O custo de um aluno brasileiro pode ser determinado pela quantia que o país investe em políticas educacionais. No entanto, o cálculo para determinar esse número não é simples: é preciso levar em conta os diversos níveis de educação e os valores nos núcleos urbanos e rurais, que podem ser diferentes. Alguns órgãos e instituições fazem uma estimativa geral; outros calculam qual seria o mínimo valor necessário para garantir educação de qualidade ou a equiparação da educação brasileira à dos países com os melhores índices educacionais, como a Suíça e a Noruega.
O Ministério da Educação (MEC) define que o valor anual mínimo nacional por aluno é de R$ 2.091,37 para 2018. Mas isso significa que esse é o custo de um aluno do Ensino Fundamental? E no Ensino Médio? E se é o valor mínimo, qual seria então o valor ideal? Para responder a essas perguntas, Aos Fatos, em parceria com a Nova Escola foi atrás de levantamentos atuais sobre o assunto.
Interpretando os números. Em levantamento feito pelo Porvir e pelo Iede, que considera gastos dos países com Educação em relação ao PIB nacional, o Brasil aparece razoavelmente bem no quadro sul-americano. Com 5,95% do PIB investido em Educação em 2014, o país só perde para a Bolívia, que dedica 7,29%. A Argentina aparece logo depois com 5,36%, seguida do Equador com 5,26%. Mas esse investimento parece não se transferir para o êxito educacional de cada aluno brasileiro se comparado a outros estudantes latinos.
Quando se olha para os dados como percentual da população com 25 anos ou mais que chegou ao Ensino Médio e a taxa bruta de matrícula no Ensino Superior, o Chile é o destaque na América do Sul. Números do Relatório de Desenvolvimento Humano de 2016 da Pnud, com dados até 2015, apontam que o Chile aparece na primeira posição com 76,5% dos estudantes chegando ao Médio. A Venezuela aparece em segundo, com 68,9%, Argentina com 62,4% e o Peru, 61,5%. No Brasil, 57,5% da população com 25 anos ou mais chegou ao Ensino Médio. Vale lembrar que aqui a média de anos de estudo é de 7,8 anos para essas pessoas.
“Na série histórica os indicadores educacionais estão melhorando, só que em ritmo abaixo do que determina o Plano Nacional de Educação”, explica José Marcelino Pinto, professor da Universidade de São Paulo e membro da Campanha Nacional pelo Direito à Educação. Para ele, isso ocorre porque ainda estamos longe das metas e em um cenário econômico desfavorável. “Foi feito um longo estudo sobre o tema e hoje está na lei que 7% do PIB deve ser destinado à educação em 2019 e 10% em 2024, para compensar os anos de sub-investimento, mas o PIB está caindo nos últimos anos”, pontua.
Os valores investidos por aluno mostram ainda a necessidade de maiores gastos e de se pensar as diversidades locais e de nível de ensino. O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) apresenta uma estimativa anual de valor aluno/ano do ensino público por Estado desde 2006. Segundo essa base de dados, por exemplo, no nível do Ensino Fundamental verifica-se que há maiores investimentos nas séries finais: enquanto a média é de R$ 3.725,44 anuais no ensino urbano e R$ 4.064,11 no rural, quando o assunto são as séries iniciais os números caem para R$ 3.387,54 e R$ 3.894,77, respectivamente. Já no Ensino Fundamental Integral o valor médio de custo por aluno é maior, de R$ 4.402,79.
Os três Estados com maiores custos em qualquer nível e localidade analisados são Roraima, Rio Grande do Sul e Amapá. Só para se ter um exemplo, no Ensino Médio urbano, esses estados investem, respectivamente, R$ 5.848,90, R$ 5.182,08 e R$ 4.808,84 anuais.
Para que se entenda que esses valores por aluno ainda estão baixos, José Marcelino compara às mensalidades de escolas privadas. “Uma escola de classe média custa R$ 1.500 por mês pelo menos, isso é R$ 18 mil por ano e em tempo parcial”, mostra. Para o professor é necessário diminuir gastos com juros e outros programas de ensino posterior, como o FIES, que desembolsou R$ 33 bilhões em 2016. “A Receita Tributária do Brasil é de 33% do PIB, destinar menos de um terço da receita tributária para a educação é mais do que justo”, afirma.
Médias mundiais e diferenças entre municípios. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) acredita que altos valores no custo por aluno traduzem a disposição do país em expandir o acesso e fornecer educação de qualidade.
Em seu estudo “Education at a Glance 2017”, com números de 2014, a média dos países membros da organização era de US$ 10.759 anuais (ou R$ 40.0977) por aluno, levando em conta todos os níveis de educação. Nesse contexto, o Brasil desembolsou apenas metade do valor: US$ 4.240 anuais (R$ 15.806). Essa comparação pode ser ainda pior já que, segundo José Marcelino, não se pode fazer a conversão simples pelo dólar comercial, o que mostra que a diferença é ainda muito maior.
Se separarmos os custos por setores, percebemos que o Brasil só fica próximo à média da OCDE quando o assunto é a educação superior (terciária): nosso país investia, na época, cerca de US$ 11.666 anuais (R$ 43.4967), enquanto a média dos países membros era de US$ 16.143 (R$ 60.2231). Já em relação aos outros níveis, apresentamos custos de US$ 3.837 anuais (R$ 14.3047) na educação secundária (a média da OECD era de R$ 37.6812) e R$ 14.1604 na educação primária a média da OECD era de R$ 32.5680. O professor da USP também explica que os números brasileiros podem ser ainda menores. “Boa parte da educação básica no país sobrevive na faixa de R$ 5.000 por aluno por ano, com exceções apenas para algumas capitais e municípios mais ricos”, afirma Marcelino.
O IDados, em 2017, também calculou o Custo Aluno anual com o objetivo de mensurar o valor total da implementação do novo PNE e identificar custos adicionais necessários para o cumprimento do programa até 2024. Segundo o levantamento, a quantia investida em cada aluno do ensino público varia enormemente — enquanto alguns municípios gastaram até R$ 15 mil por aluno no Ensino Fundamental, outros não chegaram a R$ 5,5 mil.
Assim, a pesquisa prefere utilizar como medida a mediana dos valores, uma vez que, por causa dos municípios com custos muito elevados, a média acaba ficando muito acima do que a maioria das cidades realmente gasta por aluno. A mediana, por outro lado, divide a distribuição de custos por aluno no meio: 50% dos municípios gastam menos do que ela e 50% gastam mais.
O estudo do IDados mostra então que o custo de um aluno do Ensino Fundamental nos municípios brasileiros em 2014 era de aproximadamente R$ 5,5 mil e do Ensino Médio de aproximadamente R$ 4,5 mil. A pesquisa também estimou o quanto os gastos precisam aumentar para cumprir as exigências do PNE: para o Ensino Fundamental, a estimativa é a de que seria necessário gastar R$ 12.346,78 por aluno; já para o Ensino Médio, a estimativa seria de R$ 11.867,13 por aluno.
Além do custo por aluno. A Campanha Nacional pelo Direito à Educação em vez de calcular o custo do aluno por ano, estima qual deveria ser o valor anual investido no aluno para garantir uma educação pública de qualidade. O índice é chamado de Custo Aluno-Qualidade Inicial (CAQi) e tem o padra?o mi?nimo de qualidade estabelecido no PNE como meta a ser atingida. Os custos mais atualizados estão disponíveis no estudo “Quanto custa a educação pública de qualidade no Brasil?”.
Ao comparar os valores mínimos do Fundeb (o menor valor estimado nos Estados no ano) com os do CAQi — ou seja, o quanto o país aplica em comparação com o que ele deveria aplicar para garantir uma qualidade mínima de educação pública — é possível perceber o quanto o Brasil ainda precisa investir. Em 2018, o CAQi do Ensino Médio urbano é estimado em R$ R$5.454,74, enquanto o Fundeb calculou um valor mínimo de R$ 3.770,00, totalizando uma diferença de R$ 1.684,74 e esse é o nível com a menor diferença entre o CAQi e o Fundeb.
Nas creches urbanas de tempo integral, etapa com maior diferença, a Campanha Nacional estimou um valor/aluno de R$ 12.307,11, mas o FNDE só estipulou um valor mínimo de R$3.016,67, uma diferença de R$ 9.290,44. Resumindo: de acordo com esses dados, o Brasil deveria investir até cinco vezes mais do que gasta hoje para garantir uma educação pública de qualidade. O professor da USP explica que esse valor estimado, apesar de discrepante à realidade, é coerente. “Uma creche privada em tempo integral custa em média R$ 1.000 por mês, diria que investir mais é mais do que razoável, é necessário”, defende.
Colaborou Judite Cypreste e Paula Calçade.
Este texto foi corrigido em 27.jun.2018, às 15h03. O Relatório de Desenvolvimento Humano da Pnud citado no quarto parágrafo não é de 2015, mas sim de 2016, com dados até 2015. Também corrigimos a média de anos de estudos da população brasileira com 25 anos ou mais citada no mesmo parágrafo, que é de 7,8 anos, não de 7,6 anos. Além disso, acrescentamos a informação sobre a porcentagem da população do Brasil com 25 anos ou mais com pelo menos ensino médio.