Não é verdade que a Receita Federal permitiu que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ficasse com as joias recebidas em viagem oficial feita à Arábia Saudita em 2021. As peças de desinformação distorcem um documento oficial apresentado em reportagem do jornal O Globo que prova apenas que presentes dados a chefes de Estado são isentos de impostos. Os posts também omitem que a equipe de Bolsonaro tentou ocultar os itens, o que é ilegal.
Publicações com o conteúdo enganoso acumulavam centenas de compartilhamentos no Facebook e centenas de curtidas no Instagram até a tarde desta sexta-feira (5).
Documento prova que Bolsonaro e Esposa tem aprovação da Receita Federal para ficarem com as joias presenteadas pelo governo da Arábia Saudita durante o mandato do ex-presidente. Os presentes foram doados em caráter personalíssimo, o Bolsonaro os incorporaria ao acervo da presidência se quisesse. A Receita Federal informou também que não se cobra impostos de presenes recebidos pelo presidente em visitas oficiais a outros países.
Uma reportagem do jornal O Globo de maio de 2023 tem sido distorcida por peças de desinformação para sugerir que a Receita Federal afirmou à PF (Polícia Federal) que não havia irregularidades na conduta do ex-presidente no caso das joias sauditas apreendidas no aeroporto de Guarulhos em outubro de 2021.
O documento apresentado pela reportagem é uma resposta da Receita à PF, que solicitou informações durante as investigações sobre o tratamento aduaneiro das joias, “especialmente para fins de tributação”. No ofício, o Fisco diz que presentes destinados à Presidência, ainda que trazidos por um viajante diferente do chefe de Estado, são isentos da cobrança de impostos e só precisam ser apresentados à autoridade aduaneira ao chegar no Brasil.
O que levantou suspeitas sobre o caso das joias é justamente o fato de a equipe de Bolsonaro não ter seguido o protocolo informado pela Receita. O militar Marcos André dos Santos Soeiro, assessor do então ministro de Minas e Energia Bento Albuquerque, desembarcou no Brasil e passou pela alfândega com as joias escondidas na mochila, sem comunicar a existência dos itens às autoridades competentes.
Avaliado em R$ 5,1 milhões, o conjunto de joias foi apreendido porque a equipe do ex-presidente não as declarou como presente de Estado, procedimento necessário para que sejam incorporadas ao patrimônio público da Presidência. Apesar de terem sido entregues a Bolsonaro, os itens não podem ser considerados bens pessoais.
No acórdão 2.255/2016, o TCU (Tribunal de Contas da União) determina que somente itens de natureza personalíssima, como medalhas, ou produtos de consumo direto, como alimentos e perfumes, podem ser classificados como bens privados de presidentes. Esse não é o caso das joias.
Esta peça de desinformação circulou inicialmente em maio do ano passado, dias depois da publicação da reportagem pelo Globo. Na época, Aos Fatos verificou que o conteúdo enganoso foi replicado até mesmo pelo ex-presidente.
Indiciado. As peças desinformativas voltaram a circular após a PF indiciar Jair Bolsonaro e outras 11 pessoas por peculato — quando um funcionário público se apropria ou desvia dinheiro ou bens a que tem acesso em razão do cargo —, lavagem de dinheiro e associação criminosa na última quinta-feira (4).
Na prática, isso significa que a instituição concluiu que há elementos suficientes para afirmar que os investigados cometeram um crime ao desviarem os presentes de alto valor. A PF afirmou ainda que o montante recebido com a venda das joias foi convertido em dinheiro vivo e repassado ao ex-presidente. Bolsonaro não se pronunciou sobre o caso e sua defesa alegou não ter acesso ao relatório.