Reprodução/TV Cultura

🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Janeiro de 2024. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

No Roda Viva, Haddad desinforma ao dizer que governo Lula não criou novos impostos

Por Luiz Fernando Menezes e Marco Faustino

25 de janeiro de 2024, 16h51

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), enganou ao afirmar na segunda-feira (22) em entrevista ao Roda Viva, da TV Cultura, que a gestão dele não criou impostos ou aumentou alíquotas de tributos. Além de ter instituído a taxação de apostas online, o governo Lula (PT) editou normas no ano passado para tributar fundos de investimento e aumentar impostos sobre armas de fogo.

Outra informação enganosa citada pelo ministro foi a de que os preços da gasolina hoje são mais baixos do que os registrados ao fim do governo Bolsonaro (PL), quando foi zerada a cobrança de tributos federais sobre os combustíveis. Atualmente, a média do preço do insumo é de R$ 5,58; ao fim da gestão anterior, o preço médio era de R$ 5,23.

Confira abaixo o que checamos:

  1. É falsa a afirmação de que o governo federal não criou impostos ou aumentou alíquotas desde o ano passado. Além do tributo que passou a ser cobrado sobre apostas online, foram editadas medidas provisórias que instituíram a taxação de fundos de investimento fechados, por exemplo;
  2. Haddad também errou ao dizer que a gasolina está mais barata hoje do que no final de 2022, quando não eram cobrados tributos federais sobre o insumo. O valor médio praticado em dezembro daquele ano, de R$ 5,23, é menor do que o atual, de R$ 5,58;
  3. Por fim, é verdadeira a alegação de que o novo arcabouço fiscal determina que o governo pode ter um aumento de despesa mínima de 0,6% e máxima de 2,5%, descontada a inflação.

Selo falso

Estão dizendo que está havendo um aumento de carga tributária. Não. Não está havendo aumento de carga tributária. Ninguém criou imposto, ninguém aumentou a alíquota.

Nesse trecho da entrevista, Haddad fazia menção à queda na arrecadação federal, que havia sido identificada pela equipe econômica após análise do Orçamento. Ele afirmou, então, que sua gestão vinha tentando reverter o problema sem criar novos impostos — e, consequentemente, sem aumentar a carga tributária. A declaração, no entanto, é FALSA, já que, desde o ano passado, o governo Lula (PT) criou novos tributos e aumentou alíquotas de outros já existentes:

  • Um projeto de lei proposto pelo Poder Executivo e aprovado em 2023 determinou que apostas online passarão a ser tributadas a partir deste ano. De acordo com o texto, uma alíquota de 15% incidirá sobre qualquer prêmio obtido;
  • O governo também publicou no ano passado a MP 1.163/2023, que estabeleceu uma alíquota de 9,2% sobre a exportação de óleos brutos de petróleo e minerais betuminosos. O imposto teve vigência entre março e junho de 2023;
  • Foi publicada ainda a MP 1.184/2023, que criou novas regras para tributação de fundos fechados — aqueles que permitem o resgate de valores apenas após o fim do prazo de vigência do investimento. Com a nova norma, sua tributação se igualou à dos fundos abertos — que permitem o resgate de valores a qualquer momento. A partir deste mês, portanto, haverá cobrança de IRPF (Imposto de Renda) sobre os rendimentos, e o pagamento deverá ser feito periodicamente;
  • O presidente Lula também aumentou, por meio do decreto nº 11.764, o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) sobre armas de fogo, munição e afins. A medida passa a valer no primeiro trimestre deste ano.

Vale ressaltar ainda que o governo também tentou aumentar a alíquota de Imposto de Renda que incide sobre rendimentos obtidos no exterior por meio da MP 1.171/2023. O texto, no entanto, não foi aprovado a tempo pelo Congresso e perdeu a validade.

Bruno Takii, advogado tributarista e conselheiro do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), apontou ao Aos Fatos ainda que a reforma tributária, aprovada no ano passado, criou o Imposto Seletivo, apelidado de “imposto do pecado”, que incidirá sobre produtos ou serviços considerados prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, como tabaco e bebidas alcoólicas. O tributo, no entanto, só entrará em vigor a partir de 2027 e ainda não foram definidos os itens que serão tributados.

Leia mais
Explicamos Luz, gás, comida e Netflix: como a reforma tributária vai afetar o seu bolso

De acordo com o último relatório da Receita Federal, a carga tributária bruta do governo geral — ou seja, dados que englobam as esferas federal, estadual e municipal — foi de 33,71% do PIB (Produto Interno Bruto) em 2022. Se levarmos em consideração apenas o governo federal, a carga tributária foi de 22,78% no ano retrasado. Os dados referentes a 2023 ainda não foram divulgados.


Selo não é bem assim

A gasolina e o diesel estão mais baratos do que no governo Bolsonaro. E o PIS/Cofins e o imposto sobre combustível fóssil voltou a ser cobrado.

Haddad engana ao afirmar que os preços dos combustíveis estariam mais baixos atualmente do que no ano passado, quando o governo Bolsonaro (PL) determinou a isenção de tributos federais. De acordo com dados da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), o valor cobrado atualmente pela gasolina é maior do que o registrado entre setembro e dezembro de 2022, quando os impostos estavam zerados.

Já no caso do diesel, que de fato está mais barato atualmente, o ministro omite que uma série de situações elevaram o preço do insumo durante a gestão Bolsonaro e impediram a queda dos preços, mesmo sem a cobrança dos impostos federais.

Entre janeiro e agosto de 2022, o preço médio cobrado pela gasolina no Brasil, em valores corrigidos pela inflação, variou entre R$ 5,69 e R$ 7,76 — acima da média atual, de R$ 5,58. Para frear o crescimento dos preços, o governo sancionou em junho a lei complementar nº 194, que isentou o combustível do PIS/Cofins até 31 de dezembro daquele ano. A lei também limitou a cobrança do ICMS — tributo estadual — para uma alíquota de até 18%.

As medidas fizeram com que o preço da gasolina caísse de uma média nacional de R$ 7,66 em junho para R$ 6,35 em julho. Em agosto, o preço médio cobrado pelo insumo caiu para R$ 5,69, e chegou a R$ 5,23 em dezembro de 2022.

Já o diesel teve os impostos zerados por Bolsonaro por meio da lei complementar nº 192 entre 1º de março e 31 de dezembro de 2022. Os preços, no entanto, se mantiveram elevados no período em que a lei vigorou — entre R$ 6,83 e R$ 7,94 na fórmula S10, e R$ 6,70 e R$ 7,83 na S500. Em fevereiro, antes da norma, o litro do diesel S10 era vendido a R$ 6,22, e o S500 a R$ 6,15, em valores corrigidos pela inflação.

Entre os motivos apontados por especialistas para os preços altos estão a política de preços praticada pela Petrobras na época, que era orientada pelo câmbio e pelas flutuações do preço do barril de petróleo no mercado internacional, a escassez do insumo devido ao conflito entre Rússia e Ucrânia e demandas regionais.

Em 2023, a Petrobras mudou sua política de preços, em uma tentativa de reduzir o valor dos combustíveis. Em contrapartida, houve outras medidas que oneraram os insumos:

  • Assim que assumiu, o presidente Lula prorrogou por dois meses a isenção de impostos federais sobre a gasolina, medida que havia sido implementada por Bolsonaro às vésperas da eleição. A taxação voltou a ocorrer em março, quando o valor médio do litro passou de R$ 5,30 para R$ 5,70 (em valores corrigidos pela inflação);
  • No âmbito estadual, o ICMS passou a ter uma alíquota fixa e única de R$ 1,22 por litro de combustível em razão da mudança na regra tributária instituída pela lei complementar nº 192, de 2022. Isso também fez com que o valor dos insumos aumentasse.
Leia mais
WHATSAPP Inscreva-se no nosso canal e receba as nossas checagens e reportagens

Selo verdadeiro

O que o arcabouço prevê, que é uma novidade na legislação, é que você vai ter um aumento real de despesa mínima de 0,6% e máxima de 2,5%, para justamente funcionar como mecanismos anticíclicos. Se tiver uma recessão, você garante a despesa do governo. Se tiver um crescimento exorbitante, você economiza justamente para equilibrar no tempo as contas públicas.

A declaração é VERDADEIRA. De fato, o arcabouço fiscal — nome dado ao conjunto de regras e medidas aprovadas em 2023 com o objetivo de equilibrar as contas públicas — prevê que as despesas do governo podem variar entre 0,6% e 2,5% ao ano, descontando-se a inflação. O objetivo desse mecanismo é evitar que os gastos aumentem de maneira excessiva em momentos de crescimento econômico ou caiam durante situações de crise.

A nova regra estipula também que o crescimento das despesas deve equivaler a no máximo 70% do crescimento da receita acumulada nos últimos 12 meses até junho, descontada a inflação, respeitando o intervalo de 0,6% a 2,5% de aumento por ano. A diretriz não se aplica aos gastos com saúde e educação, que já são disciplinados por outra regra.

  • Na prática, portanto, caso a arrecadação do governo aumente em 2%, as despesas podem crescer em até 1,4%;
  • Caso a receita cresça 5%, no entanto, o aumento da despesa não pode ser de 3,5% (70% do total), já que a porcentagem desrespeitaria o limiar definido na lei;
  • Nesse caso, o governo estaria limitado à expansão máxima de 2,5%. O restante seria parcial ou totalmente destinado a compor um fundo para estimular o crescimento econômico;
  • Já no caso de a receita crescer abaixo do intervalo mínimo, o aumento das despesas fica limitado a até 50% do crescimento da receita.

Outro lado. Aos Fatos entrou em contato com a assessoria do Ministério da Economia na tarde da última quarta-feira (24) para que o ministro pudesse comentar as checagens. Até a publicação desta reportagem, no entanto, não houve retorno.

Referências:

1. Câmara dos Deputados (1, 2, 3 e 4)
2. Planalto (1, 2, 3 e 4)
3. Senado (1 e 2)
4. Portal do Investidor
5. DOU
6. UOL
7. Congresso Nacional
8. Tesouro Nacional
9. ANP
10. CNN Brasil (1 e 2)
11. g1
12. Quatro Rodas
13. Veja
14. Ministério da Fazenda
15. Folha de S.Paulo

Topo

Usamos cookies e tecnologias semelhantes de acordo com a nossa Política de Privacidade. Ao continuar navegando, você concordará com estas condições.