Luiz Fernando Menezes

🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Novembro de 2023. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

Luz, gás, comida e Netflix: como a reforma tributária vai afetar o seu bolso

Por Luiz Fernando Menezes

16 de novembro de 2023, 15h57

A reforma tributária vai reduzir os preços dos alimentos? Os custos de Uber e Netflix devem subir? Como essa mudança afeta as contas de luz e de gás? A PEC 45/2019 avançou mais alguns passos na semana passada, quando foi aprovada pelo Senado. O texto agora volta para a Câmara, onde ainda pode sofrer modificações.

A reforma, que reduz o total de tributos sobre o consumo — que caem de cinco para dois —, afeta desde a cesta básica até as heranças e pode provocar mudanças importantes nos orçamentos das famílias brasileiras e nos seus hábitos de consumo.

Aos Fatos consultou especialistas e estudos para estimar esse impacto em seis perguntas e respostas essenciais.

  1. A reforma vai fazer os preços caírem?
  2. Os custos de água, gás e luz podem subir?
  3. Quem vai pagar menos impostos?
  4. As regras do MEI e do Simples Nacional mudam?
  5. Como fica o custo da cesta básica?
  6. Heranças vão pagar mais imposto?

1. A reforma vai fazer os preços caírem?

Sim, a expectativa é que o preço de mercadorias em geral caia com a aprovação da reforma tributária, de acordo com especialistas ouvidos. Isso porque a carga tributária sobre os produtos — formada por PIS, Cofins, IPI e ICMS — gira em torno de 47% hoje. Com a reforma, a estimativa é de que esse percentual seja de 27,5%. O tamanho real da alíquota, no entanto, ainda será determinada em lei posterior.

Infográfico mostra que PIS, Cofins e IPI serão substituídos por CBS, enquanto ICMS e ISS serão substituídos por IBS

A variação de preços não será imediata, pois o texto aprovado no Senado prevê prazo de dez anos para a implementação. IPI, PIS e Cofins, por exemplo, serão extintos em 2027. Já ICMS e ISS só acabam em 2033.

E se, por um lado, a reforma deve reduzir o preço final de mercadorias, o valor pago por serviços pode subir, segundo o advogado tributarista Bruno Minoru Takii. Isso porque, hoje, esse setor recolhe alíquotas de ISS (Imposto Sobre Serviços) que variam de 2% a 5%, dependendo do município. Com a unificação, as empresas passariam a recolher 27,5%, custo que seria repassado aos consumidores.

“De fato, o seu bolso vai ser menos onerado. Mas, se você depende muito do serviço, a história é outra. Hoje, sobre serviço, você tem um imposto chamado ISS. E cada município também tem a sua alíquota geralmente de 2% a 5%. Vai passar a 27,5%”, explicou ele ao Aos Fatos.

Há ainda previsão de que serviços de internet, streaming de vídeo (como Netflix) e aplicativos de entrega e transporte fiquem mais caros, uma vez que, após a implantação dos novos tributos, pagarão alíquotas maiores do que as atuais.

2. Os custos de água, gás e luz podem subir?

Há estimativas que apontam que os custos dos brasileiros com luz e gás podem subir, sim. A variação da conta de água ainda é incerta, já que serviços de saneamento foram incluídos entre os setores que terão tributação reduzida.

Antes da aprovação da PEC no Senado, a Aesbe (Associação Brasileira das Empresas Estaduais de Saneamento) estimou que as tarifas de água poderiam crescer em até 18%. Isso porque, segundo o levantamento, o setor é atualmente tributado apenas em 9,25% pelo PIS/Cofins. Com a reforma, passaria a 27,5%.

O Senado, porém, incluiu os serviços de saneamento na lista de setores que terão regime diferenciado de tributação, determinado por uma lei complementar posterior. Portanto, ainda não é possível saber o impacto no preço final ao consumidor.

A energia elétrica e o gás, por outro lado, não foram incluídos na lista de exceções; por isso, a estimativa é que essas tarifas aumentem com a reforma. “Principalmente a conta de gás, que poderá ainda ser incluída na lista de produtos sujeitos ao imposto seletivo [tributo que incidirá sobre determinados produtos ou serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente]”, explicou Takii.

Há ainda receio entre os especialistas de que a reforma possa alterar o programa de tarifa social da energia elétrica, destinado a famílias de baixa renda que podem obter descontos de até 100% na conta. Isso porque a PEC determina a devolução de parte dos impostos pagos ao público-alvo deste benefício.Porém, o Ministério de Minas e Energia disse, em nota enviada ao Sintaf-CE (Sindicato dos Fazendários do Ceará), que o programa será mantido.

De acordo com o consultor empresarial e coordenador do MBA de Gestão Financeira e Econômica de Tributos da FGV (Fundação Getúlio Vargas), Arnaldo Marques, não há nada no texto aprovado que determine a extinção do benefício, apesar da previsão do cashback do imposto. Por isso, ele afirma que não se pode saber ao certo o que vai ocorrer com a tarifa social.

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Cashback. A reforma propõe ainda a criação de um sistema de devolução de parte do dinheiro gasto com impostos pelas camadas mais pobres da população. A ideia é que famílias de baixa renda recebam parte dos tributos pagos nas contas de energia elétrica e gás de cozinha e também na cesta básica ampliada (ver tópico 5).

Não há, no entanto, informações sobre qual será a faixa de renda contemplada pelo benefício ou como ele será operacionalizado. Sua regulamentação provavelmente será feita por meio de lei complementar votada após a aprovação da reforma.


3. Quem vai pagar menos impostos?

O texto aprovado no Senado determina descontos e até isenção de imposto para alguns serviços e produtos. Abaixo, listamos os setores contemplados e quanto da alíquota-base vão pagar, se a atual versão da reforma for sancionada.

A medida é benéfica para empresários e consumidores desses setores, mas pode ter o efeito colateral de aumentar a alíquota-base do imposto unificado.

“É só pensar em uma conta de restaurante. Se temos duas pessoas e uma diz que vai pagar 25% e não 50%, sobra para a outra pagar o restante. O mesmo acontece com o imposto: você tem que aumentar a alíquota geral para compensar setores que vão ter uma alíquota menor”, afirma Marques, da FGV.

4. As regras do MEI e do Simples Nacional mudam?

Não, esses dois regimes não são alcançados pela reforma em tramitação no Congresso. Representantes dos empresários dessas categorias chegaram a pedir a atualização nos limites de renda necessários, mas o pleito não foi atendido.

Hoje, podem aderir ao Simples Nacional as microempresas e empresas de pequeno porte que possuam receita bruta anual igual ou inferior a R$ 4,8 milhões. Já o MEI é destinado a empreendedores que faturam até R$ 81 mil anuais.

Esses limites podem ser reajustados pelo governo ou pelo Congresso, desde que a proposta seja aprovada pelos parlamentares e sancionada pelo presidente. Há, por exemplo, um PLP no Senado que aumenta o faturamento de MEI para R$ 130 mil.

5. Como fica o custo da cesta básica?

O texto atual da reforma cria dois tipos de cesta básica, que terão sua composição definida posteriormente em lei complementar:

  • A Cesta Básica Nacional de Alimentos será composta por itens considerados essenciais para o consumo das famílias brasileiras. Todos os produtos que integrarem essa cesta serão isentos de impostos;
  • Já a cesta básica “estendida” terá uma variedade maior de alimentos e itens de higiene. Os produtos desta categoria terão alíquota reduzida, de 40% da original, e um sistema de cashback atenderá famílias de baixa renda.

O texto da reforma prevê que a composição das duas cestas deverá respeitar a "diversidade regional e cultural da alimentação". Levantamento da FGV mostrou que há uma grande discrepância entre os produtos que integram a cesta básica atual: em Sergipe, por exemplo, constam na lista o queijo de coalho e o charque; em Santa Catarina, são entregues embalagens de erva-mate; em Minas Gerais, há distribuição de pão de queijo e rapadura.

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6. Heranças vão pagar mais imposto?

Os estados já recolhem atualmente o tributo que incide sobre heranças, o ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação). A reforma cria uma cobrança progressiva desse imposto: quanto maior for o legado do morto ou doador, maior será a taxa cobrada.

As porcentagens, no entanto, não foram determinadas no texto da PEC e não há informações sobre eventuais diferenças nas alíquotas dos estados. A taxa máxima, entretanto, deve permanecer em 8%.

Além disso, o texto da reforma aprovado no Senado determina algumas mudanças no sistema de ITCMD, como:

  • Herança só poderá ser recolhida no estado de domicílio do morto ou doador. Isso impede, por exemplo, que herdeiros escolham estados com menores alíquotas para realizar a operação;
  • Taxação nos casos em que o doador ou os bens estejam no exterior. Hoje, esse cenário não gera tributação.

Colaborou Amanda Ribeiro. Infográfico por Méuri Elle.

Referências:

1. Senado (1 e 2)
2. EBC
3. Folha de S.Paulo (1 e 2)
4. JOTA
5. Ministério de Minas e Energia
6. Sintaf-CE
7. G1 (1 e 2)
8. Serviços e Informações do Brasil
9. Sebrae

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