Denúncias de imagens de abuso infantil batem recorde impulsionadas por IA e falhas das redes

Por Gisele Lobato

6 de fevereiro de 2024, 10h44

As denúncias de imagens de abusos contra crianças e adolescentes compartilhadas na internet aumentaram 77% em 2023 e atingiram o maior patamar desde que há registro, segundo dados divulgados nesta terça (6) pela ONG Safernet. No ano passado, foram reportados 71.867 casos, recorde da série histórica iniciada em 2006.

Na avaliação do diretor-presidente da Safernet, Thiago Tavares, a explosão nas denúncias pode ser atribuída a três fatores principais:

  • O surgimento de ferramentas de IA (inteligência artificial) generativa que criam deep nudes;
  • A proliferação de adolescentes criando e vendendo packs com suas próprias imagens em cenas de nudez e sexo;
  • Cortes nas equipes de segurança e moderação de conteúdo nas plataformas digitais.

Divulgado por ocasião do Dia da Internet Segura, celebrado nesta quarta (7), o balanço da Safernet se refere a links únicos reportados à Central Nacional de Denúncias de Crimes Cibernéticos e exclui conteúdos repetidos. Os casos são repassados ao MPF (Ministério Público Federal), autoridade responsável pela análise e investigação.

A cobertura recente do Aos Fatos corrobora a conclusão do relatório. Em dezembro, reportagem revelou que falhas de moderação no Telegram facilitam o uso de IA para criar pornografia falsa, muitas vezes a partir de imagens de crianças e adolescentes reais. Outra reportagem publicada neste mês mostrou que meninas sofrem assédio e chantagem durante transmissões ao vivo no Kwai, cujas regras em tese proíbem menores de idade de fazerem lives.

O recorde anterior de denúncias de abusos e exploração sexual infantil pela internet havia sido registrado pela Safernet em 2008, com 56.115 casos.

  • Naquele ano, o Google — dono do extinto Orkut, plataforma popular no Brasil à época — assinou acordo com o MPF e passou a entregar informações dos criminosos às autoridades;
  • A quantidade de denúncias caía desde então, mas voltou a subir a partir da pandemia, quando o isolamento fez crescer a quantidade de aparelhos conectados e o tempo gasto na internet;
  • Além do aumento nos casos de imagens de abuso sexual de crianças, a Safernet também registrou recorde no total de casos de violações dos direitos humanos pela internet em 2023, com 101.313 denúncias — alta de 48,7% na comparação com 2022.

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CRIMES DE ÓDIO

Além dos conteúdos criminosos envolvendo crianças e adolescentes, as denúncias de xenofobia e intolerância religiosa pela internet também tiveram aumentos expressivos no ano passado, segundo o balanço da Safernet.

  • Os casos de xenofobia mais que triplicaram na comparação com 2022, passando de 4.030 para 14.196 registros;
  • Já de intolerância religiosa na rede, o aumento foi de cerca de 30% (de 764 para 993).

“O crescimento de denúncias desses dois crimes este ano está atrelado ao conflito no Oriente Médio”, analisa Tavares.

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Na contramão, denúncias de racismo, misoginia e ataques a membros da comunidade LGBTQIA+ caíram entre 2022 e 2023. A Safernet considera que esse recuo já era esperado, porque os números desses crimes costumam ser maiores em anos eleitorais, como foi em 2022.

  • As denúncias envolvendo racismo nas redes diminuíram 20,36%, para 2.233 no ano passado;
  • No caso da LGBTfobia, a queda foi de 60,57%, para 1.501 casos;
  • Já os registros de violência ou discriminação contra mulheres caíram para menos da metade, totalizando 3.706 denúncias em 2023, contra 8.734 no ano anterior.

Quem se deparar com pornografia infantil na internet pode reportar à Safernet e à Polícia Federal (denuncia.ddh@dpf.gov.br). Casos de abuso e exploração sexual de crianças — inclusive fora da internet — também podem ser denunciados, de forma anônima, pelo Disque 100.

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Referências:
1. Safernet
2. Aos Fatos (1 e 2)

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