Não é verdade que os testes do tipo RT-PCR, usados para detectar a Covid-19 e que inserem no nariz uma espécie de cotonete, podem atingir a glândula pineal e causar infecções no cérebro, como afirmam postagens (veja aqui). O instrumento usado, conhecido como swab, alcança a nasofaringe ou a garganta, e só poderia atravessar as membranas e a estrutura óssea que separam a nasofaringe do cérebro em caso de força excessiva, fratura ou má formação óssea. A glândula pineal também não fica na base do cérebro, e sim no centro do órgão.
Essa desinformação tem circulado principalmente em grupos no Telegram, onde acumula cerca de 20 mil visualizações (entre no grupo do Aos Fatos na plataforma). Publicações semelhantes também foram compartilhadas dezenas de vezes no Facebook.
Evite todos os testes do mundo no nariz. Pode passar pela sibeneta e destruir a glândula pineal, com cobertura total. O acesso está sendo criado para bactérias, que pode então infectar o cérebro. Uma estimativa diz que um em 10.000 morreu devido a este teste. DIGA NÃO AOS TESTES!
Postagens enganam ao dizer que testes do tipo RT-PCR, que detectam Covid-19, podem destruir a glândula pineal e abrir um acesso para bactérias infectarem o cérebro. O exame atinge apenas a nasofaringe ou a garganta do paciente. A glândula pineal é responsável pela produção da melatonina, hormônio que ajuda a regular o sono, e fica localizada dentro do cérebro. Há membranas e uma estrutura óssea entre o cérebro e a nasofaringe, região alcançada pelo cotonete do teste de Covid-19. Conforme a SBPC/ML (Sociedade Brasileira de Patologia Clínica e Medicina Laboratorial), o swab, equipamento usado no exame, só conseguiria atingir o cérebro em caso de fratura ou má formação dessa estrutura óssea.
“O cérebro é separado da nasofaringe. Não tem fundamento você achar que está perfurando um osso toda vez que você for fazer esse exame”, explica o médico João Renato Rebello Pinho, membro titular da SBPC/ML. “Você teria que fazer com uma violência muito descabida, e a frequência de infecções seria muito grande. Você ia ter meningite, infecções cerebrais causadas por bactérias que estão presentes na nasofaringe.”
A imagem usada para ilustrar as publicações desinformativas não mostra um exame RT-PCR, mas uma cirurgia endoscópica para retirada de um tumor na hipófise, glândula responsável pela produção de diversos hormônios. Nesse caso, é preciso remover os ossos entre a cavidade nasal e o cérebro para a realização do procedimento.
A mensagem erra ainda ao localizar a glândula pineal na base do cérebro. Conforme explicou o neurologista do Hospital Sírio-Libanês José Renato Felix Bauab em checagem anterior, essa estrutura se encontra no centro do órgão.
Glândula pineal está localizada no centro do cérebro (Cancer Research UK/Wikicommons)
No livro “O Oráculo da Noite — A História e a Ciência do Sonho” (Cia. das Letras), o neurocientista Sidarta Ribeiro explica a relação entre a produção de melatonina e o sono. “A melatonina, hormônio indutor do sono produzido na primeira metade da noite pela glândula pineal humana, parece ter se originado há 700 milhões de anos, quando animais semelhantes a vermes marinhos evoluíram células capazes de captar luz e se movimentar com o batimento de cílios durante o dia, mas não de noite”, ele escreve. “O mecanismo dessa dicotomia teria sido a produção noturna de melatonina, que na ausência de luz estimula neurônios de modo a cancelar os movimentos dos cílios.”
Mais à frente, Ribeiro conclui: “Entre nós e os vermes, apesar da imensa distância evolutiva, se manteve a função ancestral de certos mecanismos moleculares, como o papel da melatonina na indução do sono.”
Sibeneta. Ao buscar pela palavra “sibeneta”, citada na peça desinformativa como uma estrutura que o swab poderia atravessar, Aos Fatos encontrou apenas uma palavra semelhante, na língua dinamarquesa: “sibenet”, que pode ser traduzida como “osso etmóide". Trata-se do osso poroso que faz parte do crânio e forma a cavidade nasal. Ele não possui uma passagem ou canal que permita ao cotonete atingir o cérebro.
Aos Fatos também não encontrou nenhum estudo ou reportagem em português ou inglês com o dado de que uma a cada 10 mil pessoas que realizaram o teste teriam morrido. Há relatos de uma criança na Arábia Saudita que morreu após o cotonete quebrar dentro de seu nariz e de uma mulher que teve o crânio perfurado durante o exame, mas sobreviveu. Nesse segundo caso, no entanto, a paciente tinha uma má formação na base do crânio.
O RT-PCR é considerado, pelo Ministério da Saúde, o padrão ouro na detecção do Sars-CoV-2 por apresentar alta taxa de sensibilidade e especificidade. O órgão recomenda que qualquer pessoa com síndrome gripal ou respiratória faça o teste para verificar a presença do novo coronavírus no organismo.
Em outra checagem, em julho de 2020, Aos Fatos já havia explicado que o teste para diagnosticar Covid-19 não representa risco de inflamação no cérebro. Essa peça de desinformação circulou inicialmente nas redes de língua espanhola e portuguesa em meados de 2021.
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