🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Março de 2023. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

Vídeo tira de contexto trechos de telejornais para mentir que imprensa recomendou cloroquina

Por Luiz Fernando Menezes

9 de março de 2023, 17h30

Não é verdade que diversos veículos da imprensa brasileira tenham noticiado que a cloroquina seria eficaz contra a Covid-19, como sugere um vídeo que circula nas redes. A publicação usa oito trechos de reportagens que foram veiculadas em telejornais entre 2020 e 2022 e que não atestavam os benefícios do medicamento no tratamento da infecção. Dois vídeos, inclusive, afirmavam o contrário: que a cloroquina e a hidroxicloroquina não são eficazes contra a Covid-19.

Publicações com o conteúdo enganoso acumulam mais de 82 mil compartilhamentos no Facebook, centenas de milhares de visualizações no TikTok e 1.500 curtidas no Instagram até a tarde desta quinta-feira (9). O conteúdo desinformativo também circula no Telegram.


Selo falso

Bolsonaro tinha razão. Imprensa brasileira fala a verdade sobre a cloroquina.

Vídeo usa reportagens antigas para sugerir eficácia da cloroquina contra a Covid-19

Um compilado de reportagens antigas sobre o uso da cloroquina no combate à Covid-19 tem circulado nas redes para alegar que veículos de imprensa teriam atestado a eficácia do medicamento, o que é mentira.

A publicação viral reúne oito vídeos veiculados entre 2020 e 2022 em diversos telejornais; alguns deles, inclusive, desmentem que o remédio seria eficaz no tratamento da Covid-19. Leia abaixo sobre a origem e o contexto original de cada um dos trechos, na ordem em que foram editados para desinformar.

  1. O primeiro vídeo que aparece na publicação foi veiculado em janeiro de 2022 pelo Jornal da Band e fala sobre a publicação de uma nota técnica do Ministério da Saúde que defendia a efetividade da cloroquina. Assinada pelo então secretário de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde, Helio Angotti Neto, a nota dizia, em resumo, que a hidroxicloroquina seria eficaz contra a Covid-19 e as vacinas, não.

    A publicação omite que a nota de Angotti Neto foi rechaçada por autoridades e, mais tarde, modificada. A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), por exemplo, afirmou que a publicação era “errada” e que estudos comprovaram a segurança e a eficácia dos imunizantes usados no Brasil. Após as críticas, o Ministério da Saúde alterou a publicação, retirando as afirmações enganosas.
  1. O segundo vídeo usa um trecho de uma reportagem que diz o contrário do que defende a peça desinformativa. A notícia do Jornal da Record, veiculada em maio de 2020, informa que um estudo da revista Lancet teria revelado que a cloroquina e a hidroxicloroquina aumentariam o risco de morte dos pacientes com Covid-19.

    No vídeo original, a âncora Janine Borba diz que “um novo estudo publicado pela revista científica The Lancet revela que o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina no combate ao coronavírus aumenta o risco de morte”. A publicação desinformativa, no entanto, suprime o trecho em que a jornalista fala sobre o risco de morte.
  1. Também é antigo o terceiro vídeo que compõe a peça de desinformação. A reportagem original, que foi ao ar na edição do Jornal da Cultura do dia 17 de julho de 2020, noticiava que o Ministério da Saúde teria orientado a Fiocruz a recomendar o uso da cloroquina no tratamento da Covid-19.

    A peça desinformativa omite, no entanto, que a pasta não apresentou nenhuma evidência para basear a recomendação e que a Fiocruz não acatou o ofício do Ministério da Saúde. Em nota divulgada na época, a instituição disse que as orientações favoreciam o uso “off label” dos medicamentos. O CNS (Conselho Nacional de Saúde) também rebateu a nota da pasta com uma recomendação pela suspensão do uso de cloroquina em casos leves da Covid-19.
  1. O quarto vídeo que aparece na publicação viral e enganosa, por sua vez, noticiava que remédios à base de hidroxicloroquina estariam em falta nas farmácias brasileiras após o ex-presidente americano Donald Trump defender que o medicamento seria um tratamento para a Covid-19.

    A reportagem, que foi ao ar em março de 2020 no SBT News, no entanto, em nenhum momento afirma que os medicamentos indicados por Trump são eficazes. Na verdade, logo após a fala do âncora Carlos Nascimento usada pela peça de desinformação, há uma entrevista com o infectologista Marcos Boulos, que afirma que a cloroquina não tem efeito antiviral e que ainda eram necessários estudos clínicos cuidadosos com o medicamento antes de considerá-lo eficaz.

  1. O quinto vídeo que consta na publicação enganosa também foi editado para distorcer o real sentido de uma reportagem do Jornal da Record de julho de 2020. No recorte usado pela peça de desinformação, a âncora Christina Lemos noticia a divulgação do resultado de um estudo sobre a hidroxicloroquina conduzido pelo consórcio Coalizão Covid-19, formado por 55 hospitais do país. O vídeo, no entanto, é cortado antes de a jornalista completar a frase e dizer que “para o consórcio, o remédio não é eficaz”.

    O artigo citado, que foi publicado no New England Journal of Medicine, concluiu que a hidroxicloroquina não apresentou resultados na evolução clínica dos pacientes.
  1. O sexto vídeo, veiculado em janeiro de 2022 pelo CNN Domingo, faz referência à mesma nota técnica do Ministério da Saúde que defendia a efetividade da cloroquina sem apresentar provas, que é mencionada no primeiro vídeo.
  2. E o sétimo trecho veiculado na peça de desinformação é de uma reportagem de junho de 2020 do Jornal da Record que faz referência ao mesmo artigo científico da Lancet citado no segundo trecho da peça desinformativa. A reportagem completa diz que a revista publicou uma retratação após verificar uma inconsistência na base de dados usada no estudo sobre a cloroquina e a hidroxicloroquina. A correção, no entanto, não atesta a eficácia dos medicamentos, que, mais tarde, foram descartados por diversos estudos científicos.
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  1. Por fim, a peça de desinformação traz um trecho da edição do dia 24 de agosto de 2020 do SBT News em que a âncora Rachel Sheherazade afirma que o então presidente Jair Bolsonaro (PL) teria defendido o uso da cloroquina contra a Covid-19. O compilado deixa de fora, no entanto, um complemento feito pelo âncora Marcelo Torres de que não havia comprovação científica de que os remédios seriam benéficos em qualquer momento da infecção.

    Ao longo de seu governo, Bolsonaro defendeu em diversas ocasiões o uso de medicamentos que não tinham eficácia comprovada contra a Covid-19. Em 95 momentos, por exemplo, o ex-presidente afirmou ter sido salvo da doença pela cloroquina, apesar de nunca ter mostrado uma prescrição que provasse que de fato se tratou com o medicamento.

Eficácia. A cloroquina e a hidroxicloroquina são comprovadamente ineficazes contra a Covid-19, como já foi mostrado por diversos estudos duplo-cego randomizados, o padrão-ouro da pesquisa científica.

O CEBM (Centro de Medicina Baseada em Evidências da Universidade de Oxford), que reúne consensos científicos sobre tratamentos da infecção causada pelo Sars-CoV-2, inclusive aponta que os medicamentos podem aumentar a mortalidade em casos graves, e por isso devem ser evitados.

Referências:

1. Aos Fatos (1 e 2)
2. Band
3. CNN Brasil (1, 2, 3 e 4)
4. G1
5. R7
6. The Lancet
7. TV Cultura
8. CNS (1 e 2)
9. SBT News (1 e 2)
10. Record
11. Nejm
12. Cochrane
13. CEBM

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