Dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) de fevereiro mostram que o preço do ovo de galinha cresceu 15,39% em relação a janeiro. A variação, que foi a maior desde janeiro de 2020, tem ecoado até mesmo no discurso do presidente Lula (PT), que disse no último dia 7 não entender o porquê do aumento.
O presidente mencionou a alta dos preços ao menos três vezes desde meados de fevereiro, quando a Abras (Associação Brasileira de Supermercados) emitiu comunicado sobre o tema. Junto com o café moído, o ovo foi responsável por puxar o IPCA de alimentos, que subiu 0,7% em relação a janeiro.
O aumento também tem gerado interesse e manifestações negativas de usuários nas redes. Dados do Google Trends mostram que o termo “preço do ovo de galinha” teve os maiores picos de interesse dos últimos 90 dias entre 5 e 17 de março.
Aos Fatos consultou especialistas e entidades do setor para entender quais são os fatores que influenciam no aumento do preço dos ovos de galinha no Brasil e o que deve ocorrer a curto prazo.
- Quais fatores explicam a alta no preço dos ovos?
- A gripe aviária nos EUA tem afetado os preços no Brasil?
- O que deve acontecer nos próximos meses?
1. Quais fatores explicam a alta no preço dos ovos?
O atual aumento dos preços dos ovos envolve múltiplos fatores, sendo alguns deles sazonais.
Queda em 2024 e aumento dos custos. Entre maio e novembro de 2024, houve sete meses de queda consecutiva no preço dos ovos, acompanhada de um aumento nos custos dos principais insumos, como a ração para galinhas e as embalagens.
Em nota enviada ao Aos Fatos, o IOB (Instituto Ovos Brasil) informou que a saca de milho (principal insumo do setor) registrou alta de mais de 30% desde julho de 2024. O instituto diz que, embora o impacto não tenha sido imediato, a elevação dos custos tornou inevitável o repasse para o consumidor final.
Já a ABPA (Associação Brasileira de Proteína Animal) afirmou, em nota à imprensa, que houve elevação de mais de 100% nos custos de insumos de embalagens.
Extremos climáticos. As altas temperaturas causadas pelas sucessivas ondas de calor fazem com que as galinhas comam menos ração e, portanto, produzam menos ovos. Esse comportamento é conhecido como estresse calórico.
Além de diminuir a oferta no mercado, o problema faz com que os produtores precisem investir em sistemas para controlar a temperatura nas granjas. Isso aumenta os gastos com energia elétrica, que acabam sendo repassados ao consumidor.
Descarte de animais. A partir da segunda quinzena de janeiro, a disponibilidade de ovos também foi reduzida em decorrência do descarte de poedeiras — galinhas selecionadas para a produção de ovos — mais velhas. O movimento, que ocorre periodicamente, também ajudou a aumentar os preços do produto.
Quaresma. Claudia Scapelin, pesquisadora de ovos do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada) da USP afirmou ao Aos Fatos que, desde 2013, quando começou o monitoramento da instituição, o preço dos ovos tende a subir na Quaresma — tradição cristã que marca um período de 40 dias antes da Páscoa.
Durante essa época, a Igreja Católica sugere não consumir carne vermelha às sextas-feiras, o que aumenta a procura por ovos como proteína substituta.
Dados da série histórica mostram que, entre janeiro e fevereiro de 2022, 2023 e 2024, os preços dos ovos em Bastos (SP) — um dos principais polos produtores do Brasil — subiram 25%, 19% e 22%, respectivamente. Apesar de significativa, a alta corresponde a praticamente a metade da variação deste ano.
Volta às aulas e aumento do consumo. A demanda por ovos também aumenta gradualmente no início do ano em virtude da volta às aulas, já que o alimento é amplamente usado na merenda escolar. Com o aumento na demanda, os preços também crescem.
“Além disso, a população em geral retoma o consumo após um janeiro financeiramente mais apertado, devido a despesas extras”, explica Scapelin.
2. A Gripe Aviária nos EUA tem afetado o preço dos ovos de galinha no Brasil?
Há opiniões divergentes sobre a influência do aumento das exportações de ovos brasileiros para os Estados Unidos sobre os preços praticados no mercado interno.
Em razão de um surto de gripe aviária que já fez com que fossem abatidas 166 milhões de aves desde 2022, os EUA se tornaram em fevereiro o segundo maior destino de exportações de ovos brasileiros, atrás apenas da Arábia Saudita. Nesse mês, as vendas do produto ao exterior subiram 57,5% em relação ao mesmo período do ano passado.

Fernando Gonçalves, gerente da Coordenação de Índices de Preços do IBGE, diz que a alta na exportação aos americanos é um dos motivos que explicam a subida nos preços do alimento no Brasil.
Claudia Scarpelin discorda. “As exportações de ovos representam menos de 1% da produção total do Brasil, o que faz com que outros fatores tenham maior influência na variação dos preços internos”.
A pesquisadora do Cepea ressalta, no entanto, que se a situação da gripe aviária nos Estados Unidos persistir e o país continuar expandindo suas importações de ovos brasileiros de forma consistente, poderá de fato haver uma diminuição da disponibilidade interna, o que poderia impactar os preços domésticos.
3. O que deve acontecer nos próximos meses?
Especialistas afirmam que o comportamento dos preços nos próximos meses vai depender do equilíbrio entre a oferta interna de ovos e a demanda pela proteína. Após a Quaresma, é comum, por exemplo, que o consumo se estabilize, o que pode fazer com os preços se mantenham ou até recuem.
“Outro fator importante é o alojamento de aves poedeiras. Se os produtores ampliarem significativamente o plantel nos próximos meses, impulsionados pelos altos preços pagos em fevereiro, a oferta de ovos no mercado interno aumentará”, afirma Scarpelin.
Caso o crescimento supere a demanda, os preços podem ser pressionados para baixo, resultando em quedas no mercado doméstico.
O caminho da apuração
Aos Fatos se baseou em dados estatísticos do IBGE para contextualizar a alta no preço dos ovos, complementando com informações do Google Trends para demonstrar a repercussão do tema. Também foram consultadas entidades do setor, como o IOB e a ABPA, que forneceram informações sobre os custos de produção e fatores sazonais que impactam os preços.
A reportagem também entrevistou especialistas para obter análises sobre os fatores que explicam a alta e as perspectivas futuras. Por fim, contextualizamos o texto com informações difundidas na imprensa.