O que o Senado mudou na Previdência e quais os impactos para a reforma

Compartilhe

O Senado aprovou em primeiro turno nesta quarta-feira (2) o texto da reforma da Previdência (PEC 6/2019), que muda as regras de aposentadoria no país.

Para evitar que o texto retornasse à Câmara, as alterações foram pequenas: ficaram restritas a supressões de trechos aprovados pelos deputados e mudanças de redação. Ainda assim, tiveram um impacto significativo: o governo estimava uma economia de cerca R$ 900 bilhões com o texto que saiu da Câmara, e o número caiu para R$ 800 bilhões com as alterações dos senadores.

Para entrar em vigor, o texto precisa passar por votação em segundo turno na Casa, que ainda não tem data marcada. Outras mudanças, como a adesão de estados e municípios à reforma e emendas rejeitadas de senadores para a PEC original, ainda podem ocorrer por meio de uma PEC paralela que tramita no Senado.

Abaixo, veja o que mudou e o que continuou igual na reforma da Previdência:

1. Benefício de Prestação Continuada

Resumo. A reforma da Previdência aprovada na Câmara restringia quem podia receber o BPC (Benefício de Prestação Continuada), benefício mensal de um salário mínimo pago a idosos e deficientes pobres. O Senado reverteu a mudança.

Como é hoje. A Lei Orgânica da Assistência Social, de 1993, estabelece que têm direito ao BPC idosos e deficientes com renda familiar per capita de até um quarto do salário mínimo (que seria R$ 249,50). A regra, porém, foi considerada inconstitucional pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em 2013. Na decisão, os ministros estipularam o patamar de meio salário mínimo para concessão do benefício.

Como saiu da Câmara. O texto incluiria na Constituição a regra segundo a qual o benefício seria concedido apenas àqueles com renda familiar per capita menor do que um quarto do salário mínimo.

Como ficou. O texto do Senado suprime a regra do BPC da Constituição e mantém apenas a regulação definida pela lei nº 8.742. Volta a valer, portanto, o entendimento do STF do patamar de meio salário mínimo per capita para o idoso ou deficiente receber o benefício.

O impacto. A alteração no texto pelo Senado diminui o impacto fiscal da reforma da Previdência em R$ 25 bilhões, segundo estimativa da IFI (Instituição Fiscal Independente), citada no relatório do senador Tasso Jereissati.

2. Aposentadoria especial

Resumo. A reforma da Previdência aprovada na Câmara dos Deputados dificultava a aposentadoria especial de trabalhadores expostos a substâncias nocivas. O texto aprovado pelo Senado ameniza essa mudança.

Como é hoje. Trabalhadores nessas condições podem se aposentar por tempo de contribuição (com 15, 20 ou 25 anos, dependendo do tipo de agente a que foram expostos).

Como saiu da Câmara. O texto propunha manter os tempos mínimos de contribuição, mas implementar também um sistema de pontos que somaria idade com o tempo de trabalho e que ficaria mais exigente a cada ano.

De imediato, começaria a valer uma regra segundo a qual aqueles que hoje se aposentariam com 15 anos de contribuição precisariam também somar 66 pontos para se aposentar (por exemplo, 51 anos de idade e 15 de contribuição ou 46 anos de idade e 20 de contribuição); já a aposentadoria aos 20 anos de contribuição exigiria 76 pontos e, por fim, 25 anos exigiriam 86 pontos.

Além disso, o texto da Câmara previa que, a partir de 2020, a exigência aumentaria em um ponto por ano para todas as categorias, até atingir 81, 91 e 96 pontos, respectivamente.

Como ficou. O texto do Senado mantém a regra de 66, 76 e 86 pontos, mas retira o dispositivo segundo o qual a exigência aumentaria ano a ano.

O impacto. Segundo estimativa da IFI (Instituição Fiscal Independente), R$ 6 bilhões deixarão de ser economizados em 10 anos.

3. Abono salarial

Resumo. O governo Bolsonaro tentou restringir as regras para concessão de abono salarial, uma espécie de 14º salário para trabalhadores que ganham até dois salários mínimos.

Como é hoje. Trabalhadores que recebem até dois salários mínimos (hoje, R$ 1.996), estão inscritos no PIS/Pasep há pelo menos cinco anos e trabalharam ao menos um mês no ano ganham do governo um abono de até um salário mínimo (R$ 998). O benefício é pago em proporção ao tempo trabalhado no ano anterior – 12 meses dão direito ao valor integral.

Como saiu da Câmara. Na proposta enviada ao Congresso pelo governo Bolsonaro, o abono ficaria restrito a quem ganha até um salário mínimo. Na Câmara, o valor foi aumentado de R$ 998 para R$ 1.364,43.

Como ficou. No Senado, a restrição do benefício foi mantida no relatório do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), mas foi retirada na votação dos destaques (alterações propostas por senadores). Ou seja, permanecem as regras atuais, que beneficiam quem ganha até dois salários.

O impacto. Com a restrição no abono prevista no texto dos deputados, a IFI calculava uma economia de R$ 70,2 bilhões em dez anos, que não se concretizará. Cerca de 12,7 milhões de pessoas deixariam de receber o benefício, segundo cálculos do economista Daniel Ferrer, do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), feitos a pedido da Federação dos Trabalhadores da Indústria Química e Farmacêutica.

Na semana passada, pesquisadores do Ipea defenderam mudanças do abono, argumentando que, no modelo atual, 59% dos benefícios pagos são concedidos a famílias na metade mais rica da população.

Mesmo na esquerda, há quem defenda a restrição do abono salarial. Ministro da Fazenda no governo Dilma Rousseff (PT), Nelson Barbosa escreveu texto para o blog do Ibre-FGV (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas) em que apoia a redução da linha de corte para um salário mínimo.

4. Pensão por Morte

Resumo. A PEC aprovada pela Câmara abria brecha para que alguns beneficiários da pensão por morte recebessem menos do que o salário mínimo sob as novas regras. O Senado alterou o texto para proibir essa possibilidade.

Como é hoje. Dependentes recebem 100% da aposentadoria de quem morreu. A duração do benefício varia de acordo com a idade do dependente que o recebe (veja aqui) – e é vitalícia se ele ou ela tem a partir de 44 anos.

Como saiu da Câmara. A pensão passaria a variar dependendo do número de dependentes. Se for apenas um, o pagamento é de 60% do benefício recebido por quem morreu. Cada dependente extra adiciona dez pontos percentuais ao valor pago (até o limite de 100%, com cinco dependentes). O benefício é integral quando o dependente é deficiente.

Como ficou. O Senado manteve a regra de cálculo, mas estipulou que nenhum pensionista pode receber menos do que um salário mínimo.

O impacto. O governo deixa de economizar R$ 10 bilhões em 10 anos, segundo estimativa do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE).

5. PEC paralela

Para não atrasar a aprovação da atual reforma da Previdência, o relator Tasso Jereissati optou por incluir alterações maiores em na chamada PEC Paralela, que tramita no Senado.

A principal medida prevista é incluir estados e municípios na reforma, mas Jereissatti também já afirmou que pretende reduzir o tempo mínimo de contribuição para homens, aumentar a aposentadoria por incapacidade em caso de acidente, propor a criação de um benefício para crianças carentes, entre outros pontos.

A iniciativa de propor uma PEC paralela foi tomada porque qualquer mudança no mérito da PEC original da reforma exigiria que ela fosse enviada de volta à Câmara para uma nova votação. Já supressões e mudanças de texto, como as que foram feitas, podem ser realizadas sem o aval dos deputados.

O texto da PEC paralela está na CCJ (Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania) do Senado. Depois disso, terá que ser votado em dois turnos pelo Plenário da Casa e, então, será encaminhado para a Câmara para ser analisada pelos deputados.


As principais mudanças promovidas pela reforma da Previdência aprovada na Câmara, como idade mínima e regra de cálculo dos benefícios, não sofreram alterações pelo Senado. Veja quais são as principais e como elas mudam as regras atuais de aposentadoria:

6. Idade mínima

Como ficou. Os requisitos mínimos para aposentadoria de trabalhadores urbanos seguem os mesmos do texto aprovado na Câmara: 62 anos de idade e 15 anos de contribuição no caso das mulheres e 65 anos de idade e 20 anos de contribuição no caso dos homens.

Como é hoje. É possível se aposentar tanto por idade (65 anos para homens e 60 para mulheres) quanto por tempo de contribuição (35 anos para homens e 30 para mulheres).

7. Alíquotas de contribuição

De acordo com o texto-base aprovado pela Câmara, as alíquotas de contribuição ao INSS serão progressivas de acordo com faixas de salário, de maneira similar ao que acontece com o Imposto de Renda:

Regime Geral (INSS)

• Até um salário mínimo: 7,5%

• De um salário mínimo a R$ 2.000: 9%

• De R$ 2.000 a R$ 3.000: 12%

• De R$ 3.000 até o limite do do INSS (atualmente R$ 5.839,45): 14%

• Não haverá cobrança adicional nas faixas salariais acima do teto do INSS.

Regime Próprio (Servidores públicos federais)

• Até um salário mínimo: 7,5%

• De um salário mínimo a R$ 2.000: 9%

• De R$ 2.000 a R$ 3.000: 12%

• De R$ 3.000 ao teto do INSS (R$ 5.839,45): 14%

• Do teto a R$ 10.000: 14,5%

• De R$ 10.000 a R$ 20.000: 16,5%

• De R$ 20.000 a R$ 39.000: 19%

• Acima de R$ 39.000: 22%

As alíquotas vão de 7,5% a 14% para quem trabalha no setor privado. Mas, como o cálculo divide os salários em faixas que recebem descontos proporcionais, a alíquota máxima efetiva deve ser de 11,68% para quem recolhe sobre o teto do valor de contribuição.

No caso de quem trabalha no setor público, as alíquotas vão de 7,5% para servidores que ganham até um salário mínimo, e chegam a 22% para quem ganha acima do teto estipulado (R$ 39 mil). Como, a taxação também é feita sobre as faixas de valores do salário, a alíquota máxima efetiva é de 16%.

Como é hoje. No setor privado, as alíquotas atuais são nominais e preveem três faixas de cobrança — 8% de contribuição para salários de até R$ 1.751,81; 9% para salários de R$ 1.751,82 a R$ 2.919,72; e 11% para salários de R$ 2.919,73 até R$ 5.839,45 (teto do INSS). No setor público, a alíquota é de 11%.

8. Regra de cálculo

De acordo com a reforma, a nova regra de cálculo dos benefícios funciona da seguinte maneira:

Homens e mulheres

• Ao atingir o tempo mínimo de contribuição de 15 anos, recebe-se 60% da média salarial.

• Valor recebido aumenta 2% a cada ano contribuído, até atingir o teto aos 35 anos, no caso das mulheres, e 40 anos, no caso dos homens.

• Média de valores de todas as contribuições pagas

Para atingir 100% do benefício, homens terão que contribuir por 40 anos e mulheres, 35.

Como é hoje. O valor do benefício na aposentadoria por idade começa em 70% do salário médio de contribuição e soma 1% para cada ano trabalhado, até o limite de 100%. Já quem se aposenta por tempo de contribuição tem o valor do benefício reduzido pelo fator previdenciário. Há também a opção de aposentadoria com o valor integral a partir da regra 85/95: somando idade e tempo de contribuição, mulheres devem acumular 85 anos e homens, 95.

As regras de definição do valor também mudam: atualmente, o INSS calcula a média salarial do trabalhador considerando os 80% maiores salários desde julho de 1994. Isso significa que os 20% menores são descartados. Isso não deve acontecer com a nova Previdência.

Compartilhe

Leia também

Relatório da PF inclui Aos Fatos na lista de monitorados ilegalmente pela ‘Abin Paralela’

Relatório da PF inclui Aos Fatos na lista de monitorados ilegalmente pela ‘Abin Paralela’

Meta fecha os olhos para golpes por receio de perder verbas de publicidade

Meta fecha os olhos para golpes por receio de perder verbas de publicidade

falsoNetanyahu não disse que país ocidental forneceu urânio para programa nuclear do Irã

Netanyahu não disse que país ocidental forneceu urânio para programa nuclear do Irã