Adriano Ishibashi/Framephoto/Estadão Conteúdo

🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Julho de 2021. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

Por que a energia ficou mais cara e como fazer para economizar na conta de luz

Por Marco Faustino

14 de julho de 2021, 11h24

A conta de luz dos brasileiros ficou, em média, 12,4% mais cara nos últimos doze meses, segundo o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) de junho, e a tendência é que esse custo suba ainda mais. Isso porque entrou em vigor no início de julho o reajuste da atual bandeira tarifária, que, para se ter uma ideia, acrescenta R$ 9,49 às faturas pagas por residências que consomem 100 kWh (quilowatt-hora) mensais.

O preço elevado é resultado de uma crise hídrica que assola os reservatórios das hidrelétricas, principal fonte geradora de energia do país, mas também da baixa diversificação da matriz energética, de acordo com especialistas ouvidos por Aos Fatos. Com a oferta reduzida, o governo autorizou o acionamento de usinas termelétricas, que geram energia mais cara, e esse custo foi repassado aos consumidores por meio da elevação da bandeira tarifária.

A seguir, Aos Fatos explica as razões para a crise energética e mostra como é possível economizar na conta de luz.

  1. Por que a conta de luz ficou mais cara?
  2. O que são bandeiras tarifárias e como elas funcionam?
  3. Como é calculada a conta paga pelo consumidor?
  4. O preço vai continuar subindo?
  5. O que eu posso fazer para economizar?
  6. O que o governo pode fazer para resolver o problema?
  7. O horário de verão evitaria mais aumentos na conta de luz?
  8. Há risco de racionamento de energia ou de apagão?


1. Por que a conta de luz ficou mais cara?

A conta de luz subiu porque, além do reajuste tarifário anual, houve uma alta adicional do valor do kWh (quilowatt-hora) nas bandeiras tarifárias, sistema que repassa aos consumidores custos da geração de energia (saiba abaixo como funciona). Segundo a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), o aumento se deve ao acionamento de usinas termelétricas, que geram energia mais cara e se mostraram necessárias com a crise hídrica que atinge os reservatórios de hidrelétricas.

O reajuste foi ainda maior na bandeira tarifária vermelha patamar 2, a mais alta do sistema e a que está em vigor para os consumidores no momento. Desde 4 de julho, as contas de luz já trazem o reajuste de 52% do kWh aprovado pela Aneel para ela. Assim, além do valor do consumo e de impostos e encargos, os consumidores pagam R$ 0,09492 por kWh. Antes, o custo era de R$ 0,06243 kWh. Isso quer dizer que, em uma conta de 100 kWh, apenas a bandeira tarifária subirá R$ 3,25, passando de R$ 6,24 para R$ 9,49.

O reajuste tarifário anual, previsto em lei, também está mais salgado. Neste ano, a revisão média autorizada pela Aneel para as distribuidoras do país está atualmente em 6,94%. No ano passado, foi de 3,25%, e, em 2019, 1,67%, segundo a agência reguladora.

De acordo com a Aneel, este aumento reflete a valorização do dólar, o encarecimento de materiais usados pelas empresas, como cobre, concreto e vergalhões, e a alta do IGP-M (Índice Geral de Preços de Mercado), usado para reajustes de contratos e que fechou 2020 com alta de 23,14%. As tarifas, e seus respectivos reajustes, variam conforme a distribuidora da região.

Na cidade de São Paulo, por exemplo, os reajustes da bandeira vermelha e da tarifa da distribuidora Enel SP devem representar uma alta de 12,87% no valor final de uma conta de luz residencial de 200 kWh já em julho, segundo cálculos do economista André Braz, responsável pelos índices de preços ao consumidor da FGV (Fundação Getulio Vargas).

2. O que são as bandeiras tarifárias e como elas funcionam?


O sistema de bandeiras tarifárias vigora no Brasil desde janeiro de 2015 e sinaliza mensalmente as altas e baixas no preço da geração de energia em patamares nas cores verde, amarelo e vermelho. Se o custo da geração sobe, como acontece agora com o acionamento de termelétricas, muda a bandeira e o consumidor paga a mais na conta.

A bandeira verde é o estágio inicial, em que não há qualquer cobrança adicional para a geração de energia. A amarela já sinaliza uma alta na conta de luz, hoje de R$ 0,01874 por kWh. As vermelhas são divididas em patamar 1 e 2, com custo adicional de R$ 0,03971 e R$ 0,09492 por kWh, respectivamente.

Foi justamente a bandeira vermelha patamar 2, em que os consumidores residenciais se encontram hoje, que sofreu o maior reajuste autorizado pela Aneel, de 52%. Segundo a agência, o aumento "contempla os custos de geração de energia elétrica decorrentes da conjuntura hidrológica de exceção vivenciada neste momento, a pior desde 1931".

Apesar de o sistema de bandeiras ser recente, o repasse dos custos de geração da energia aos consumidores sempre existiu. Antes, os valores cobrados pelas geradoras eram avaliados por doze meses e, então, repassados de uma única vez às contas de luz. Agora essa avaliação é feita mensalmente.

3. Como é calculada a conta paga pelo consumidor?


O preço pago pelos consumidores residenciais na conta de luz corresponde, em média, segundo a Aneel, aos custos de geração (33% do valor), transmissão (7%) e distribuição (19%) de energia, além de impostos (31%), como ICMS, PIS e Cofins, e subsídios para políticas públicas (10%), como a tarifa social.

Não é possível, porém, estabelecer uma proporção exata de cada custo que incide sobre a conta porque existem diferenças entre as faixas de consumo, e os estados são livres para definir a alíquota de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) que recai sobre a energia elétrica. Há ainda tarifas definidas localmente, como a estabelecida em alguns lugares para financiar a manutenção da iluminação pública.

As condições de compra, distribuição e transmissão também variam e impactam de maneira diferente no valor da conta de luz dependendo da região. A Enel, por exemplo, afirma que o custo pago às geradoras de energia equivale a 27,3% do valor da fatura ao consumidor no Rio de Janeiro. No Ceará, a distribuidora informa uma parcela de 32,9%.

4. O preço vai continuar subindo?


Mais aumentos não estão descartados pelo menos até a chegada do período chuvoso. A Aneel discute atualmente um novo reajuste da bandeira tarifária vermelha patamar 2 para R$ 0,1150 por kWh em agosto. Já as revisões anuais da tarifa de energia são feitas caso a caso, de acordo com a distribuidora da região.

5. O que eu posso fazer para economizar na conta de luz?


Mudanças simples nos hábitos podem resultar em economia na conta, como, por exemplo, tirar da tomada aparelhos eletrônicos sem uso; trocar lâmpadas incandescentes ou fluorescentes pelas de LED; evitar abrir e fechar a porta da geladeira frequentemente; reduzir o uso do ar-condicionado, do chuveiro elétrico, do ferro de passar e da máquina de lavar. Veja aqui uma lista de dicas do Idec (Instituto de Defesa do Consumidor).

Ao comprar eletrodoméstico, é importante observar a sua classificação no Procel (Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica). O selo A significa que o produto é mais eficaz no uso da energia e, portanto, economiza mais. Nas lojas físicas, o selo Procel fica no mostruário e, na internet, na seção de informações técnicas do produto.

O consumidor deve ainda ficar atento à evolução do consumo descrito na conta de luz. Assim, além de poder controlar melhor o gasto de energia, ele pode identificar e contestar mais rapidamente eventuais problemas na medição ou cobranças abusivas.

6. O que o governo pode fazer para resolver o problema?


Entre as soluções de curto prazo, especialistas ouvidos por Aos Fatos apontam a necessidade de campanhas de conscientização sobre o uso de energia e de água e estímulos à economia de energia. Para o economista André Braz, uma opção neste sentido seria dar descontos a quem consumisse menos que o habitual. Ele ressalta que, no momento, a conscientização da população é a maior arma que o governo tem em mãos para lidar com a crise atual.

Em paralelo a isso, o governo deveria investir na diversificação da matriz energética, hoje muito dependente das hidrelétricas e "refém" do clima. Adriano Pires, economista e diretor da CBIE (Centro Brasileiro de Infraestrutura), afirma que construir meios de geração de energia mais diversificados e de maior confiabilidade é crucial para enfrentar o problema no médio e longo prazos. Entre essas matrizes, ele destaca usinas térmicas a gás, biogás e nucleares.

"Não tem energia ruim, o ruim é não ter energia. O problema é que chove, e as pessoas esquecem, e aí nos encontramos na próxima crise. Não dá para ser assim”, disse Pires.

7. O horário de verão evitaria o aumento na conta de luz?


Não, porque é muito pequeno o impacto do horário de verão sobre o consumo de energia elétrica. Em 2017, ele gerou uma economia média de apenas 0,5%. A medida é útil ao proporcionar uma certa folga ao sistema em horários de pico de consumo, mas insuficiente para conter uma crise de abastecimento ou mesmo para baratear a conta de luz, explica o economista Roberto Brandão, do Gesel (Grupo de Estudos do Setor Elétrico) da UFRJ.

Mudanças nos hábitos da população também fizeram com que o horário de verão perdesse sua eficácia com o passar dos anos. “Em 2001, 2002, o horário de pico era 18h ou 19h, quando você chegava em casa, ligava o chuveiro elétrico, e acendia as luzes da casa. Agora, passou a ser às 15h, porque o vilão é o ar-condicionado”, exemplificou Adriano Pires, do CBIE (Centro Brasileiro de Infraestrutura).

8. Há risco de racionamento de energia ou de apagão?


Ainda não se sabe ao certo, embora o governo federal afirme que o setor elétrico trabalha para evitar um racionamento e negue a possibilidade de apagão. Especialistas ouvidos por Aos Fatos avaliam que uma política de racionamento como a adotada em 2001 seria pouco provável hoje, porque o sistema de transmissão e a oferta de energia no país são melhores atualmente. Eles ressaltam, porém, que o desempenho das autoridades será decisivo para avaliar a necessidade de controlar mais o consumo ou fazer desligamentos temporários.

Em 2001, o Brasil passou por uma crise hídrica similar, que afetou os reservatórios das hidrelétricas e, consequentemente, a oferta de energia. Na época, o governo chegou a cogitar desligar temporariamente a energia de algumas regiões, mas essa possibilidade foi descartada em razão do sucesso da política de racionamento implementada. Com a meta de reduzir 20% da demanda, o racionamento compulsório estabelecia cotas que, uma vez ultrapassadas, geravam penalizações ao consumidor.

Por definição, uma política de racionamento deve ser estabelecida formalmente pelo governo, mas o brasileiro hoje já viveria na prática um "racionamento via preço", segundo os economistas André Braz e Adriano Pires. Isso porque os aumentos sucessivos na conta de luz acabam por inibir o consumo de energia elétrica e incentivar a economia.

O aumento da capacidade produtiva do setor elétrico nos últimos anos também afastaria, por ora, o risco de apagões e daria margem para o governo conseguir contornar a crise de abastecimento, de acordo com o economista Roberto Brandão. Adriano Pires, por outro lado, avalia que, sem a redução esperada do consumo, há risco de que sejam necessários desligamentos temporários de energia em regiões já a partir de agosto.

Referências:

1. IBGE
2. Brasil de Fato
3. Aneel (Fontes 1, 2, 3 e 4)
4. G1 (Fontes 1 e 2)
5. Enel (Fontes 1, 2 e 3)
6. YouTube
7. UOL (Fontes 1 e 2)
8. Idec
9. Procel Info
10. Agência Brasil
11. BBC Brasil

Topo

Usamos cookies e tecnologias semelhantes de acordo com a nossa Política de Privacidade. Ao continuar navegando, você concordará com estas condições.