Não é verdade que os Estados Unidos tenham anunciado que a droga hidroxicloroquina – usada para tratar malária, lúpus e artrite – é eficaz contra a Covid-19. Também não é verdade que medicamentos à base de cloroquina podem ser considerados tratamentos eficazes contra a doença – mesmo em fase experimental. Não houve 100% de sucesso nos testes em pacientes, diferentemente do que posts nas redes sociais afirmam.
No caso dos EUA, o país de fato permitiu que sejam realizados testes experimentais para determinar se medicamentos derivados da cloroquina podem ser usados contra a doença. Porém, não há evidências conclusivas.
Além disso, o tratamento não é indicado para o novo coronavírus, segundo a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), a SBFC (Sociedade Brasileira de Farmácia Clínica) e a SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia).
A desinformação tem se propagado nas redes por meio de um vídeo publicado no Instagram pelo médico Aléssio Gianinni Cavalcanti Alves, que tem vínculo ativo no SUS (Sistema Único de Saúde) como clínico e psiquiatra em São José do Belmonte (PE). Na gravação, posteriormente apagada do perfil, ele diz que as pessoas devem comprar o remédio, já que “devido a toda essa pandemia, pode vir a faltar”.
Há também posts amplificando anúncio do governo de produzir a droga para efeito terapêutico com o objetivo de curar pacientes. Não é possível atestar a eficácia desse tipo de tratamento ainda.
Já há o CFM (Conselho Federal de Medicina) alerta que a automedicação pode causar risco à saúde.
Veja um resumo do que checamos:
1. É falso que um estudo americano determinou que a hidroxicloroquina é eficaz no tratamento contra a Covid-19. Aos Fatos não encontrou nenhum estudo conclusivo assinado por pesquisadores dos EUA sobre o tema nas principais revistas científicas. Há apenas um rascunho de uma revisão de literatura de pesquisas recentes que foi compartilhado por um grupo de cientistas independentes. Em nota, a Anvisa, a SBFC, a SBI e o CFM afirmaram que as pesquisas existentes não são conclusivas e que, portanto, o remédio não pode ser recomendado para o tratamento da doença;
2. O médico erra ao dizer que 42 pacientes foram tratados com cloroquina e curados da Covid-19. Há um estudo francês — não americano, como ele afirma — que foi feito com 42 infectados por coronavírus, mas somente 20 pacientes foram tratados com hidroxicloroquina. Desses, 12 deixaram de apresentar o vírus após o tratamento, sendo que em um dos casos, a carga viral aumentou após dois dias sem tratamento.
3. É distorcida a informação de que hidroxicloroquina é "bastante usada" na China. A droga, na verdade, foi aplicada em cem pacientes chineses durante um estudo conduzido por três pesquisadores do país;
4. Não é verdade que o presidente americano, Donald Trump, anunciou que a hidroxicloroquina é eficaz contra o novo coronavírus – ele apenas liberou o uso experimental da droga. A FDA, agência de vigilância sanitária americana, ainda deve conduzir pesquisas clínicas para determinar se o remédio de fato funciona;
5. Por fim, é falso que tenha sido comprovado que a hidroxicloroquina é eficaz contra a Covid-19. Em nota técnica sobre o assunto, a Anvisa esclareceu que “apesar de promissores, não existem estudos conclusivos que comprovem o uso desses medicamentos para o tratamento da Covid-19”.
Disseminado no Facebook por perfis pessoais, o vídeo acumulava cerca de 30 mil compartilhamentos até a tarde desta sexta-feira (20). Todas as postagens foram marcadas com o selo FALSO na ferramenta de monitoramento da rede social (saiba como funciona).
Acaba de ser anunciado um estudo americano que a hidroxicloroquina, o antimalária, que a gente tem muito aqui no Brasil, é eficaz contra o coronavírus, a Covid-19.
O Aos Fatos não encontrou estudo americano publicado nas principais revistas científicas que relate o efeito da hidroxicloroquina em pacientes com Covid-19. Existe apenas um rascunho de um artigo científico que ainda não foi encaminhado a nenhum periódico. Esse texto foi escrito por um grupo independente de cientistas que apresenta apenas uma revisão da literatura dos experimentos recentes com derivados da cloroquina realizados em outros países. O texto circula nas redes sociais desde 13 de março e foi compartilhado por personalidades, como o presidente-executivo da Tesla, Elon Musk.
O texto chegou a ser falsamente atribuído à Universidade de Stanford porque um dos pesquisadores envolvidos é consultor de um programa de pesquisa da Escola de Medicina da instituição americana. Em nota no site oficial, a universidade informou que não está envolvida em nenhum artigo científico que sugira o potencial de derivados da cloroquina, como a hidroxicloroquina, no tratamento de pacientes com Covid-19.
Até o momento, foram realizados três testes com medicamentos derivados da cloroquina (sulfato de cloroquina e hidroxicloroquina) in vitro e também em pacientes com Covid-19 na China. Os três estudos in vitro foram publicados em revistas científicas em 12 de fevereiro, 9 de março e 18 de março. Em fevereiro, a Comissão Nacional de Saúde do governo chinês passou a permitir o uso experimental da cloroquina para tratar pacientes. Com essa liberação foi feito um estudo clínico com 100 pacientes, cujo resultado foi publicado na revista BioScience Trends, em 16 de março.
A Coreia do Sul também permite o uso experimental da cloroquina em pacientes com Covid-19, mas não tem publicação de estudos clínicos até o momento. Na França, um grupo de pesquisadores de diversas instituições divulgou um artigo com os resultados de um estudo clínico que foi publicado na International Journal of Antimicrobial Agents.
Em nota da SBFC (Sociedade Brasileira de Farmácia Clínica), que afirmou, também em nota, que “os estudos publicados possuem baixo nível de evidência e portanto baixo grau de recomendação”. A SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia) e o CFM (Conselho Federal de Medicina) também não indicaram o uso de medicamentos de derivados de cloroquina.
Em comunicado oficial divulgado sobre o tema, a FDA (Food and Drug Administration, agência de vigilância sanitária americana) informou que os estudos ainda estão “em andamento para determinar a eficácia do uso de cloroquina no tratamento do COVID-19”.
40 pacientes graves foram tratados com essa medicação e 100% foram curados.
O autor do vídeo provavelmente se refere a um estudo clínico francês que teve seus resultados divulgados nas redes nesta semana. No estudo, foram investigados o caso de 42 paciente. Apenas 12 dos 20 pacientes tratados com hidroxicloroquina deixaram de apresentar o vírus após o tratamento, sendo que em um dos casos, a carga viral aumentou após dois dias sem tratamento.
No estudo, os pesquisadores relatam o resultado de testes conduzidos com 42 pessoas infectadas com o novo coronavírus. Dessas, 14 receberam uma dose diária de hidroxicloroquina e 6 receberam dose dos dois medicamentos combinados: a hidroxicloroquina e o antibiótico azitromicina; outras 16 integraram o grupo de controle (que não recebeu o medicamento). Ao longo do estudo, seis pacientes que estavam recebendo a medicação abandonaram os testes — três foram transferidos para centros de tratamento intensivo, um morreu (o estudo não detalha se teve relacionamento com o tratamento e a morte ocorreu após o vírus não ter mais sido detectado em exame), um abandonou o hospital e outro decidiu deixar de tomar a medicação por excesso de náusea —, o que resultou em um grupo final de 20 indivíduos recebendo a medicação.
Na conclusão do estudo, os pesquisadores afirmam que após seis dias de tratamento, oito das 14 pessoas que tomaram apenas a hidroxicloroquina tiveram teste negativo de Covid-19. Entre as que tomaram a hidroxicloroquina e a azitromicina, todas as seis tinham carga viral indetectável no teste, sendo que uma passou a ter carga viral detectável no oitavo dia de acompanhamento. Entre as pessoas que não receberam nenhuma medicação, duas em 16 tiveram significativa redução da carga viral.
A médica e professora de infectologia da UnB (Universidade de Brasília), Valéria Paes Lima, afirma que o estudo tem uma amostra pequena e problemas metodológicos. “A cloroquina tem efeitos colaterais como arritmia e problemas hepáticos. O estudo não apresenta dados suficientes para saber em que casos a introdução do remédio pode melhorar ou agravar o quadro do paciente”, explica.
Os autores do estudo também mencionam as limitações metodológicas que incluem "a pequena amostra estudada, a curto período de acompanhamento após o tratamento e a saída de seis pacientes durante o estudo".
Em artigo publicado no site do Instituto Questão da Ciência, os pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas da USP (Universidade de São Paulo), Luiz Gustavo de Almeida e Natalia Pasternak, discutem os resultados do estudo e contestam a afirmação de que a hidroxicloroquina tem uso efetivo comprovado no tratamento da infecção pelo Sars-Cov-2. “Do ponto de vista da lógica científica, o estudo, cheio de furos (...) e envolvendo um número muito pequeno de participantes (...) tem tanto valor como recomendação médica quanto uma receita psicografada”.
De acordo com os autores da USP, há uma série de falhas metodológicas no estudo que tornam a conclusão pouco confiável: o ensaio clínico foi feito com poucos pacientes, não foi realizado de maneira randômica (o que significa que os médicos sabiam quem ia receber o remédio e quem ia ficar no grupo de controle), os pacientes sabiam se estavam ou não tomando o remédio e não foi feita a inclusão de um grupo placebo.
Os pesquisadores concluem que, por mais que os resultados possam ser considerados animadores, é necessário replicar o estudo com mais pessoas e incluir os controles adequados "antes de concluir qualquer coisa ou de avançar sobre as prateleiras das farmácias". Segundo eles, "só assim poderemos confiar nos dados e deixar o viés de confirmação de lado. Existem, de fato, alguns estudos sérios que sugerem que remédios da família da hidroxicloroquina podem ser úteis contra certos vírus, mas também sabemos já que ela é uma droga caprichosa – funciona contra alguns vírus, não contra outros –, e tem efeitos colaterais”.
(...) tava sendo bastante usado na China e que tava tendo uma grande eficácia.
A cloroquina foi, de fato, usada em alguns casos de tratamento da Covid-19 na China, mas não em larga escala como sustenta Aléssio Gianinni Cavalcanti Alves no vídeo. Um estudo clínico conduzido por três pesquisadores chineses em dez hospitais de Wuhan — região que registrou os primeiros casos da doença —, Pequim e Xangai para medir o efeito da cloroquina no tratamento de epidemias associadas à Covid-19 demonstraram resultados positivos em cerca de cem pacientes.
Os pesquisadores relataram que a substância ajudou a “inibir a exacerbação da pneumonia, melhorando os exames de imagem nos pulmões, promovendo uma conversão a um estado negativo do vírus e diminuindo o curso de infecção da doença”. Ao fim do estudo, eles afirmam que os participantes da pesquisa, incluindo especialistas a serviço do governo e de autoridades regulatórias, chegaram “ao consenso de que o fosfato de cloroquina tem atividade potencial contra o coronavírus”.
Como o medicamento, no entanto, foi usado apenas em casos específicos de um teste clínico, e não de maneira abrangente, a afirmação foi considerada DISTORCIDA.
Agora é oficial, inclusive o presidente americano Donald Trump provavelmente vai fazer um pronunciamento que essa droga é eficaz e é capaz de curar o coronavírus.
Por mais que tenha, de fato, feito pronunciamento a respeito da possibilidade de uso da hidroxicloroquina para o tratamento da Covid-19, o presidente americano Donald Trump anunciou, na última quinta-feira (19) apenas a aprovação do tratamento experimental com a droga, não a liberação total de seu uso. Trump afirmou em discurso que pediu à FDA (Food and Drug Administration, agência de vigilância sanitária americana) que elimine barreiras para dar à população acesso a drogas que possam tratar a infecção pelo novo coronavírus, dentre elas a hidroxicloroquina.
O diretor da FDA, Stephen Hahn, disse nesta sexta-feira (20) que a agência tem se empenhado em descobrir, “em meio ao mar de novos tratamentos”, o medicamento correto na dosagem correta para eliminar o vírus. Sobre a hidroxicloroquina, afirmou que "é uma droga que o presidente pediu que observássemos mais de perto para determinar se realmente pode beneficiar pacientes. E, outra vez, queremos fazer isso com o uso de testes clínicos, grandes e pragmáticos testes clínicos para realmente conseguir essa informação”.
Em comunicado oficial divulgado sobre o assunto, a FDA informou que os estudos ainda estão “em andamento para determinar a eficácia do uso de cloroquina no tratamento do Covid-19”. O órgão também ressaltou que ainda é preciso determinar se o medicamento pode ser usado para tratar pacientes com Covid-19 leve a moderado e entender como ele atua na redução da disseminação viral, o que pode ajudar a impedir a propagação da doença.
(...) dessa esperança que surgiu dessa medicação ter um estudo comprovado que agora é oficial.
Diferentemente do que afirma o médico, ainda não há evidências conclusivas de que a hidroxicloroquina seja de fato eficiente no tratamento da Covid-19. Em nota técnica sobre o assunto publicada na última quinta-feira (19), a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) esclareceu que “apesar de promissores, não existem estudos conclusivos que comprovem o uso desses medicamentos para o tratamento da Covid-19”. O posicionamento da agência foi reforçado pela SBFC, pela SBI e pelo CFM, nenhumas dessas organizações recomenda o uso da cloroquina para o tratamento da Covid-19.
No texto, a agência cita um dos estudos in vitro desenvolvido por pesquisadores chineses, que avaliaram o efeito a hidroxicloroquina e do sulfato cloroquina contra o Sars-Cov-2. Os pesquisadores afirmam que a primeira medicação conseguiu inibir a entrada do vírus na célula e combater estágios posteriores relacionados à infecção.
Outro estudo clínico aberto e não randomizado e ainda não publicado em nenhum periódico científico, conduzido em 42 pacientes no sul da França, também chegou à conclusão de que a droga pode ser eficaz. Uma revisão sistemática sobre o assunto, no entanto, mostrou que “dados de segurança e dados de ensaios clínicos de maior qualidade são urgentemente necessários”.
A Anvisa também ressaltou, na nota, que, por enquanto, não recomenda que o medicamento seja utilizado em pacientes infectados ou mesmo como forma de prevenção à doença. Alerta, ainda, que a automedicação pode representar um grave risco à saúde do paciente.
Outro lado. Aos Fatos tentou contato com o médico Aléssio Alves por meio dos telefones das unidades de saúde em que ele possuía vínculo ativo com o SUS. Não foi possível, no entanto, localizá-lo: em alguns casos, o número de telefone não existia; em outro, o hospital negou que o médico ainda atuasse no local. Aos Fatos deixou, então, uma mensagem privada no perfil do médico no Facebook e ainda não recebeu retorno.
A checagem foi atualizada no dia 26 de março de 2019, às 14h18 para incluir informações sorbe publicação do estudo francês em períodico acadêmico. A atualização não altera o selo da checagem.
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