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🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Julho de 2021. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

Vídeos em defesa do 'tratamento precoce' alcançam 5,3 milhões de visualizações no TikTok

Por Cecília do Lago, Débora Ely e João Barbosa

12 de julho de 2021, 17h48

Rede social popular entre adolescentes e conhecida pelas coreografias de músicas com batidas marcadas, o TikTok se tornou também reduto de desinformação médica durante a pandemia de Covid-19. Segundo levantamento do Radar Aos Fatos, 281 vídeos em português que defendem o uso de substâncias comprovadamente ineficazes contra a doença acumularam, entre julho de 2020 e o mesmo mês de 2021, mais de 5,3 milhões de visualizações e 331,4 mil interações (soma de curtidas e compartilhamentos).

Depois de ser informado pela reportagem na última quinta-feira (8) sobre o conteúdo enganoso, o TikTok afirmou que “os vídeos estão sendo analisados pelo time interno e que serão removidos se violarem as políticas da plataforma”. No início da tarde desta segunda-feira (12), 240 das peças analisadas apareciam como indisponíveis no aplicativo. Outras 41 seguiam no ar.

Além de referências genéricas a “tratamento precoce”, 41% das publicações analisadas mencionam remédios como azitromicina, cloroquina, hidroxicloroquina, ivermectina, vitamina D e zinco — não há evidências científicas de que essas drogas tenham qualquer efeito sobre a doença. Foram localizados, ainda, conteúdos que promovem procedimentos perigosos à saúde, como a nebulização de hidroxicloroquina e a inalação de água oxigenada e bicarbonato de sódio.

Nenhum dos vídeos analisados pelo Radar continha alertas de desinformação — há cinco meses, o TikTok anunciou que removeria desinformação à medida que a identificasse e que colocaria rótulos em “checagens de fatos inconclusivas ou conteúdos que não podem ser confirmados”. Em 56 publicações, contudo, a plataforma incluiu avisos informativos sobre o coronavírus. Um deles (“Aprenda mais sobre as vacinas contra Covid-19”) direciona o usuário a uma seção de perguntas e respostas sobre os imunizantes; o outro (“Saiba os fatos sobre a Covid-19”) leva à página de Diretrizes da Comunidade da rede.

Em suas normas, o TikTok diz que proíbe conteúdos falsos ou enganosos sobre Covid-19 e vacinas. Também afirma que “adota uma abordagem proativa e holística para combater informações enganosas”. Não há, em sua política, nenhuma menção a tratamentos ineficazes para a Covid-19 — veja aqui como denunciar publicações enganosas nas redes sociais, incluindo no TikTok.

De acordo com o mais recente Relatório de Transparência da empresa, divulgado em fevereiro deste ano, 51.505 vídeos foram removidos por compartilharem desinformação sobre a Covid-19 (87% foram deletados menos de 24 horas após terem sido postados). No Brasil, o TikTok tem parceria com o Estadão Verifica e a Sci-Verify para checar informações publicadas no aplicativo.

Líderes de audiência

O vídeo mais assistido entre os 281 analisados (1,2 milhão de visualizações e 26,1 mil interações) trazia uma imagem do ator Felipe Titto seguida da legenda: “Ator da Globo contraria emissora e revela que fez tratamento precoce”. Titto contraiu Covid-19 em novembro do ano passado e viralizou nas redes sociais com um vídeo afirmando ter dormido “quase morto” e acordado “sem sintomas” após tomar “cloroquina, azitromicina e ivermectina”.

O segundo vídeo mais popular (610,5 mil visualizações e 51,4 mil interações) reproduzia trecho de uma entrevista da cantora Baby do Brasil ao programa Amaury Jr., da RedeTV!, acompanhada da mensagem “tratamento precoce salva vidas, sim! Bolsonaro tem razão”. Na ocasião, a artista contou que toma ivermectina a cada 20 dias, que dá o medicamento para “todo mundo” e que já “comprou mais de R$ 600” da substância.

Por fim, a terceira publicação com maior audiência trazia um pronunciamento do deputado estadual em Alagoas Cabo Bebeto (PTC). Na peça, que teve 426 mil visualizações e 37,5 mil interações, ele minimiza a responsabilidade do presidente Jair Bolsonaro pela crise sanitária, mas sem mencionar qualquer medicamento. O vídeo, contudo, continha a mensagem: “Tudo culpa do presidente, só porque anunciou a medicação que salvou a vida dele” —Bolsonaro afirma que se curou da Covid-19 devido ao uso da hidroxicloroquina.

Novos atores

As peças desinformativas analisadas foram publicadas por 158 usuários no TikTok. Nenhuma das contas mais populares havia aparecido antes em reportagens do Radar Aos Fatos sobre desinformação nas demais redes sociais a respeito da pandemia de Covid-19.

Os 10 maiores perfis que compartilharam desinformação sobre medicamentos contra ao coronavírus têm entre 257,5 mil e 25,8 mil seguidores. Entre eles, oito se apresentam como apoiadores de Bolsonaro em suas páginas, seja no texto de sua biografia como no teor de seus vídeos.

Os dois mais populares (@2022bolsonaro e @umbolsonarista), por exemplo, são perfis apócrifos de apoio ao presidente. Esses usuários compartilharam, somados, quatro peças sobre drogas ineficazes e acumularam mais de 330 mil visualizações com elas.

Outro lado

O Radar Aos Fatos entrou em contato com todos os usuários que aparecem neste texto — à exceção dos responsáveis pelos perfis @natelimalinda e @2022bolsonaro, que restringem o recebimento de mensagens na plataforma; e @criscastillo36 e @claricepinheiro74, que aparecem com as contas desativadas. Das pessoas localizadas, nenhuma respondeu ao pedido de posicionamento até o momento.

Já o TikTok informou que “segue orientações de especialistas da área de saúde, como a Organização Mundial da Saúde, para combater desinformação sobre Covid-19” e que “além de remover informações enganosas, também oferece à comunidade acesso a informações confiáveis sobre o tema dentro do aplicativo”.

Também disse que, no caso de vídeos sobre tratamentos para a Covid-19, “tem direcionado os usuários para os sites das instituições parceiras que trazem essas informações”. Afirmou, ainda, que “tem trabalhado nas campanhas #InfoCovid e #CadaUmdeNós com todas as instituições parceiras para produzir conteúdo com informações confiáveis”, realizando lives com especialistas para tirar dúvidas sobre “o atual momento da pandemia, desde cuidados, prevenção, tratamento, vacinação, até outros aspectos sobre o assunto”.

Metodologia

A reportagem coletou, por meio do aplicativo TikTok-Scraper (disponível aqui), uma amostra de vídeos na plataforma que continham cinco hashtags relacionadas ao “tratamento precoce” (#tratamentoprecoce, #tratamentoprecocesalvavidas, #tratamentoprecocecovid19, #tratamentoprecocesempre e #tratamentoprecocesalva).

Depois, analisou individualmente os conteúdos, classificando como enganosos aqueles que defendiam o uso de drogas que a ciência já comprovou serem ineficazes para a prevenção ou o tratamento da Covid-19.

Referências:
1. Aos Fatos (1, 2, 3 e 4)
2. Agência Brasil
3. TikTok (1, 2, 3 e 4)
4. TikTok-Scraper

sobre o

Radar Aos Fatos faz o monitoramento do ecossistema de desinformação brasileiro e, aliado à ciência de dados e à metodologia de checagem do Aos Fatos, traz diagnósticos precisos sobre campanhas coordenadas e conteúdos enganosos nas redes.

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