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É falso que Twitter Files provam que Moraes ameaçou advogado da empresa

Por Luiz Fernando Menezes e Amanda Ribeiro

11 de abril de 2024, 14h10

Não é verdade que o suposto compilado de comunicações internas do Twitter, conhecido como Twitter Files, mostra que o ministro Alexandre de Moraes, do STF, ameaçou o representante legal da empresa para obter informações privadas de usuários.

A alegação distorce o conteúdo de um suposto email interno em que o então advogado da plataforma, Rafael Batista, fazia referência a um pedido feito pelo Ministério Público de São Paulo em meio a uma investigação sobre crime organizado. Não há qualquer referência a Moraes.

Disseminada nas redes pelo jornalista e ativista conservador americano Michael Shellenberger, um dos responsáveis pelo Twitter Files, a alegação falsa acumula mais de 4 milhões de visualizações no X (ex-Twitter) nesta quinta-feira (11). Dois dias depois de postar a publicação enganosa, Shellenberger voltou atrás e disse não ter provas “de que Moraes tenha ameaçado processar criminalmente o advogado brasileiro do Twitter”. Na verdade, os conteúdos do Twitter Files não têm prova de autenticidade.

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Selo falso

'Alexandre de Moraes e outros funcionários do governo ameaçaram processar criminalmente o advogado do Twitter no Brasil se ele não entregasse informações privadas e pessoais, incluindo números de telefone das pessoas e suas mensagens diretas pessoais!' — Michael Shellenberger, em tuíte no dia 9.abr.2024.

A acusação mencionada nos posts desinformativos diz respeito a uma suposta troca de emails de ex-funcionários do Twitter feita em janeiro de 2021. Nela (veja abaixo), o advogado que representava a plataforma no Brasil naquele momento, Rafael Batista, afirma que foi alvo de investigação policial por ter se negado a entregar informações privadas de usuários da plataforma. Diferentemente do que afirma a publicação de Shellenberger, no entanto, isso nada tem a ver com o STF ou com o ministro Alexandre de Moraes.

Conforme o próprio email explica (veja abaixo), Batista afirma que recebeu pedidos do Ministério Público de São Paulo sobre a usuária “@pqcarolzinha_”, que, segundo o órgão, seria “supostamente associada ao crime organizado”. A plataforma negou o pedido por entender que só poderia entregar essas informações por meio de ordem judicial.

Suposta comunicação interna do Twitter em que o então advogado da empresa, Rafael Batista, afirma estar sendo investigado pela polícia por se recusar a entregar dados de uma usuária ao Ministério Público de São Paulo
Comunicado. Em suposta mensagem vazada, o advogado Rafael Batista alega estar sendo investigado por não entregar dados ao MPSP (Reprodução)

Na última terça-feira (9), a advogada e ex-secretária de Direitos Digitais do Ministério da Justiça Estela Aranha publicou informações sobre qual seria a investigação do MPSP citada no email: uma ação do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) para tentar prender um líder da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital).

O documento do MPSP diz que o promotor “requisitou ao denunciado, representante do setor jurídico da empresa ‘Twitter’, os dados completos da conta twitter.com/pqcarolzinha_” e atesta que o processo corria na 1ª Vara do TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) — que não tem qualquer relação com Moraes.

De acordo com o artigo 10 do Marco Civil da Internet, que aborda a proteção de registros e dados pessoais, autoridades podem requisitar das plataformas informações como “qualificação pessoal, filiação e endereço”. Ao se negar a fornecer os dados da usuária, a equipe jurídica do Twitter argumentou que a lei não inclui entre as informações passíveis de divulgação o endereço de email e o número de telefone, que teriam sido requisitados pelo Ministério Público.

Outro lado. Dois dias depois do tuíte de Aranha, Shellenberger disse que errou: “Não tenho provas de que Moraes tenha ameaçado processar criminalmente o advogado brasileiro do Twitter”. Outros coautores do Twitter Files também se pronunciaram sobre o assunto:

  • Eli Vieira disse que “é correto dizer que Moraes não estava ligado ao caso do Rafael Batista sendo alvo de investigação”, mas que o “descuido” de Shellenberger não invalida os documentos apresentados;
  • David Ágape também afirmou que “a publicação do Twitter Files Brasil está correta, mas o comentário do Mike tem uma imprecisão”.
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QUANDO MORAES É CITADO

O nome de Alexandre de Moraes aparece em quatro diferentes momentos no Twitter Files. Em três das referências, no entanto, há inconsistências:

  1. Os autores afirmam que “a corte eleitoral do Brasil (TSE), que de Moraes controla, determinou que o Twitter revelasse a identidade de usuários”. Como suposta prova, apresentam um email em que Batista diz que o TSE teria obrigado a plataforma “a rastrear e desmascarar usuários que usaram hashtags específicas”. A mensagem, no entanto, foi enviada em 25 de outubro de 2021. Nessa época, quem era presidente do tribunal era o ministro Luís Roberto Barroso. Moraes era apenas um dos sete ministros da Corte;
  2. Em outro momento, é dito que o representante legal do Twitter na América Latina teria se encontrado com Moraes. Na mensagem apresentada como prova, no entanto, não há qualquer referência ao nome do ministro. O email cita apenas o termo “juiz”;
  3. Depois, as mensagens do Twitter Files dizem que “no dia 30 de março de 2022, um dia depois de Moraes tomar posse como presidente do TSE”, o tribunal teria estipulado uma multa diária de R$ 50 mil caso a plataforma não entregasse dados sobre as hashtags “#VotoImpressoNAO” e “VotoDemocraticoAuditavel”. Moraes, no entanto, assumiu a presidência do TSE em agosto de 2022;

Suposta mensagem interna do Twitter em que funcionário da plataforma relata que o ministro Alexandre de Moraes teria solicitado a exclusão da conta do pastor André Valadão sem informar o motivo exato
Suspensão. Em suposto comunicado interno, funcionário do Twitter relata que Moraes solicitou remoção da conta de André Valadão, que havia publicado desinformação (Reprodução)

Também há uma citação ao ministro em comunicação enviada em novembro de 2022. Nela (veja acima), um advogado do Twitter diz que Moraes pediu que a rede derrubasse o perfil do pastor André Valadão sem explicar o motivo exato da decisão. O próprio email, no entanto, já afirma que “André Valadão estava publicando desinformação, inclusive uma declaração de que o TSE teria ordenado que ele publicasse uma mensagem de retratação, o que é falso”.

Referências:

1. X (@estela_aranha)
2. Planalto
3. X (@Shellenberger)
4. X (@EliVieiraJr)
5. X (@david_agape)
6. TSE (1 e 2)
7. Aos Fatos

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