemanha, Dinamarca e Noruega possuem previsões de foro especial em suas constituições.
Em outro estudo da Câmara dos Deputados, este de 2015, há referências de foros especiais nas constituições de Chile, Peru, Colômbia, México, Áustria, Alemanha, Dinamarca, Suécia e Noruega. Também menciona Estados Unidos, Argentina, Espanha, França, Itália, Portugal e Venezuela.
Além disso, segundo um levantamento realizado pelo jornal O Globo, outros dois países também possuem mecanismos parecidos: China, no qual os 2.873 integrantes do Congresso Nacional Popular só podem ser julgados com autorização da cúpula da Casa; e Moçambique, que só permite que seus deputados sejam presos em flagrante e processados após autorização votada no Parlamento.
No entanto, nenhuma das constituições mencionadas nos estudos permite que tantas pessoas tenham direito a este benefício quanto o Brasil. "Nenhum país estudado, entretanto, previu tantas hipóteses de foro privilegiado como a Constituição brasileira de 1988", diz o estudo de 2015.
O foro privilegiado no Brasil, por sua vez, contempla os seguintes cargos, segundo a Constituição Federal de 1988: presidente e vice-presidente da República; os membros do Congresso Nacional; os ministros do Supremo Tribunal Federal; o procurador-geral da República; os ministros de Estado; os comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica; os membros dos Tribunais Superiores, os do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente; as autoridades ou funcionário cujos atos estejam sujeitos diretamente à jurisdição do Supremo Tribunal Federal, em caso de habeas corpus; os governadores dos Estados e do Distrito Federal; os desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal; os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho; os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais; as autoridades federais da administração direta ou indireta, em caso de mandado de injunção; os juízes federais, incluídos os da Justiça Militar e da Justiça do Trabalho; os membros do Ministério Público da União; os juízes estaduais e do Distrito Federal e Territórios, bem como os membros do Ministério Público estadual; os prefeitos; os oficiais generais das três Armas; e os juízes eleitorais, nos crimes eleitorais.
Outro lado. De acordo com a assessoria do senador, ambas as declarações não deveriam ter sido analisadas por Aos Fatos como foram. Em relação ao custo de alunos e prisioneiros, foram usadas, conforme a assessoria, as informações do CNJ e da Carmen Lúcia. "Se alguém está errado, é o CNJ e sua própria presidente" que induziu outras pessoas, como o senador, ao erro.
Em relação ao foro privilegiado, o senador entende que "dados errados", como está no título, não condiz com a checagem. Também diz que, para o senador, "talvez 20 países em um universo de mais de 215 nações seja pouco" e que nosso selo talvez esteja "imprimindo um conceito pessoal" à declaração. A resposta termina com "vocês pesaram a mão na manchete, e nós, pelo nosso critério, consideramos 'um erro', ou 'exagerada' a sua colocação".
A reportagem foi atualizada às 11h14 de 27 de fevereiro de 2018 para acrescentar a resposta enviada pela assessoria do senador.