Quem assistiu via YouTube ao debate da Band de pré-candidatos à Prefeitura de São Paulo, na quinta-feira (8), deve ter reparado na quantidade de comentários de eleitores engajados. Parecia uma batalha de torcidas organizadas.
Entre esses berros escritos, alguns se destacavam e ficavam fixados no topo da página por um período. A posição privilegiada era alcançada não pela popularidade ou relevância do comentário, mas através de um pagamento. São os chamados Super Chats — uma das ferramentas do YouTube para monetização de transmissões ao vivo.
De acordo com levantamento do Radar Aos Fatos, foram mais de 385 comentários pagos durante o debate, que custaram juntos R$ 3.882,28 reais, média de R$ 10 por comentário pago.
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A maior parte (70%) dos valores enviados por meio da ferramenta é destinada ao canal responsável, nesse caso, a Band. O restante (30%) vai para o Google.
Porém, mais do que ferramenta de monetização para os canais, o Super Chat serve como plataforma de promoção de usuários na rede, uma vez que os comentários serão vistos pelos telespectadores da transmissão, que atingiu mais de 1,5 milhão de visualizações.
- Entre os comentários promovidos, boa parte (168) divulga páginas de redes sociais, produtos e serviços sem relação com o debate político.
- A maioria (219), no entanto, foi destinada a comentários de promoção política dos cinco pré-candidatos presentes ao debate;
- O comentário mais caro, que custou R$ 400, era de apoio à candidata Tabata Amaral (PSB), e divulgava seu número de urna – prática proibida em anúncios políticos antes do início da campanha eleitoral, que começa na próxima semana;
- Mas o candidato que mais recebeu Super Chats em seu favor foi Pablo Marçal (PRTB) — 128 comentários pagos, que custaram R$ 1.412,90;
- Outros 73 comentários pagos, que custaram R$ 580,90, não defendiam um político específico, mas faziam ataques a outros candidatos;
- Entre os principais alvos estavam Guilherme Boulos (PSOL) e Marçal;
Alvo de cinco Super Chats ofensivos, Tábata Amaral também foi vítima de comentários pagos de teor sexista.
Não é novidade que os Super Chats sejam usados como forma de promoção política e até de disseminação de desinformação, apesar de o YouTube afirmar que os comentários pagos também estão sujeitos a moderação e ao cumprimento das regras da plataforma, que proíbem conteúdos falsos e discurso de ódio.
Em 2022, Aos Fatos revelou que a Jovem Pan recebeu mais de R$ 24 mil em Super Chats enviados durante as lives do ex-presidente Jair Bolsonaro transmitidas por seu canal no YouTube. Entre os usuários que mais enviaram comentários pagos à emissora estava um médico desinformador que usava o espaço para promover seu próprio canal no YouTube, no qual publicava vídeos defendendo medicamentos sem eficácia comprovada contra a Covid-19.
O diferencial deste ano é que o Google proibiu a veiculação de anúncios político-eleitorais no Brasil, justamente para evitar problemas com a Justiça Eleitoral, que enrijeceu as normas para veiculação de conteúdos pagos em redes sociais e uso de inteligência artificial.
Questionado, o YouTube afirmou que não considera o Super Chat uma ferramenta de publicidade, mas de financiamento para o criador de conteúdo. Por isso, as regras de anúncios eleitorais da plataforma não se aplicam aos comentários pagos.
Assim, a empresa desconsidera que os Super Chats também podem ser usados para promoção política de candidatos durante transmissões ao vivo. A poucos dias do início da campanha eleitoral, esse é mais um exemplo de como qualquer espaço sem moderação ou fiscalização será explorado politicamente.
Como baixar comentários no YouTube
Para ficar de olho em Super Chats utilizamos a ferramenta chat-downloader, uma biblioteca escrita em Python que pode ser utilizada através da linha de comando, também sem precisar de grandes conhecimentos de programação.
Além de chats de lives do YouTube, a ferramenta promete também exportar bate-papos de lives da Twitch, Zoom e Facebook (esta última funcionalidade ainda em desenvolvimento, segundo os mantenedores do projeto) em planilhas.