Na ONU, Trump desinforma sobre guerras, impostos e popularidade

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Em discurso na 80ª Assembleia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas), nesta terça-feira (23), o presidente americano Donald Trump desinformou ao dizer que deu fim a “sete guerras intermináveis”. Apesar de ter participado de negociações pontuais e cessar-fogos temporários, o republicano não foi responsável por mediar a assinatura de acordos de paz definitivos.

Em um momento em que diversas pesquisas indicam uma queda de popularidade, Trump também enganou ao afirmar que seus números de aprovação nunca estiveram tão altos.

O americano ainda disseminou alegações falsas sobre economia ao afirmar que os preços da gasolina e dos alimentos estão em queda e que sua gestão promoveu o maior corte de impostos da história do país.

A seguir, Aos Fatos desmente cinco argumentos enganosos usados pelo presidente americano ao longo de sua fala.

Eu acabei com sete guerras intermináveis.

Em seu discurso, Trump afirmou que teria acabado com “sete guerras intermináveis”, mas não especificou quais seriam esses conflitos. Por seu histórico de declarações, é possível identificar que os episódios aos quais ele possivelmente se referiu seriam os de: Armênia e Azerbaijão, República Democrática do Congo e Ruanda, Índia e Paquistão, Israel e Irã, Tailândia e Camboja, Egito e Etiópia e Kosovo e Sérvia.

Nenhum desses casos, no entanto, pode ser classificado como uma guerra terminada com mediação de Trump. Eis o que ocorreu em cada um dos conflitos:

  • Armênia e Azerbaijão: em 2019, o presidente americano promoveu uma declaração conjunta, mas não se tratou de um acordo de paz. As disputas territoriais entre os dois países seguem ativas, e ainda não há um entendimento definitivo;
  • República Democrática do Congo e Ruanda: o republicano celebrou em 2019 um suposto acordo de paz, mas o conflito, que já dura mais de três décadas, permanece sem solução. Episódios de violência continuam sendo registrados, e as negociações seguem travadas;
  • Índia e Paquistão: Trump de fato teve participação em um cessar-fogo mediado com apoio internacional. Apesar disso, o governo indiano afirma ter tratado diretamente com autoridades paquistanesas para chegar ao acordo, versão que o Paquistão nega. As narrativas divergentes contribuíram para o desgaste das relações entre Washington e Nova Déli, agravado também pela guerra comercial promovida por Trump;
  • Israel e Irã: em 2019, após bombardeios americanos contra instalações nucleares iranianas, Trump anunciou um cessar-fogo. No entanto, não houve assinatura de tratado de paz, e as tensões entre os dois países seguem elevadas, mesmo com o reconhecimento da importância da intervenção americana na trégua temporária;
  • Tailândia e Camboja: confrontos na fronteira resultaram em centenas de milhares de deslocados. Trump pressionou por um cessar-fogo, mas a intervenção não tratou das causas estruturais do conflito, que continua sem solução;
  • Egito e Etiópia: não havia guerra, mas uma disputa diplomática pela construção da maior hidrelétrica da África, a represa do Nilo. O impasse persiste, e a obra foi concluída sem consenso regional;
  • Kosovo e Sérvia: em 2020, Trump mediou, na Casa Branca, a assinatura de um acordo de cooperação econômica entre os países. O entendimento, no entanto, não abordou a disputa central sobre a independência de Kosovo, e o conflito segue em aberto.

O presidente americano também tem tentado mediar um possível acordo que encerre o confronto entre Rússia e Ucrânia. Apesar de ter se reunido tanto com o presidente russo, Vladimir Putin, quanto com o líder ucraniano, Volodimir Zelenski, as negociações ainda não avançaram.

Portanto, não houve o encerramento de “sete guerras intermináveis”, como afirmou Trump. No máximo, houve negociações pontuais ou cessar-fogos temporários, muitos dos quais não resolveram as causas dos conflitos.

Nós implementamos o maior corte de impostos na história americana.

A alegação, repetida por Trump desde 2017, é FALSA. As medidas implementadas naquele ano, e validadas novamente em 2025, representam o terceiro maior corte de impostos nos EUA desde 1981, considerando o impacto no PIB (Produto Interno Bruto).

Em checagem publicada neste ano, o Politifact analisou o impacto dos cortes de impostos observando os primeiros cinco anos de vigência de diversas leis aprovadas desde 1981. De acordo com essa metodologia, os cortes aprovados pela gestão Trump com a lei One Big Beautiful, sancionada em julho, corresponderiam a 1,4% do PIB.

Essa porcentagem considera medidas que foram adotadas inicialmente no primeiro mandato do republicano e restabelecidas em 2025. Se forem considerados apenas os novos cortes de impostos determinados em 2025, sem os de 2017 que foram renovados, a One Big Beautiful cairia para o sexto lugar, com impacto em 0,5% no PIB.

A ordem do ranking, segundo o Politifact, é a seguinte:

  1. Lei de 1981, sancionada por Ronald Reagan, cujos cortes corresponderam a 3,5% do PIB acumulado de cinco anos;
  2. Lei de 2012, apresentada por congressistas republicanos e sancionada por Barack Obama, que cortou impostos em até 1,7% do PIB;
  3. Leis de 2017 e 2025 de Trump, que geraram cortes equivalentes a 1,4% do PIB.

De acordo com levantamento feito em 2017 pelo Committee for Responsible Budget com dados do Departamento do Tesouro americano, os cortes instituídos por Trump ocupam a oitava posição entre os maiores cortes de impostos desde 1918, considerando o impacto no PIB. Ao considerarmos os valores corrigidos pela inflação, os cortes chegam à quarta posição.

Eu fiquei muito orgulhoso ao ver, nesta manhã, que eu tenho os números mais altos que já tive nas pesquisas.

Apesar de o presidente não ter deixado claro a qual pesquisa se referia, a alegação foi classificada como falsa porque as suas taxas de aprovação em diferentes levantamentos estão abaixo do recorde histórico e também em patamar inferior ao de outros presidentes dos EUA no período pós-Segunda Guerra Mundial.

O agregador de pesquisas do Times aponta que, atualmente, Trump tem 44% de aprovação — valor menor que o registrado em períodos anteriores da série histórica — e 53% de desaprovação.

Já em uma média de pesquisas compiladas pela Gallup, a aprovação de Trump caiu de 47% na posse, em janeiro deste ano, para 40% em setembro. Seu recorde de aprovação foi registrado em 2020, ainda durante seu primeiro mandato, de 49%.

Os números são menores que os de outros presidentes no pós-guerra. George W. Bush, por exemplo, chegou a 89% de aprovação durante seu mandato. Barack Obama também foi outro líder americano que conseguiu taxas mais altas de aprovação, tendo atingido o pico de 69%.

Agora eles [prefeitura de Londres] querem adotar a lei Sharia. Mas você está em um país diferente. Você não pode fazer isso.

O presidente americano repercute uma desinformação que circula há anos nas redes de extrema direita para atacar o prefeito de Londres, Sadiq Khan. Não é verdade que a prefeitura da capital britânica pretende adotar a Sharia — conjunto de princípios que regem a vida dos islamitas. Por meio de busca na imprensa e no site da autoridade municipal, Aos Fatos não localizou qualquer iniciativa similar.

Desde a década de 1980, grupos islâmicos por todo o Reino Unido se reúnem em um sistema paralelo conhecido como conselhos islâmicos de Sharia. Eles operam de forma limitada, em contextos comunitários específicos e não possuem qualquer autoridade perante a lei britânica.

Os grupos são formados por voluntários, que oferecem conselhos aos muçulmanos, geralmente sobre casamento, divórcio e outros assuntos relacionados à religião.

Sob minha liderança, os custos de energia caíram, os preços da gasolina caíram, os preços dos alimentos caíram, as taxas de hipoteca caíram e a inflação foi derrotada.

A afirmação de Trump mistura dados corretos e incorretos. Os preços da energia — categoria que inclui óleo combustível, propano, querosene, lenha e outros serviços — de fato caíram, mas a conta de luz subiu 6,2% em relação ao ano passado.

Em relação aos alimentos, os preços subiram 2,7% entre agosto de 2025 e o mesmo período no ano passado, segundo dados do CPI (Consumer Price Index, ou Índice de Preços ao Consumidor).

A atualização mais recente do CPI também mostrou que não é verdade que a inflação tenha sido “derrotada”, como afirmou o republicano. O índice apontou uma alta de 2,9% nos últimos 12 meses, o maior nível desde janeiro.

Já o preço da gasolina está pouco acima do registrado em janeiro, mês em que Trump voltou à Presidência, mas ainda assim possui um valor ligeiramente mais baixo do que o registrado no mesmo período no ano passado.

Por fim, as taxas de hipoteca de fato caíram de 6,96% na posse de Trump para 6,26% atualmente.

O caminho da apuração

Aos Fatos transcreveu o discurso de Trump, na íntegra, por meio do Escriba. As frases passíveis de checagem foram distribuídas aos repórteres, que verificaram a veracidade das alegações com base em dados públicos e reportagens publicadas pela imprensa.

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