Patrícia Lelis inventa teorias conspiratórias mais uma vez, agora nos EUA

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Os apoiadores mais ferrenhos de Donald Trump — apelidados de “MAGA” — são famosos por acreditar em qualquer maluquice que envolva seus adversários, desde satélites italianos que fraudaram as eleições americanas até a história de que Joe Biden tinha morrido e que o caso estava sendo acobertado pelo governo.

A história maluca mais recente a ser abraçada pelos MAGA foi a de que o ex-secretário de Justiça dos EUA Bill Barr teria traído a nação ao agir em conluio com autoridades do condado de Fulton para acusar criminalmente Donald Trump e outras 18 pessoas de tentar manipular as eleições na Geórgia em 2020.

A teoria da conspiração foi publicada pelo site de extrema direita Project Veritas e tem como principal fonte uma mulher que é identificada como whistleblower, Patrícia Lélis (veja abaixo).

Captura de tela de post do ‘Project Veritas’ no X com texto acusando Bill Barr de reuniões secretas para processar Donald Trump. Inclui citações atribuídas a Patrícia Lélis e Armstrong Williams. Na parte inferior, imagem de uma mulher de cabelos castanhos longos, usando blusa roxa, falando, com legenda em inglês sobre estar sendo processada.
Lélis aparece em série de vídeos divulgados pelo ‘Project Veritas’ nas últimas semanas (Reprodução/X).

Sim, aquela Patrícia Lélis. Mas vamos chegar lá.

Barr é mal visto pelos apoiadores de Trump desde que afirmou que não havia nenhum indício de fraude nas eleições de 2020. Na época, ele — que ocupava o cargo de secretário de Justiça do governo americano — afirmou que Trump ficou enfurecido com seu posicionamento. Meses depois, Barr pediu demissão.

Mesmo assim, não há nenhum registro de que o ex-secretário tenha participado da confecção da acusação criminal que apontou que o presidente tentou manipular as eleições. Aos Fatos só encontrou registros de que ele alegou ter dito diretamente a Trump que não encontrou indícios de fraude no condado de Fulton.


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Voltando à acusação de Lélis, podemos apontar várias fragilidades:

  • Conforme destacado por Will Sommer, do site The Bulwark, as datas das denúncias não batem. Durante o período englobado pelas “provas” de Lélis, o secretário de Justiça dos EUA não era mais Barr, e sim Merrick Garland;
  • Grande parte das provas apresentadas nos vídeos são mensagens escritas em cadernos físicos pela própria Lélis;
  • Também não há garantias de que as mensagens de WhatsApp mostradas por ela sejam reais. Lélis já foi acusada de forjar conversas no passado;
  • E o Project Veritas, veículo que publicou a teoria, é um site de extrema direita fundado por James O’Keefe, conhecido por divulgar desinformações e teorias conspiratórias e promover práticas antiéticas de investigação. Em 2021, por exemplo, membros do site foram investigados pelo FBI por roubar o diário da filha do ex-presidente Joe Biden.

Lélis alega que conseguiu essas informações enquanto trabalhou como advogada para o apresentador Armstrong Williams, entre 2021 e 2023.

Mas aí vem o detalhe: Lélis não é formada em direito. Em janeiro de 2024, foi noticiado que ela estava sendo procurada pelo FBI por fingir ser uma advogada de imigração para aplicar golpes em clientes. Na época, ela mesma confirmou no X ser alvo de investigação e disse que:

“Meu crime: Peguei documentos de uns americanos safados que me pediram para ser bode expiatório contra os meus e meti o pé. Boa sorte, USA, e contem sempre comigo para estar contra o governo americano. Foram meses de perseguições e falsas acusações.” — disse ela.

Essas informações são públicas e podem ser encontradas por qualquer pessoa com acesso à internet. Então, ou a equipe do Project Veritas não pesquisou a biografia de Lélis ou simplesmente ignorou seu histórico de mentiras para publicar uma teoria da conspiração.

Caso a primeira opção seja a correta, vamos ajudar na futura pesquisa.

Quem é Patrícia Lélis?

Patrícia Lélis nasceu em Taguatinga (DF) e é formada em jornalismo pelo Ceub (Centro Universitário de Brasília). Ela ficou conhecida na internet por inventar mentiras sobre políticos e foi alçada a “personalidade” no X.

Sua “fama” começa em 2016, com a “denúncia” envolvendo o ex-deputado Marco Feliciano. Lélis alegou ao UOL que o parlamentar tentou estuprá-la em um apartamento em Brasília.

A história ganhou proporções enormes: virou investigação da Polícia Civil de São Paulo, movimentou o Congresso e até resultou na detenção do chefe de gabinete de Feliciano.

A polícia, no entanto, encontrou imagens que contrariavam a versão de Lélis e arquivou o caso. O delegado também obteve um laudo psicológico que diagnosticou a jovem como mitômana (condição que é negada por ela). O Ministério Público, então, acusou Lélis de denunciação caluniosa e extorsão.

Em 2017, ela registrou um boletim de ocorrência contra o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) por ameaça e a denúncia chegou a ser apresentada ao STF (Supremo Tribunal Federal) pela PGR (Procuradoria-Geral da República). Anos depois, a Justiça arquivou o caso por ausência de provas e, mais uma vez, ela foi indiciada por calúnia.

Lélis alega que namorou o deputado por mais de três anos. Com esse pretexto, ela atacou a família com posts que diziam, por exemplo, que o parlamentar teria “nojinho de vagina” e que o vereador carioca Carlos Bolsonaro (PL) teria sido internado por overdose de cocaína. Eduardo nega qualquer tipo de envolvimento com Lélis.

No mesmo ano, começaram a circular nas redes imagens de um suposto boletim de ocorrência no qual Lélis acusava o deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ) de agressão. A história é bem confusa: diferentemente das outras denúncias, essa não foi publicizada pela jovem. Na verdade, ela negou a autoria do boletim e disse que o documento era fruto de um hacker que invadiu sua conta. O deputado também negou o caso.

A jornalista também já participou de diversos partidos:

  • Ela alega ter sido militante do PSC até 2016;
  • Em 2017, ela anunciou que iria se filiar ao PDT para concorrer às eleições;
  • Em 2018, Lélis se candidatou ao cargo de deputada federal por São Paulo pelo PROS, mas não conseguiu se eleger (veja abaixo);
  • E em 2021, ela foi expulsa do PT por transfobia.
Página de registro de candidatura no site da Justiça Eleitoral com foto de mulher de cabelos castanhos claros e lisos, usando roupa vermelha. À esquerda, informações indicam nome Patricia Lelis, candidata a deputada federal por São Paulo pelo PROS, número 9085, com situação ‘Não eleito’ e status de candidatura deferido. À direita, dados pessoais incluem nome completo, data de nascimento, cor/raça, estado civil, grau de instrução, ocupação, nacionalidade, se é candidata à reeleição, partido e limite legal de gastos.
Jornalista não conseguiu se eleger em 2018 (Reprodução)

A jornalista se mudou para os EUA após perder as eleições e, em 2019, chegou a ser detida pela polícia de Virginia por “convocação falsa ou relatório falso à autoridade policial”.

Página de registro de prisão no condado de Arlington, Virgínia, com informações sobre Patricia Lelis. À esquerda, dados indicam nome completo, data e hora da prisão, idade na prisão, idade atual, gênero, data de nascimento, endereço e cidade. À direita, foto de mulher de cabelos castanhos claros, lisos e soltos, usando óculos de armação grossa e blusa clara, em frente a fundo neutro.
Site arrest.org mostra que Lélis foi detida em dezembro de 2019 (Reprodução)

Desde então, Lélis acumulou desinformações nas redes. Ela compartilhou, por exemplo, vídeos de um ator pornô como se ele fosse o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG). A Justiça ordenou que ela deletasse o conteúdo.

Em 2024, Lélis passou a ser foragida do FBI. Ela foi acusada de fraude eletrônica, transações monetárias ilegais e roubo de identidade agravado. Segundo a investigação, Lélis se passava por uma advogada especializada em imigração para conseguir vistos e chegou a causar prejuízos de mais de U$ 700 mil. Ao responder às acusações no X, ela deixou escapar que estava no México.

Atualmente, Lélis indica em seus perfis nas redes que está em Washington.


Outro lado

Aos Fatos entrou em contato com Lélis por email na última sexta-feira (15), mas não recebeu resposta até a publicação desta newsletter.

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