Com uma estrutura que inclui perfis falsos, posts patrocinados e páginas que imitam a identidade visual da Meta, golpistas têm enganado usuários que buscam obter selos de verificação no Facebook e no Instagram. Captados nas redes, esses usuários são direcionados a domínios que cobram valores entre R$ 79,90 e R$ 179,90 por serviços que nunca são entregues.
- Desde o dia 27 de maio, o Aos Fatos detectou ao menos 137 anúncios que promovem o golpe do selo de verificação. As 84 peças ativas até a manhã de terça-feira (6) foram removidas pela Meta após o contato da reportagem;
- Esses anúncios remetem os usuários aos seguintes domínios: seuperfilverificado.online, seuperfilverificado.com, seloverified.com, seuperfilverificado.com.br, selo.app.br e mercadap.shop, verificacacaooficial.com, verificarperfil.com e selometa.store;
- Além do selo de verificação, os golpistas oferecem ainda supostos produtos como um pacote mensal de estrelas (usadas para monetizar transmissões ao vivo), proteção contra falsificação de perfil e monitoramento de conta.
A identidade visual dos domínios e os benefícios propagandeados pelo golpe são similares aos do programa Meta Verified, anunciado em fevereiro pela Meta e atualmente disponível apenas na Austrália, na Nova Zelândia, nos Estados Unidos, no Reino Unido, no Canadá e na Índia.
O Meta Verified ainda não está disponível no Brasil, mas começará ser testado nas próximas semanas, conforme anúncio interno divulgado nesta quarta-feira (7) por Mark Zuckerberg e obtido pelo Aos Fatos.
O programa é similar ao Twitter Blue, assinatura mensal que oferece ao usuário do Twitter um selo azul até então cedido gratuitamente a perfis e páginas com relevância em seus campos de atuação. Segundo a Meta, o serviço ajuda o usuário a “estabelecer sua presença no Instagram e no Facebook” por meio de uma proteção à conta, suporte técnico direto e um selo que impediria a disseminação de perfis falsos.
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O esquema. Ao clicar no botão “comprar”, o usuário é redirecionado a uma página em que deve escolher para qual rede social gostaria de obter o selo. Essa opção, no entanto, não está disponível em todos os domínios, que às vezes apenas redirecionam o comprador diretamente para uma plataforma de pagamento. Alguns domínios apresentam também um campo em que o usuário precisa digitar o endereço de seu perfil; em outros, a opção não aparece.
Replicando uma estratégia comum de golpes de internet, as páginas afirmam ainda que as vendas serão encerradas em breve para incentivar usuários a completarem a transação o mais rapidamente possível.
Logo abaixo do botão de compra, três selos supostamente apontam que a transação é segura. Ao clicar nesses selos, no entanto, o usuário não é redirecionado às páginas que garantem a segurança do domínio, mas sim à tela seguinte da transação, que pede dados pessoais e de pagamento. Ao analisar o código-fonte da página, Aos Fatos verificou que esses selos não são oficiais e que se trata, na verdade, de uma imagem inserida pelos golpistas para simular a integridade dos domínios.
ANÚNCIOS NO FACEBOOK E NO GOOGLE
No Facebook, os anúncios que propagandeiam o golpe são promovidos por páginas e perfis que usam imagens e identidades falsas. O Aos Fatos não conseguiu identificar as pessoas físicas ou jurídicas responsáveis pelas contas. Também não há informações sobre o número de usuários alcançados.
Um dos perfis falsos usa, por exemplo, uma foto extraída de um banco de imagens para simular uma suposta vendedora do serviço. O Aos Fatos identificou a modelo, que tem nome diferente do que aparece nos perfis golpistas; não há indícios de que ela tenha qualquer ligação com o esquema. Já outro perfil, que pertence supostamente a um homem chamado Pablo Rodrigues, usa uma imagem publicada pelo ator britânico Tom Coulston em sua página do Instagram.
Outro perfil identificado pelo Aos Fatos usa ainda uma foto gerada pelo site This Person Does Not Exist, que cria rostos com o uso de inteligência artificial.
Os anúncios também tiram de contexto vídeos em que criadores anunciam detalhes do programa Meta Verified para propagandear o golpe. Em um deles, publicado em fevereiro no TikTok, o especialista em segurança digital William Dolato comenta sobre o lançamento do programa na Austrália e na Nova Zelândia. Em 25 de maio, o criador publicou outro vídeo em que afirma que golpistas estariam usando seu conteúdo para promover sites fraudulentos nas redes.
Em nota enviada ao Aos Fatos, a Meta afirmou que o programa Meta Verified será lançado no Brasil nas próximas semanas e que “estará disponível aos poucos para que as pessoas realizem a compra tanto para o Instagram, quanto para o Facebook”. Os brasileiros poderão comprar uma assinatura mensal, sendo o valor de R$ 45 (caso seja adquirida pela web) e R$ 55 (se adquirida pelo aplicativo, seja em iOS ou Android) e tudo será feito exclusivamente nos canais da Meta.
A empresa também afirmou que está comprometida em monitorar e analisar as violações relatadas e tomar medidas contra publicações que violam suas políticas. Os anúncios fraudulentos denunciados pela reportagem foram removidos.
Além dos posts patrocinados na plataforma da Meta, o Aos Fatos identificou cinco anúncios no Google que promoviam o site golpista seuperfilverificado.com. Todos eles foram pagos pela empresa Pereira & Breier Ltda., uma empresa do ramo de cosméticos, cujo nome fantasia é Gold Club.
Em nota, o Google informou que retirou os anúncios do ar e que não comenta sobre casos específicos. A empresa afirmou que não permite “anúncios, conteúdo ou destinos maliciosos, que enganem os usuários excluindo informações relevantes sobre produtos ou que forneçam informações enganosas sobre produtos, serviços ou empresas”.
Procurada pelo Aos Fatos, a Pereira & Breier não retornou o contato.
OS NOMES POR TRÁS DO GOLPE
Os sócios da Pereira & Breier, responsáveis pelos anúncios do seuperfilverificado.com, são Diego Pereira e Gabriel dos Santos Breier. De acordo com a Receita Federal e o CruzaGrafos, ferramenta da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) que mostra informações societárias, a companhia tem sede em Charqueadas (RS) e uma filial em Indaiatuba (SP). Os dois sócios têm ligação com empresas voltadas ao depósito de mercadorias e outras do ramo de cosméticos.
No LinkedIn, Gabriel Breier se apresenta como mentor, especialista em engenharia de negócios e escala e presidente da Gold Club, “holding de seis empresas com faturamento que já ultrapassou a barreira dos R$ 280 milhões”. Pereira traz números similares em seu perfil e se diz proprietário da Conexão Premium, empresa destinada a alavancar as vendas de clientes.
Outra sócia das empresas relacionadas ao grupo Gold Club, de acordo com o CruzaGrafos, é Kevylin Oliveira da Silva, companheira de Breier. Ela é irmã de Keyse Oliveira, que aparece nas redes em fotos com Pereira. Em 2020, o Gold Club apontou em post no Instagram que Keyse atuava como gerente de logística do grupo, cargo que ocupa até hoje, segundo seu perfil no LinkedIn.
Outros domínios. O Aos Fatos verificou que ao menos 4 dos 9 domínios (seuperfilverificado.com, seuperfilverificado.com.br,
seloverified.com e selo.app.br) usados para aplicar o golpe estão registrados em nomes de outras pessoas ou empresas brasileiras; os demais domínios não apresentam dados públicos suficientes que permitam identificar os responsáveis. Todos os domínios foram registrados entre 22 de abril e 3 de junho de 2023.
Ao contrário do que ocorreu no caso da Pereira & Breier, em que os sócios se identificam nas redes como responsáveis pela empresa, a reportagem não conseguiu confirmar se as pessoas listadas como sócias de outras empresas relacionadas ao golpe são, de fato, responsáveis pelas páginas — ou se tiveram seus dados usados de forma fraudulenta, por exemplo.
MARKETING DE AFILIADOS
Gabriel Breier foi um dos palestrantes da Afiliados Brasil, evento que se autodenomina “o maior congresso sobre marketing de afiliados da América Latina”. Em uma das palestras, o empresário teria ensinado como anunciar no Facebook sem sofrer bloqueios da plataforma. O material, no entanto, não está disponível publicamente.
É chamada de marketing de afiliados toda relação comercial em que uma pessoa (afiliado) divulga um produto e recebe uma comissão por cada venda realizada. Embora seja legal e usada há anos por grandes redes do varejo online como a Amazon e Magazine Luiza, a estratégia também tem sido usada para aumentar a rede de capilaridade de golpes na internet.
Contatados pelo Aos Fatos, Gabriel Breier e as irmãs Kevylin e Keyse Oliveira não responderam. Em 8 de junho, um dia após a publicação desta reportagem, Diego Pereira afirmou que desconhece o site seuperfilverificado.com, e que o nome da empresa estaria sendo usado de maneira indevida.
Esta reportagem foi atualizada às 15h27 de 12.06.2023 para incluir o posicionamento de Diego Pereira.