Não é verdade que nova norma da Receita Federal abre brecha para taxação do Pix

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Não é verdade que uma nova norma da Receita Federal abre brecha para a taxação das transações via Pix acima de R$ 2.000. A instrução normativa RFB 2.278/25, citada pelas peças de desinformação, apenas exige que operações financeiras a partir deste valor, feitas por pessoas físicas através de fintechs, sejam comunicadas ao órgão. Esta regra vale para instituições financeiras tradicionais desde 2015 e visa combater a sonegação e a lavagem de dinheiro.

O conteúdo enganoso acumulava ao menos 1.500 compartilhamentos no X e dezenas de curtidas no Facebook até a tarde desta sexta-feira (5).

Então aquela pirotecnia de fintech, crime organizado, vídeo do Nikolas e todo o balaio de gato era pra dupla Lula-Taxaad sugar até o último centavo do seu bolso? Transações bancárias a partir de R$ 2.000,00 deverão ser reportadas à Receita Federal'

A imagem é uma captura de tela de uma postagem no X. Na parte superior, há um texto que diz: ‘Então aquela pirotecnia de fintech, crime organizado, vídeo do Nikolas e todo o balaio de gato era pra dupla Lula-Taxaad sugar até o último centavo do seu bolso? Transações bancárias a partir de R$ 2.000,00 deverão ser reportadas à Receita Federal'. Abaixo, aparece o quadro de um vídeo. No centro do vídeo há uma mulher branca com cabelos tingidos em tons de loiro, com o rosto desfocado e vestindo uma blusa vermelha. Em cima dela, está escrito: 'Saiu a Instrução Normativa. Transações acima de 2.000,00 serão reportadas a RFB'. No canto inferior esquerdo do vídeo aparece a marca de tempo '1:53'. Na parte inferior da postagem, há ícones de interação da rede social mostrando 121 comentários, 1.200 compartilhamentos, 4.300 curtidas e 217.000 visualizações. No final, em letras maiúsculas, está escrito: 'LÁ VEM IMPOSTO NO PIX'.

Publicações nas redes enganam ao sugerir que o governo federal poderá taxar transações acima de R$ 2.000 feitas via Pix. A alegação deturpa a instrução normativa RFB 2.278/25, publicada em 28 de agosto, que não cria nenhum imposto ou taxa sobre o Pix, mas apenas amplia regras de transparência e fiscalização.

A medida equipara as contas de pagamentos, utilizadas em fintechs e instituições de pagamento, às contas bancárias tradicionais no sistema da Receita para fins de repasse de informações.

Com isso, operações financeiras acima de determinados valores passam a integrar a e-Financeira, base de dados usada pela Receita para monitorar grandes movimentações e que já era utilizada por bancos e corretoras integrantes do Sistema Financeiro Nacional desde 2015, como explica a advogada Leticia Passamani.

Em nota à imprensa, a Receita Federal comunicou que “fintechs têm sido utilizadas para lavagem de dinheiro nas principais operações do crime organizado, porque há um vácuo regulamentar” e que a nova instrução normativa possui apenas quatro artigos para simplificar a questão e evitar desinformação.

“Dessa forma, a Receita terá acesso a um quadro mais completo das operações financeiras, reduzindo brechas que poderiam ser exploradas para lavagem de dinheiro, fraudes ou sonegação”, explica Lea Vidigal, advogada especialista em direito econômico.

Segundo ela, a instrução normativa não cria novos tributos nem abre brecha para a chamada “taxação do Pix”:

“O que ela faz é obrigar fintechs e instituições de pagamento a informar à Receita Federal dados de movimentações financeiras acima de certos limites. Ou seja, trata-se de uma medida de transparência e fiscalização, não de tributação”, afirma.

O reforço trazido pela instrução normativa está na capacidade de cruzar dados e identificar movimentações incompatíveis com a renda declarada, o que otimiza o trabalho de fiscalização, mas não institui nenhuma tributação automática.

Para haver uma “taxação do Pix”, Vidigal explica que seria necessário a aprovação de uma nova lei pelo Congresso, já que a Receita Federal não pode criar tributos por instrução normativa.

A imagem mostra uma placa metálica da Receita Federal do Brasil. Na parte superior da placa está o brasão da República Federativa do Brasil, seguido do texto ‘MINISTÉRIO DA FAZENDA’. Abaixo, há o logotipo da Receita Federal em azul e o texto ‘Receita Federal’ também em azul. Mais abaixo, aparece a palavra ‘SUPERINTENDÊNCIA’. Atrás da placa, à direita, há um prédio alto de fachada envidraçada com estrutura metálica, e à esquerda, parte de uma árvore com folhagem verde. O céu está parcialmente nublado.
Norma publicada pela Receita Federal não institui taxação de transações via Pix (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

A medida foi publicada um dia após a deflagração de três grandes operações — Carbono Oculto, Quasar e Tank — conduzidas por Polícia Federal, MPF (Ministério Público Federal), MP-SP (Ministério Público de São Paulo), polícias estaduais e Receita Federal.

As investigações resultaram no bloqueio de cerca de R$ 3,2 bilhões e no cumprimento de 400 mandados judiciais, incluindo 14 de prisão.

Elas identificaram que organizações criminosas, como o PCC (Primeiro Comando da Capital), vinham utilizando fundos de investimentos e fintechs para lavar dinheiro de recursos ilícitos, aproveitando-se da dificuldade de rastreamento dessas operações.

Reciclagem de fakes. No início do ano, Aos Fatos desmentiu publicações alegando que o governo federal passaria a taxar transações Pix acima de R$ 5.000.

O boato alcançou grandes proporções e, como consequência, o governo cancelou a norma que obrigava instituições financeiras a informar movimentações acima de R$ 5.000 mensais à Receita Federal.

O caminho da apuração

Aos Fatos consultou a norma instrução normativa RFB 2.278/25 e conversou com especialistas para entender se há alguma previsão de taxação do Pix na medida. Também complementamos a checagem com reportagens da imprensa.

Referências

  1. Receita Federal (1, 2 e 3)
  2. Migalhas
  3. Aos Fatos
  4. O Globo

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