🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Maio de 2020. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

Não é possível afirmar que pacientes foram curados por cloroquina ou corticoides no Piauí

Por Priscila Pacheco

15 de maio de 2020, 12h30

Textos que circulam em redes sociais (veja aqui) distorcem fatos para afirmar que a cloroquina foi responsável por "esvaziar" a UTI do Hospital Regional Tibério Nunes, no Piauí. Por cinco dias em maio, a instituição de fato não registrou casos graves de Covid-19, mas os pacientes têm sido medicados com um coquetel experimental que também inclui outras drogas, como corticoides, segundo o diretor técnico do hospital, Justino Carvalho Jr.

O número de casos em que esse protocolo foi aplicado no Piauí também é pequeno e não permite tirar conclusões sobre seu uso – desde 2 de maio, quando começou a ser utilizado no hospital, foram apenas 20 pacientes, afirma Carvalho. Por fim, tanto a cloroquina quanto os corticoides ainda estão sendo estudados e não têm eficácia cientificamente comprovada contra o novo coronavírus, alerta o Ministério da Saúde.

Peças de desinformação com o conteúdo enganoso têm sido difundidas no Facebook, onde acumulavam ao menos 242.000 compartilhamentos nesta quinta-feira (14). Todas as publicações foram marcada com o selo DISTORCIDO na ferramenta de verificação disponibilizada pela rede social (saiba como funciona).


DISTORCIDO

Avanço: Hospital no Piauí cura pessoas da covid-19 e esvazia UTIs com uso de cloroquina

Não é possível afirmar que a UTI do Hospital Regional Tibério Nunes, em Floriano (PI), ficou vazia porque pacientes com Covid-19 estão sendo tratados com derivados de cloroquina. Infectados internados na instituição têm recebido um coquetel experimental de drogas que também inclui outros medicamentos, como corticoides, segundo o diretor da instituição.

Além disso, tanto o uso isolado da cloroquina quanto sua combinação com corticoides no tratamento da doença ainda estão sendo estudados e não há comprovação científica de sua eficácia. No caso do hospital piauiense, o novo protocolo foi adotado em 2 de maio e testado em apenas 20 pacientes.

Peças de desinformação sobre o assunto têm circulado desde que o médico oncologista Sabas Vieira publicou um vídeo em suas redes sociais no dia 9 de maio explicando como funciona o protocolo de tratamento adotado no hospital do Piauí. Segundo Vieira, é utilizada uma combinação de hidroxicloroquina e de metilprednisolona, um corticoide, dependendo da fase da doença em que o paciente está.

Manchetes de sites como a Carta Piauí distorcem o conteúdo do vídeo ao sugerir que apenas cloroquina teria sido apontada pelo médico como responsável pela recuperação de pacientes. O próprio oncologista apontou a distorção em um post em suas redes sociais.

O uso do medicamento, que é originalmente destinado a tratar malária, tem sido defendido pelo presidente Jair Bolsonaro e seus apoiadores. A droga é a mais testada do mundo contra a Covid-19, mas não tem eficácia comprovada. Segundo uma revisão de estudos publicada no dia 9 de maio pelo SAGE journals, os dados disponíveis até o momento ainda são insuficientes para atestar o efeito positivo do medicamento.

Sem conclusões. Embora seja considerado promissor pela equipe do hospital Tibério Nunes, o tratamento que combina hidroxicloroquina e metilprednisolona também não tem eficácia comprovada e está sendo adotado em caráter experimental, seguindo diretrizes do Ministério da Saúde para tratamento de Covid-19.

Uma revisão de estudos publicada na revista Nature encontrou indícios de que a metilprednisolona pode ser útil no combate à doença, mas concluiu que mais pesquisas são necessárias. Segundo os pesquisadores, a droga "está associada a melhores desfechos clínicos em pacientes graves de Covid-19", mas "estudos randomizados com grupo de controle são desesperadamente necessários para confirmar essas descobertas".

Mesmo sem evidências definitivas, no vídeo que viralizou Sabas Vieira atribui ao protocolo de tratamento o fato de que nenhum paciente da instituição foi para a UTI entre os dias 5 e 9 de maio. O diretor do hospital, Justino Moreira de Carvalho Jr., que falou por telefone com a reportagem, afirma que a combinação de hidroxicloroquina e metilprednisolona começou a ser receitada no dia 2 de maio e, desde então, foi aplicada a 20 pessoas. Ainda segundo Carvalho, nenhum dos pacientes que recebeu esse tratamento teve que ir para a UTI.

Dados da Secretaria de Saúde do Piauí mostram que os leitos UTI para Covid-19 no hospital voltaram a ter pacientes a partir do dia 10 de maio e que três internados morreram na quarta-feira (13). De acordo com o diretor, eles chegaram já em estado grave, foram encaminhados para a UTI e não receberam o tratamento com corticoides.

A equipe do Tibério Nunes teve um projeto de pesquisa sobre corticoterapia para Covid-19 aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFPI (Universidade Federal do Piauí) no dia 30 de abril (projeto número 4.001.294). O estudo ainda está em andamento.

Outro lado. A reportagem entrou em contato com a Carta Piauí. Um representante do portal afirmou que a notícia publicada pelo site se baseou no vídeo do oncologista Sabas Vieira e num documento assinado por médicos do Piauí que detalha o protocolo de tratamento com hidroxicloroquina, azitromicina e corticoides.

Referências:

1. Ministério da Saúde
2. SAGE journals
3. JAMA
4. MedRxiv
5. Folha de S. Paulo
6. Nature


Esta reportagem foi publicada de acordo com a metodologia anterior do Aos Fatos.

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