De Temer a Lula, pauta ambiental marca discursos presidenciais na Assembleia Geral da ONU

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O meio ambiente é o tema que mais atravessou os discursos de presidentes brasileiros na abertura da Assembleia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas) na última década, seja Michel Temer (MDB), Jair Bolsonaro (PL) ou Lula (PT).

Levantamento das checagens publicadas pelo Aos Fatos nos últimos dez anos aponta que, a despeito de seus diferentes posicionamentos, os três mandatários subiram a tribuna das Nações Unidas com o intuito de cacifar as ações ambientais de seus governos perante a comunidade internacional — por vezes, com o uso de desinformação.

Nesse período, foram verificadas 55 declarações nos discursos presidenciais na ONU sobre o meio ambiente, o que corresponde a 36% de tudo que foi checado. Dessas falas, 83% são falsas ou imprecisas.

Quem mais desinformou foi Jair Bolsonaro. Em discursos proferidos entre 2019 e 2022, o ex-presidente distorceu dados e informações para negar a alta nos números do desmatamento e das queimadas na Amazônia e alegar que dois terços do bioma permaneciam intocados.

A tônica foi similar à adotada por Michel Temer em 2017. O então presidente citou números imprecisos para propagandear uma suposta queda no nível de devastação da floresta e falseou informações para sustentar que sua gestão vinha investindo para manter a mata de pé.

Apesar de também ter mencionado a redução do desmatamento em seus discursos na assembleia, Lula, até agora, deu mais dados verdadeiros. O petista, no entanto, subestimou a longevidade da crise climática , dizendo que, quando assumiu seu primeiro mandato, em 2003, ainda não se tinha dimensão dos impactos do aquecimento global.

As políticas públicas para preservação de biomas brasileiros são um tema recorrentemente abordado pelos chefes de Estado em eventos internacionais, como a Assembleia Geral da ONU, devido à importância da Floresta Amazônica na biodiversidade e na regulação das mudanças climáticas mundiais. Durante o governo Bolsonaro, o aumento nos índices de destruição do bioma foi, inclusive, motivo de ameaças de sanções contra o país.

A expectativa é que o presidente Lula também faça menção a temas ambientais em seu discurso na próxima terça (23). Além da importância histórica do tema, o Brasil recebe em novembro a COP 30 (Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025).

Dados gerais

Na última década, Aos Fatos checou sete discursos presidenciais na Assembleia Geral da ONU: um de Temer, quatro de Bolsonaro (veja aqui, aqui, aqui e aqui) e dois de Lula (veja aqui e aqui).

  • No total, foram produzidas 152 checagens — 140 delas em formato de tempo real, modelo em que a verificação é conduzida ao vivo e as checagens são incorporadas à transcrição do discurso;
  • Desse total, 58% continham desinformação;
  • Além do meio ambiente, os principais temas abordados foram economia (29 checagens, ou 19% do total) e direitos humanos (19 ou 12,5% do total).

Lula

De terno azul e gravata colorida, presidente Lula fala em púlpito com o emblema da ONU. Ao fundo, parede verde de mármore. Há dois suportes com teleprompter de vidro ao lado do orador.
Presidente Lula durante participação na Assembleia Geral da ONU em 2023 (Ricardo Stuckert/PR)

O atual presidente tem usado a tribuna da Assembleia Geral para pedir o fortalecimento da ONU e o multilateralismo. As bandeiras mais citadas têm sido o combate à desigualdade social, à fome e à emergência climática. Em meio a esse discurso, no entanto, o petista tem repetido desinformações já sinalizadas pelo Aos Fatos.

Em linha com sua bandeira de combate à desigualdade, Lula afirmou no ano passado, por exemplo, que as gestões petistas teriam acabado com a fome no Brasil em 2014, o que não é verdade. Essa declaração tem sido repetida desde a campanha.

Apesar de ter deixado o Mapa da Fome — levantamento da ONU baseado em indicadores de insegurança alimentar — o país nunca deixou de registrar milhões de casos de pessoas sem acesso a alimentos.

Em uma tentativa de se posicionar sobre episódios da política externa, o presidente também enganou ao afirmar que sempre teria condenado a invasão do território ucraniano pela Rússia. Em 2022, Lula relativizou o caso ao afirmar que a Ucrânia também era culpada pela guerra.

Bolsonaro

De terno preto e gravata azul, Jair Bolsonaro fala em púlpito com o emblema da ONU. Ao fundo, parede verde de mármore. Sobre o púlpito há microfones e papéis, e ao lado do orador há um teleprompter de vidro.
Jair Bolsonaro durante discurso na Assembleia Geral da ONU em 2019 (Alan Santos/PR)

Bolsonaro costumava usar o evento para falar quase exclusivamente de seu governo. A tônica principal de seu discurso era a de contrastar os feitos de sua gestão com os de presidentes anteriores, alegando, por exemplo, que não haveria mais corrupção no Brasil — o que uma série de fatos comprovaram ser mentira.

Com exceção do meio ambiente, o tema mais citado pelo ex-presidente foi a economia (20,7% das 130 declarações checadas). Ditas principalmente durante a pandemia de Covid-19, as alegações serviam para construir uma imagem do Brasil como país que, a despeito da crise, exibia números positivos de crescimento e geração de empregos. Pouco mais da metade das alegações (51,8%) eram falsas ou enganosas.

O ex-presidente também abordou com maior frequência temas ligados aos direitos humanos. Bolsonaro mentiu ao tecer críticas ao programa Mais Médicos, ao abordar programas de auxílio aos povos indígenas durante a pandemia e ao afirmar que teria aprovado mais de 70 normas legais para garantir proteção às mulheres.

Temer

De terno escuro e gravata azul, Michel Temer fala em púlpito com o emblema da ONU. Ao fundo, parede verde de mármore. Dois microfones estão posicionados à sua frente e há um teleprompter de vidro ao lado.
Michel Temer em discurso na ONU em 2016 (Beto Barata/PR)

No único discurso checado pelo Aos Fatos, o emedebista apresentou sua gestão como a responsável por recuperar a economia e a estabilidade brasileiras, ainda no contexto pós-impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT). Na ocasião, Temer desinformou ao afirmar que o Brasil teria voltado a gerar empregos naquela época, setembro de 2017.

Aos Fatos não checou o discurso de Temer em 2018 em razão da agenda política da época: sua fala ocorreu em 25 de setembro daquele ano, no meio da campanha eleitoral presidencial e na véspera do debate promovido por UOL, Folha de S.Paulo e SBT. Naquela época, Bolsonaro também já havia sofrido o atentado a faca em Juiz de Fora (MG).

O caminho da apuração

Aos Fatos separou todas as declarações checadas em discursos presidenciais na Assembleia Geral da ONU e os separou por selos, ano, presidente e tema.

Vale ressaltar que, nos anos iniciais, ainda havia os selos Impreciso, Exagerado, Insustentável e Contraditório. Todos esses foram contabilizados como Não é Bem Assim.

Referências

  1. Aos Fatos (1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10 e 11)
  2. MPF
  3. EBC

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