No debate desta segunda-feira (16) na CNN Brasil, o primeiro do segundo turno, os candidatos à Prefeitura de São Paulo Bruno Covas (PSDB) e Guilherme Boulos (PSOL) derraparam ao falar de temas como creches, população de rua e contas públicas.
O que checamos:
1. Bruno Covas não detém o recorde de criação de vagas em creches. Dados da prefeitura mostram que, durante o governo de Gilberto Kassab (PSD), foram abertas 104.377 vagas, 18.877 a mais do que as 85.500 que o atual prefeito afirma ter criado;
2. Não havia rombo de R$ 7 bilhões na prefeitura em 2017, como disse Covas. O TCM-SP (Tribunal de Contas do Município de São Paulo) concluiu que, em 2016, foram deixados R$ 5,3 bilhões em caixa e despesas financeiras de R$ 2,1 bilhões, um saldo de R$ 3 bilhões;
3. É verdade que o número de pessoas em situação de rua passou de 16 mil para 24 mil em São Paulo, como afirmou Covas. Os números batem com os dos censos da prefeitura de 2015 e 2019;
4. É fato, como afirmou o tucano, que foram fechadas 164.660 vagas de emprego formal em São Paulo entre março e junho, segundo o Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados);
5. Não é possível afirmar que o crescimento da população de rua em São Paulo ocorreu apenas nos governos Doria-Covas, como fez Guilherme Boulos, pois a variação entre os dois dados apurados nos censos municipais de 2015 e 2019 incluem também um período do governo Fernando Haddad (PT);
6. Boulos exagerou ao dizer que o Ministério Público de São Paulo determinou a criação de 8.000 vagas para abrigar moradores de rua durante a pandemia. O documento do órgão não tem poder para obrigar o município a isso, apenas recomendar. O número sugerido pelo MP não havia sido alcançado pela prefeitura até setembro deste ano;
7. O psolista acertou ao dizer que São Paulo tem R$ 130 bilhões a receber em dívidas de impostos, taxas e multas e que o município considera possível receber cerca de R$ 60 bilhões deste valor — a chamada dívida ativa. Também é fato que a gestão Doria-Covas recuperou cerca de R$ 5 bilhões da dívida ativa de 2017 até 16 de novembro deste ano.
8. É fato que a capital paulista registra hoje mais mortes por Covid-19 que a China ou a Coreia do Sul. Dados da OMS (Organização Mundial da Saúde) e da prefeitura atestam esta declaração de Guilherme Boulos no debate.
Bruno Covas (PSDB)
"É um recorde na cidade de São Paulo [a criação de 85 mil vagas em creches durante os quatro anos de gestão]"
A declaração de Covas foi classificada como FALSA, pois os números disponíveis nas bases de dados da prefeitura desde 2006 mostram que durante a gestão de Gilberto Kassab (PSD) foram criadas 104.377 vagas, 18.877 a mais do que as 85.500 que o atual prefeito afirma ter criado.
O número da gestão Kassab é resultado da subtração das vagas registradas em dezembro de 2012, fim do primeiro mandato do político, e dos registros de dezembro de 2008, quando ele foi reeleito. Já o dado do governo Covas consta do relatório do programa de metas atualizado dia 12 de novembro deste ano, e fala em “mais de 85.500 vagas”. Questionada por Aos Fatos, a prefeitura não respondeu qual seria o número exato.
“Achamos um rombo orçamentário de 2017 de R$ 7 bilhões, entre receitas que não seriam realizadas e despesas não previstas no orçamento."
A declaração de Covas foi considerada FALSA, pois o Relatório Anual de Fiscalização de 2016 publicado pelo TCM-SP (Tribunal de Contas do Município de São Paulo) aponta que em 2016 foi deixado no caixa da prefeitura um saldo de R$ 5,3 bilhões e despesas financeiras de curto prazo no valor de R$ 2,1 bilhões. Segundo o documento, “se todas essas obrigações fossem pagas, restaria um saldo da ordem de R$ 3 bilhões”.
Ainda de acordo com o TCM-SP, a prefeitura teve uma queda de 8% nas receitas e um aumento de 1,8% nas despesas em meio à recessão econômica de 2016. No entanto, a liberação de R$ 1,7 bilhão em depósitos judiciais não tributários e a renegociação de dívidas com a União reforçaram o caixa. Sem isso, a situação “teria ficado bastante comprometida”, segundo afirma o relatório, no tópico “Gestão Financeira”.
O candidato repete o discurso da gestão de João Doria (PSDB), de quem foi vice-prefeito. À época, o antecessor no cargo, Fernando Haddad (PT), argumentou que a acusação estava relacionada a uma frustração de receita, não a um rombo.
O economista André Luiz Marques, coordenador do Centro de Gestão e Políticas Públicas do Insper, explica que rombo e frustração de receita são variantes diferentes. “O rombo é como se já tivesse sido consumado: terminei o ano e tenho mais dívidas a pagar do que receitas. Por exemplo, tenho 100 no caixa, mas, nas contas a pagar, 120. Então, já estou devendo 20”, diz.
Já a frustração de receita seria quando uma projeção de orçamento não se realiza como prevista, seja por fatos que exigiram mais gastos ou que interferiram na arrecadação. Segundo o economista, uma frustração de receita pode gerar um rombo orçamentário no decorrer do tempo, mas não que o rombo já veio da gestão anterior.
“Nós tivemos um aumento de 16 mil para 24 mil moradores em situação de rua.”
De acordo com a versão mais recente do Censo da População em Situação de Rua elaborado pela Prefeitura de São Paulo, havia, em 2019, 24.344 pessoas morando nas ruas da cidade. O número representa um crescimento de 53% com relação ao registrado na última edição da pesquisa, em 2015, que documentou 15.905 pessoas em situação de rua. Isso torna a declaração do candidato VERDADEIRA.
É importante salientar, no entanto, que os números em 2020 podem ter crescido substancialmente por conta da pandemia de Covid-19. Relatos de instituições de amparo à população sem-teto em maio apontavam o aumento no número de pessoas que buscavam abrigos ou refeições. Em entrevista ao G1, uma tenda de serviço franciscano que oferece assistência à população em São Paulo relatou um aumento no número de refeições diárias servidas de 50 em março para 2.500 em maio.
“Só nos meses de março, abril, maio e junho, 175 mil pessoas perderam carteira assinada na cidade de São Paulo.”
De acordo com dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), foram fechadas 164.660 vagas de emprego formal em São Paulo entre os meses de março e junho. Como o número é apenas 9,5% menor do que o informado pelo prefeito, a declaração foi considerada VERDADEIRA. O pico do fechamento de postos de trabalho ocorreu em abril, quando o mercado formal perdeu 98.161 vagas.
Guilherme Boulos (PSOL)
"No seu governo e do Doria, a população em situação de rua na cidade de São Paulo aumentou 60%."
A declaração do candidato do PSOL é INSUSTENTÁVEL, segundo os dados públicos disponíveis. A alta no número de moradores de rua entre os censos municipais de 2015 e 2019 chega a 53% e não é possível saber se esse crescimento se deu só na gestão de João Doria e Bruno Covas, e não também na de Fernando Haddad (PT).
Os dados mais recentes sobre a população em situação de rua em São Paulo estão no censo realizado em 2019 pela prefeitura. O relatório final do censo, entregue em 29 de abril, diz que o estudo foi feito entre setembro de 2019 e abril de 2020, e identificou 24.344 pessoas em situação de rua na capital paulista.
A edição anterior do Censo da População em Situação de Rua foi publicada em outubro de 2015, ainda na gestão de Fernando Haddad, que governou a cidade até dezembro de 2016. O relatório final do censo de 2015 identificou 15.905 pessoas em situação de rua na cidade. Seus dados foram coletados entre fevereiro e março de 2015.
Com isso, é possível afirmar que, entre os censos de 2015 e 2019, houve um aumento de 53% na população em situação de rua em São Paulo. No entanto, os dados disponíveis não permitem dizer que esse aumento ocorreu exclusivamente na gestão Doria-Covas, já que há um período entre os dados que compreende o governo Haddad.
"Quem determinou que o Bruno Covas criasse 8 mil vagas [...]foi o Ministério Público do estado de São Paulo."
De fato, no dia 18 de maio, o Ministério Público de São Paulo emitiu uma recomendação para que a Prefeitura de São Paulo providenciasse vagas na rede hoteleira e em prédios ociosos para acolher a população em situação de rua por conta da pandemia. Porém, a fala é EXAGERADA, pois não houve determinação pelo cumprimento, apenas uma orientação.
Na representação, o MP sugere que Covas “elabore plano de contingência destinado à criação emergencial de pelo menos 8.000 vagas para acolhimento com refeições às pessoas em situação de rua ainda não inseridas na rede socioassistencial do Município”, com a ampliação de vagas na rede hoteleira, a utilização de prédios municipais ociosos, como escolas e centros esportivos e até a possível requisição administrativa de propriedades privadas, com posterior pagamento de indenização.
Assim, diferentemente do que sugere o candidato Guilherme Boulos, o documento do Ministério Público não tem o poder de impor ou determinar a criação de vagas, mas sim emitir recomendações a órgãos públicos que não têm caráter normativo.
Até a última atualização encontrada por Aos Fatos, em setembro, haviam sido abertas 200 vagas na rede hoteleira para população em situação de rua, segundo a prefeitura.
Procurada, a campanha de Boulos respondeu que, "apesar da diferença técnica, o sentido da fala permanece: Covas não acatou a recomendação do MP".
“Nós temos R$ 130 bilhões em dívida ativa. (...) A estimativa dos auditores fiscais da prefeitura é que aproximadamente R$ 60 bilhões desse total sejam executáveis. (...) A prefeitura, nos últimos quatro anos, com o Bruno e com o Doria, recuperou unicamente R$ 5 bilhões desse total.”
A declaração é VERDADEIRA, pois os dados citados por Boulos batem com os do TCM (Tribunal de Contas do Município) e da Prefeitura de São Paulo.
Segundo a página 111 do relatório de fiscalização do TCM relativo a 2019, a cidade de São Paulo fechou o ano passado com uma dívida ativa de R$ 130 bilhões. Esse valor corresponde ao que é devido à prefeitura em impostos, taxas e multas, entre outros.
O TCM diz no documento que a Prefeitura de São Paulo “passou a contabilizar em 2019 a dívida ativa de acordo com a expectativa de recebimento”, ou seja, o valor que pode ser recuperado. Este valor era de R$ 55,4 bilhões no fim do ano passado.
O valor total arrecadado pelo município na gestão Doria-Covas somava R$ 5,9 bilhões até esta segunda-feira (16), segundo números disponíveis nos balanços anuais da prefeitura e no Portal da Transparência da capital paulista. Os valores relativos a 2017, 2018 e 2019 foram corrigidos pelo IPCA usando a Calculadora do Cidadão, do Banco Central.
“A Coreia do Sul, ou mesmo a China, teve menos mortes por Covid que a cidade de São Paulo.”
A declaração de Guilherme Boulos é VERDADEIRA. Segundo boletim epidemiológico da Secretaria Municipal de São Paulo de 16 de novembro, a capital paulista possui 382.801 casos e teve 13.947 óbitos confirmados por Covid-19. Por outro lado, dados da OMS (Organização Mundial da Saúde) também do dia 16 de novembro mostram que a Coreia do Sul possui 28.769 casos e 494 óbitos confirmados por Covid-19 e a China conta com 92.452 casos e 4.749 mortes desde o começo da pandemia do novo coronavírus.
Aos Fatos entrou em contato com as assessorias de imprensa das campanhas de Bruno Covas e Guilherme Boulos para que pudessem comentar as checagens, mas somente a campanha do PSOL respondeu, após a publicação desta checagem.