Bolsonaro usou ‘reunião do golpe’ para difundir falso elo entre PT e PCC, que viralizou na eleição

Por Gisele Lobato

8 de fevereiro de 2024, 18h00

A estratégia de vincular o PT ao crime organizado — tema de peças desinformativas que viralizaram na véspera das eleições e após a posse de Lula — foi adotada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e pelo então ministro da Justiça, Anderson Torres, em reunião de cúpula em 5 de julho de 2022.

Segundo a PF (Polícia Federal), o encontro foi gravado e serviu para Bolsonaro “cobrar dos presentes conduta ativa na promoção da ilegal desinformação e ataques à Justiça Eleitoral”. A estratégia foi usada com o objetivo de “manter mobilizadas as manifestações em frente às instalações militares, após a derrota eleitoral e, com isso, dar uma falsa percepção de apoio popular, pressionando integrantes das Forças Armadas a aderirem ao golpe de Estado em andamento”.

  • Além dos ataques à lisura do pleito, Bolsonaro usou a reunião para fazer “acusações falsas e sem nenhum indício, afirmando que o dinheiro do narcotráfico teria financiado o atual presidente da República Lula da Silva e outros ex-presidentes de países da América do Sul”, de acordo com a PF;
  • Bolsonaro fez referências à delação premiada do empresário Marcos Valério, condenado no escândalo do Mensalão, e ao assassinato do ex-prefeito de Santo André (SP), Celso Daniel (PT);
  • Na época da reunião, esses episódios eram usados por peças de desinformação que buscavam associar o PT à organização criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital).

Duas semanas após a reunião, em 18 de julho, o então presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), ministro Alexandre de Moraes, determinou a remoção de conteúdos que apresentavam essas alegações, afirmando que “liberdade de expressão não é liberdade de propagação de discursos mentirosos, agressivos, de ódio e preconceituosos”. Como o Aos Fatos mostrou, porém, Bolsonaro e seus apoiadores mantiveram o discurso mesmo após a decisão.

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Em outro momento da reunião, Torres também teria insinuado uma ligação do PT com a facção paulista, “afirmando que muita coisa estaria vindo à tona, inclusive com depoimentos”.

“Estamos aí, presidente [Bolsonaro], desentranhando a velha relação do PT com o PCC”, declarou o então ministro da Justiça.

Também levantando suspeitas infundadas sobre a segurança das urnas, Torres garantiu aos presentes que a PF, subordinada à pasta comandada por ele, estaria atuando de “forma mais incisiva”, mas defendeu que “o mais importante é cada um entender o momento agora e as colocações que a gente deve fazer”, instigando os participantes da reunião a mostrar “nossa preocupação com tudo isso que tá acontecendo no Brasil”.

Associar Lula ao PCC foi a principal estratégia das redes de desinformação bolsonaristas na véspera da eleição de 2022, conforme o Aos Fatos mostrou. Esse discurso se propagou por meio de autoridades, como Bolsonaro; de correntes apócrifas no Telegram e no WhatsApp; de conteúdos divulgados por veículos alinhados ao presidente, como a Jovem Pan; e em plataformas como Twitter e YouTube.

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A tentativa de vincular o governo eleito ao crime organizado foi mantida mesmo após a derrota de Bolsonaro nas urnas. Ela foi usada, por exemplo, por peças de desinformação que tiveram como mote a visita do então ministro da Justiça de Lula, Flávio Dino, ao Complexo da Maré, no Rio de Janeiro, em março do ano passado.

Bolsonaro e Torres foram dois dos alvos da Operação Tempus Veritatis, desencadeada nesta quinta-feira (8), com o aval do ministro Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), para investigar uma tentativa de golpe de Estado após a derrota do então presidente nas eleições de 2022.

Além de Bolsonaro e Torres, participaram da reunião outros alvos da operação da PF, como o general Augusto Heleno (então chefe do Gabinete de Segurança Institucional) e o ex-ministro da Casa Civil e candidato a vice-presidente na chapa de Bolsonaro em 2022, o general Walter Braga Netto.

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