🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Agosto de 2020. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

Bolsonaristas suspensos pelo STF driblam bloqueio e crescem nas redes com críticas à corte

Por Bruno Fávero, Marina Gama Cubas, João Barbosa e Milena Mangabeira

10 de agosto de 2020, 16h00

Menos de duas semanas depois de terem seus perfis em redes sociais suspensos pelo STF (Supremo Tribunal Federal) no inquérito das “fake news”, militantes bolsonaristas já conseguiram contornar as restrições impostas pela corte. Explorando falhas no bloqueio das plataformas e criando novos perfis em sites que não foram afetados pela decisão, como o aplicativo americano Parler, eles recuperaram a maior parte do alcance que tinham nas mídias sociais e, em alguns casos, até o expandiram.

O ministro Alexandre de Moraes, relator do inquérito que investiga produção de desinformação e ataques ao STF, ordenou o bloqueio de 16 contas de Twitter e 12 páginas de Facebook e Instagram que pertencem a bolsonaristas acusados de usar a internet para atacar o tribunal. O Radar Aos Fatos analisou a atividade dos cinco suspensos mais populares nas redes: os blogueiros Allan dos Santos e Bernardo Küster, o empresário Luciano Hang, o ex-deputado federal Roberto Jefferson (PTB-RJ) e a militante de extrema-direita Sara Winter.

No Twitter, quatro deles — a exceção foi Hang— conseguiram furar o bloqueio criando novos perfis e em poucos dias, as novas contas reuniram centenas de milhares de seguidores. O caso mais bem-sucedido foi o de Allan dos Santos, que conseguiu mais do que dobrar o engajamento que tinha em sua conta bloqueada. Nos 14 dias anteriores ao bloqueio, cada um de seus posts gerava, em média, 5.080 interações (curtidas e retweets); desde o dia 24, na nova conta, a média é superior a 11 mil, aumento de 120%. Enquanto isso, Küster recuperou 85% de suas interações, Jefferson, 69%, e Sara Winter, 61%.

A recuperação rápida foi possível em parte por causa da maneira como o Twitter fez o bloqueio. As contas de bolsonaristas tiveram seus tweets substituídos por uma mensagem padrão, mas não foram impedidas de retweetar outros perfis. Assim, os influenciadores têm usado as páginas antigas, com mais seguidores, para promover conteúdo das criadas recentemente, como no exemplo abaixo de Allan dos Santos, que usa a conta @allantercalivre para amplificar a nova @allanldsantos.

Havia ainda outra falha: era possível o conteúdo de um tweet bloqueado ao clicar em "Traduzir Tweet". Postando mensagens em inglês, Sara Winter aproveitou esse lapso e usado sua conta bloqueada para direcionar seguidores para o perfil novo. A partir de sexta-feira (7), esse recurso passou a ficar indisponível.

Já o pedido de bloqueio dos perfis no Instagram não chegou a ser cumprido por causa de outra brecha — na decisão, o ministro Alexandre de Moraes incluiu apenas os endereços de perfis do Twitter e do Facebook.

Assim, não só essas contas continuam no ar como têm crescido. Com exceção de Luciano Hang, que teve leve queda, todos os suspensos viram aumentar o número de interações por post em seus perfis. No caso de Küster e Allan dos Santos, o crescimento passou de 70% na comparação com a semana anterior à decisão de Moraes.

O Facebook é a rede onde o bloqueio parece ter sido mais eficaz. Com exceção de Küster, que criou uma nova página em que reuniu apenas 2.000 seguidores, todos os outros alvos estão fora da rede. Moraes, no entanto, não pediu o bloqueio da conta de Roberto Jefferson, que tem 31 mil curtidas.

Inicialmente as contas do Twitter e do Facebook haviam sido bloqueadas apenas no Brasil, mas no dia 31 de julho Moraes determinou o bloqueio global dos perfis. Tanto o Twitter quanto o Facebook estão recorrendo da decisão no STF (veja o posicionamento das empresas no fim deste texto).

Ataques ao STF. Os cinco bolsonaristas continuam usando suas redes sociais para criticar a Suprema Corte e seus ministros, comportamento que motivou Moraes a ordenar a suspensão das contas originais.

Em um tweet, por exemplo, Sara Winter chega a pedir que o presidente Jair Bolsonaro envie tropas para ocupar a corte.

Em outro, o ex-deputado Roberto Jefferson acusa os ministros de estarem fazendo campanha para que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) possa ser candidato em 2022.

O endosso a críticas ao STF também é um dos principais assuntos abordados por outras contas que mencionam os perfis bolsonaristas no Twitter. Com acusações como as de que os ministros promovem a censura e que teriam acordo com o tráfico de drogas, o tema aparece na rede de menções às contas de Allan dos Santos, Bernardo Kuster, Sara Winter e Roberto Jefferson, ilustradas abaixo:

O grafo acima foi construído a partir de um algoritmo que identificou quais dos novos perfis bolsonaristas tiveram o maior número de respostas vindas de usuários aleatórios. Cada cor representa um grupo dos usuários que mais interagiu com o perfil principal. Quanto maior o nó (perfil), mais respostas ele recebeu.

Além da Suprema Corte, outros alvos de críticas dessas redes foram o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o influenciador digital Felipe Neto. A análise considerou 8.000 perfis que fizeram menção às novas contas entre os dias 27 de julho e 4 de agosto. Veja mais detalhes aqui.

Novo e velho. Além de ter falhas e de não ter impedido os ataques ao STF, o bloqueio determinado pela corte atingiu apenas parte de uma ampla rede de disseminação de conteúdo que inclui canais no YouTube e contas em outras plataformas, além de sites como o Terça Livre, de Allan dos Santos, e Brasil Sem Medo, de Küster.

Essa rede foi usada para promover as contas criadas para driblar a suspensão e também ajuda a explicar por que os influenciadores bolsonaristas conseguiram recuperar seu alcance tão rápido.

E esse conjunto vem crescendo. A mais recente adição é o Parler, aplicativo americano que tem atraído nomes de direita, como o presidente Jair Bolsonaro, com um discurso de que dá mais liberdade de expressão aos usuários. Desde 2 de julho, o site também é usado pelos cinco bolsonaristas alvos do STF.

A rede é significativamente menor que outras mais tradicionais, como Twitter e Facebook, mas em pouco mais de um mês o grupo acumulou nela dezenas de milhares de seguidores. Allan dos Santos e Bernardo Kuster, os mais populares, têm 59 mil e 48 mil seguidores, respectivamente. Em seguida, vêm Sara Winter e Roberto Jefferson, ambos com 17 mil, e Luciano Hang, com 14 mil. Os dois blogueiros são também os que mais engajam seus seguidores — cada um dos posts de Allan tem, em média, 2.354 interações, contra 1.357 de Küster.

O assunto mais tratado pelos investigados continua o mesmo das outras plataformas: críticas ao STF e seus integrantes bem como às ações de bloqueio de suas contas no Twitter e no Facebook no inquérito no qual são investigados.

Outro lado. Questionado pela reportagem, o Twitter não respondeu sobre as brechas no bloqueio implementado pela plataforma. Em nota, a empresa disse que "bloqueou contas para atender a uma ordem judicial proveniente de inquérito do Supremo Tribunal Federal (STF). Embora não caiba ao Twitter defender a legalidade do conteúdo postado ou a conduta das pessoas impactadas pela referida ordem, a empresa considera a determinação desproporcional sob a ótica do regime de liberdade de expressão vigente no Brasil e, por isso, recorreu da decisão de bloqueio".

O Aos Fatos também entrou em com o STF e com o Facebook, mas não teve resposta até a publicação deste texto.

Referências:
1. G1
2. El País
3. UOL

sobre o

Radar Aos Fatos faz o monitoramento do ecossistema de desinformação brasileiro e, aliado à ciência de dados e à metodologia de checagem do Aos Fatos, traz diagnósticos precisos sobre campanhas coordenadas e conteúdos enganosos nas redes.

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