Não é verdade que lotes de leite contaminados com metanol estão sendo distribuídos no país. Procurados pelo Aos Fatos, o Ministério da Saúde, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e a Senacon (Secretaria Nacional do Consumidor) desmentiram o boato. As peças enganosas compartilham um vídeo manipulado por inteligência artificial para fazer crer que a notícia foi veiculada pela CNN Brasil.
As publicações falsas somavam 27 mil visualizações no TikTok até a tarde desta terça-feira (7).
Diversos lotes de leite contaminados com metanol, uma substância altamente tóxica, já estão sendo distribuídos e consumidos em todo o país. Em várias cidades, hospitais já registram casos de intoxicação e o medo cresce a cada hora.
Peças de desinformação nas redes têm compartilhado um vídeo gerado por inteligência artificial para alegar que um erro de fabricação teria feito com que lotes de leite fossem contaminados por metanol. A alegação enganosa foi desmentida por diversas autoridades:
- Por telefone, o Ministério da Saúde afirmou ao Aos Fatos que não há casos de intoxicação por metanol envolvendo o consumo de bebidas não alcoólicas, como leite, café, refrigerante ou água;
- Já a Senacon informou que não há alertas de contaminação do leite pelo composto tóxico;
- Por fim, a Anvisa disse não ter recebido nenhuma denúncia — fundamentada ou não — que apontasse para a contaminação de bebidas não alcoólicas por metanol.
Em busca na imprensa e em canais oficiais, Aos Fatos também não localizou quaisquer informações sobre acidentes industriais ou erros no processamento do leite que tivessem resultado na contaminação do produto pelo composto tóxico.
Para disseminar a desinformação, os posts enganosos usam a imagem do apresentador da CNN Brasil William Waack. Em busca no acervo da emissora, não foram encontrados registros de que a notícia tenha sido veiculada.
O vídeo compartilhado nas redes também apresenta indícios de ter sido criado por ferramentas de inteligência artificial. Na suposta gravação, Waack fala de modo ininterrupto e sem expressividade. As frases são praticamente contínuas, sem pausas, e os movimentos faciais são repetitivos.
Operação em São Paulo. Algumas peças de desinformação atribuem a suposta descoberta dos lotes contaminados à polícia de São Paulo. Os posts fazem referência a uma operação deflagrada na última sexta-feira (3) pela Polícia Militar Ambiental, o Ministério Público e a Defesa Agropecuária de São Paulo para investigar denúncias de adulteração de leite. Não há, no entanto, relação com contaminação por metanol.
A Defesa Agropecuária afirmou ao Aos Fatos que a investigação aponta para a adição de soda cáustica e água oxigenada ao leite em propriedades no interior do estado. Os compostos também são tóxicos para seres humanos.
Ao longo dos anos, já houve registros de adulteração do leite com o uso de água, gordura vegetal, soda cáustica, água oxigenada, água sanitária e até formol. As substâncias são usadas para reprocessar a bebida já deteriorada e vencida, que deveria ter sido descartada, e para aumentar seu volume e teor de gordura.
Intoxicação por metanol. Segundo o levantamento mais recente do Ministério da Saúde, divulgado na última segunda (6), foram registradas 217 notificações de intoxicação por metanol associadas ao consumo de bebidas alcoólicas, entre casos investigados e confirmados. Duas pessoas morreram em decorrência do consumo da substância.
No momento, a Polícia Civil de São Paulo investiga se o composto foi usado para higienizar garrafas em fábricas clandestinas de bebidas alcoólicas. Já a Polícia Federal apura se houve atuação do crime organizado na adulteração dos produtos.
Aos Fatos já desmentiu uma série de peças de desinformação sobre a crise. Veja aqui o que checamos até o momento.
O caminho da apuração
Aos Fatos realizou buscas reversas e consultas a bancos de dados públicos e oficiais para verificar se havia registros de intoxicação associadas ao consumo de leite. Também foi feita uma pesquisa no acervo da CNN Brasil para confirmar se a emissora havia noticiado o suposto caso, o que não ocorreu.
Para esclarecer a veracidade das alegações, a reportagem também entrou em contato com o Ministério da Saúde, a Senacon, a Anvisa e a Defesa Agropecuária de São Paulo. Além disso, foram consultadas informações das polícias Civil e Federal sobre as investigações em curso.
A análise técnica do vídeo indicou que o material foi gerado por inteligência artificial, a partir de características visuais e de áudio.
