Posts antivacina contrariam regra do Twitter e alcançam mais de 147 mil interações

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Três meses depois de o Twitter anunciar um endurecimento de sua política contra desinformação sobre Covid-19, publicações que disseminam dados falsos e teorias conspiratórias a respeito da vacinação continuam com espaço na rede social. Em uma busca na plataforma, o Radar Aos Fatos encontrou 94 posts publicados apenas entre 1º e 12 de junho que usam informações enganosas para promover discurso antivacina e que seguiam no ar até esta quinta-feira (17), sem nenhum tipo de alerta. Os tweets tiveram mais de 147 mil interações (soma de retweets e curtidas).

Depois da publicação desta reportagem, 35 dessas mensagens saíram do ar, 11 receberam um rótulo com o texto "Este tweet é enganoso", e um usuário teve sua conta suspensa. Em nota, o Twitter afirmou que "a maior parte dos tweets [destacados pela reportagem] não viola sua política de informações enganosas sobre a Covid" e que a "empresa tomou as medidas cabíveis nos Tweets que violam essas políticas". A íntegra pode ser lida no fim desta página.

Em 1º de março, a empresa afirmou que passaria a remover ou rotular publicações potencialmente enganosas sobre vacinas, e a punir com suspensões e até banimentos usuários que as compartilhassem. A política da rede social para lidar com desinformação afirma que não é permitido disseminar informações falsas sobre "a eficácia e/ou segurança de medidas de prevenção, tratamentos ou outras precauções para mitigar ou tratar a doença".

Nesta semana, a moderação da plataforma voltou a ser questionada depois que Allan dos Santos, dono do site bolsonarista Terça Livre, atribuiu à vacina o mal súbito do jogador dinamarquês Christian Eriksen. Como a imprensa noticiou, o atleta não havia sido vacinado. A postagem de Santos segue no ar, também sem nenhum alerta.

A maior parte das publicações encontradas pelo Aos Fatos inclui uma série de outras afirmações sobre vacinas já desmentidas, como a de que elas magnetizam o braço do vacinado; que emails do conselheiro da Casa Branca Anthony Fauci provam uma conspiração de dominação global; que o imunizante da Pfizer altera o DNA; que a vacinação estimula a aparição de novas variantes; e, ainda, que os imunizantes teriam nanochips 5G para controlar mentes. Tudo isso é falso.

Em alguns casos, desinformação sobre outros assuntos da pandemia é usada para reforçar o discurso antivacina. O tweet abaixo, por exemplo, distorce as conclusões de uma metanálise para promover o uso de ivermectina, droga sem comprovação científica contra o coronavírus.

No levantamento, quem mais conseguiu engajar com esse tipo de conteúdo foram influenciadores próximos do governo Jair Bolsonaro. O jornalista Guilherme Fiuza somou mais interações, com 42 mil retweets e curtidas. Em uma das mensagens, ele sugere, por exemplo, que vacinas podem estar por trás do aparecimento de novas variantes. Em seguida, aparecem o ex-candidato a vereador Alan Lopes (PSD-RJ), com 38 mil interações, e o médico Alessandro Loiola, com mais de 9 mil.

ABAIXO DA SUPERFÍCIE

Para encontrar as mensagens antivacina, a reportagem fez uma busca por publicações sobre imunizantes no Twitter e usou uma ferramenta de análise de redes chamada Gephi, que divide o debate em grupos , unindo usuários que se retuitam com frequência. Na prática, o software ajuda a encontrar perfis com discursos similares sobre o assunto pesquisado.

Os tweets destacados pelo Radar Aos Fatos mostram apenas a ponta mais visível de um desses grupos, o que concentra a maior parte do conteúdo contrários a vacinas. No total, esse conjunto reuniu 2.037 contas e 8.278 tweets.

Nem todo conteúdo publicado pelo grupo analisado contém desinformação sobre vacina, mas a prevalência é alta — 36% dos 200 tweets com mais interações analisados individualmente pela reportagem. Mais uma vez, o levantamento sugere que o Twitter não tem aplicado suas próprias políticas. Nenhuma das 8.278 mensagens do grupo recebeu sequer um alerta de que poderia conter informações enganosas.

Os dados também mostram que parte desses usuários publica desinformação sobre vacinas sistematicamente, mas continua com sua conta funcionando. O perfil mais ativo do grupo, por exemplo, havia publicado 71 mensagens nos 12 dias analisados, média de mais de 5,9 tweets por dia. O Twitter afirma que desativa contas que infringem suas regras cinco vezes. Depois da publicação da reportagem, a conta foi tirada do ar.

OUTRO LADO

O Twitter informou que conduziu uma análise dos posts identificados pelo Aos Fatos e "verificou que a maior parte dos tweets não viola a política de informações enganosas sobre a Covid-19, que é global e aplicada a todos os mercados em que a plataforma opera". A empresa também afirmou que "tomou as medidas cabíveis nos tweets que violam essas políticas" — menos de um terço dos conteúdos apontados pela reportagem, segundo o Twitter.

"É importante mencionar que, assim como a própria política para conteúdo enganoso referente a Covid, os processos de identificação de tweets que podem violar essas regras também estão em constante evolução. O Twitter já dispõe de machine learning para identificar conteúdos potencialmente enganosos, mas conta com a contribuição de parceiros e também das pessoas que usam a plataforma para levar, aos seus times de análise, tweets que possam violar essas regras", concluiu a empresa.

A reportagem também entrou em contato com os donos dos perfis citados, mas não teve retorno até a publicação deste texto.

Este texto foi atualizado às 19h15 para incluir uma nota com o posicionamento do Twitter e uma atualização sobre as medidas tomadas contra os post destacados pela reportagem.

Referências

  1. 1 (1 e 2)
  2. Estadão
  3. Gephi

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