Projetos buscam limitar influenciadores, mas esbarram em impasses do ‘PL das Fake News’

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Fora dos stories, nem tudo vai bem no mundo dos influenciadores digitais, que têm enfrentado denúncias de promoção de golpes financeiros e propaganda enganosa. Para tentar evitar os abusos, a regulamentação da atividade está na mira do Congresso.

  • O Aos Fatos contabilizou oito projetos apresentados na Câmara dos Deputados que buscam regular a atividade de influenciador;
  • Destes, sete tramitam em conjunto, apensados aos PLs 929/2020 e 1.282/2022;
  • Além desse grupo, há o PL 3.444/2023, apresentado na Casa em julho;
  • O aumento da responsabilidade dos influenciadores e a exigência de transparência para o conteúdo publicitário são algumas das medidas previstas nos textos;

Com o esforço regulatório, os legisladores brasileiros seguem os passos da França, que, em junho deste ano, aprovou uma lei para combater os abusos cometidos por celebridades das redes. Por aqui, no entanto, o impasse na tramitação do PL 2.630/2020, o “PL das Fake News”, dificulta o avanço de projetos que tentam acabar com o vácuo legal do mundo digital.

“O PL 2.630/2020 está servindo de anteparo a todas as outras questões que dizem respeito à regulação das redes. Ele levantou uma polêmica”, afirmou ao Aos Fatos a deputada Lídice da Mata (PSB - BA), autora do PL 3.444/2023.

Para a parlamentar, a regulação dos influenciadores não deve avançar enquanto não for desatado o nó do “PL das Fake News”, e o fato de a oposição ter em sua bancada antigos influencers faz com que “o debate fique mais travado, porque eles trabalharão contra qualquer regulação”.

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Na França, a nova regulação dos criadores de conteúdo teve como objetivo proteger a população de práticas nocivas, em especial para a saúde pública, analisa Yasmin Curzi, professora do Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV (Fundação Getulio Vargas).

A proibição de publicações que incentivem o tabagismo, incluindo cigarros eletrônicos, e o combate a práticas que possam fomentar transtornos de dismorfia corporal, como a anorexia, estão entre as medidas adotadas pelos legisladores franceses, que também buscaram restringir a promoção de jogos de azar, apostas e criptoativos.

Os projetos de lei brasileiros sugerem algumas medidas inspiradas no que foi feito na França. A seguir, o Aos Fatos resume os principais pontos das propostas em tramitação na Câmara.

Respeito a direitos fundamentais. Vários projetos enfatizam a responsabilidade dos influenciadores digitais com a veracidade das informações divulgadas, o respeito pelos direitos autorais e a preservação da privacidade e da imagem de terceiros, além de proibirem a disseminação de conteúdo discriminatório, violento ou que incite o ódio.

Ao responsabilizar os influenciadores pelos danos causados pelo conteúdo que divulgam, esses projetos ajudariam a evitar a disseminação de golpes como o do InstaMoney, que chegou a ser promovido nas redes por celebridades como a ex-BBB e ex-jogadora de vôlei Key Alves.

Mesmo sem uma lei específica regulando a atividade, influenciadores de qualquer nicho já deveriam respeitar outras normas vigentes, mas isso nem sempre acontece. Como o Aos Fatos mostrou, diversos produtores de conteúdo têm realizado rifas em seus perfis, o que é ilegal.

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Transparência para publicidade. Mais de um projeto menciona a necessidade de transparência na divulgação de conteúdo publicitário, exigindo que os influenciadores informem de maneira clara quando um conteúdo é patrocinado.

Essa medida já é prevista no Guia de Publicidade por Influenciadores Digitais, publicado pelo Conar (Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária). Embora a entidade possa julgar abusos de influenciadores que descumprirem as recomendações, como já o fez, ela não tem o poder de puni-los.

A criação de regras para a publicação de conteúdos pagos responde ao crescimento da importância do chamado “marketing de influência”. Segundo pesquisa do Ibope Inteligência, em 2019, 50% dos usuários de internet no Brasil já diziam ter o hábito de comprar produtos ou serviços indicados por influenciadores digitais.

Os projetos também buscam reforçar o lembrete de que os influenciadores precisam se submeter às regras que valem para a publicidade como um todo. O Código de Defesa do Consumidor, por exemplo, proíbe a propaganda enganosa — de que a influenciadora Virgínia Fonseca foi acusada em março deste ano após o lançamento de um cosmético, por exemplo.

Proteção da saúde mental. O PL 3.444/2023 exige que os influenciadores informem sempre que alguma foto ou vídeo tenha passado por edição ou ajustes promovidos por inteligência artificial.

A medida, prevista também na nova lei francesa, visa reduzir os impactos nocivos de padrões inalcançáveis de beleza sobre a autoimagem corporal e a saúde mental dos usuários das redes.

Requisitos. Parte dos textos sugerem requisitos para exercer a atividade de influenciador, como idade mínima, possuir CPF e, no caso do PL 2.347/2022, também ter conhecimento técnico relacionado ao nicho trabalhado.

Já para os influenciadores mirins, o PL 3.444/2023 prevê a exigência de autorização judicial. A concessão do alvará deve levar em conta os riscos psicológicos para o menor de idade, sua compatibilidade com a frequência escolar e a gestão da renda proveniente dessa atividade.

Atuação das plataformas. O PL 3.444/2023 também menciona a necessidade de as plataformas digitais implementarem mecanismos para notificar conteúdo ilícito produzido por influenciadores e disponibilizar relatórios sobre suas atividades de moderação.

Esse ponto dialoga com o “PL das Fake News”, que busca uma maior responsabilização das big techs ao exigir mais atenção na moderação de conteúdos criminosos e a divulgação de relatórios de transparência.

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Alguns projetos em tramitação já estão desatualizados, pois se limitam a buscar o reconhecimento da profissão de influenciador, que desde fevereiro de 2022 já consta na Classificação Brasileira de Ocupações. Há ainda a tentativa de impor a esses profissionais a necessidade de diploma de jornalismo — que não é obrigatório nem para os próprios jornalistas desde 2009, em virtude de decisão do STF (Supremo Tribunal Federal).

Além das iniciativas no Congresso, outras instituições também estudam formas de regular a atuação dos produtores de conteúdo para as redes. É o caso da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), que colocou os influenciadores de finanças entre as prioridades de sua agenda regulatória de 2023. A entidade afirmou ao Aos Fatos que pretende abrir uma consulta pública sobre o tema ainda neste ano.

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