Meta promete transparência, e ANPD libera uso de dados para treinar IA

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A ANPD (Autoridade Nacional de Proteção de Dados) autorizou nesta sexta-feira (30) que a Meta volte a usar dados de usuários do Facebook e do Instagram para treinar seus modelos de inteligência artificial generativa — mas desde que o usuário não se oponha.

O tratamento de dados de usuários brasileiros havia sido suspenso em 2 de julho, após a ANPD constatar indícios de descumprimento da LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados) pela big tech.

O fim da restrição ocorre após quase dois meses de negociações entre a autarquia e a plataforma, que se comprometeu a agir de forma mais transparente no tratamento de dados dos usuários brasileiros.

O compromisso assumido pela Meta prevê o envio de notificações a todos usuários do Facebook e do Instagram, por email e pelo próprio aplicativo, avisando de forma clara sobre o treinamento da IA e o direito do usuário de recusar o uso de seus dados.

As notificações deverão trazer links que levem diretamente à página na qual o usuário pode informar sua recusa — como a empresa havia feito para os usuários europeus, mas não para os brasileiros. “Agora o link vai parar na mão dele, ele não vai ter mais que procurar”, ressaltou o coordenador-geral de fiscalização da ANPD, Fabricio Lopes.

A dificuldade de encontrar nas redes da Meta o formulário de opt-out foi um dos motivos que levaram à suspensão do tratamento de dados em julho. Como o Aos Fatos mostrou, quem não quisesse ter suas informações coletadas precisava clicar em oito opções na configuração do Facebook e preencher um formulário para, só então, exercer seu direito.

Agora, além de enviar o link por notificação, a Meta também precisará simplificar o acesso a ele em sua Política de Privacidade. Também já não será necessário preencher um formulário, bastando clicar na opção de que não quer que seus dados sejam usados.

Quem possui contas vinculadas em mais de uma plataforma da empresa — no Facebook e no Instagram, por exemplo — só precisará informar a objeção uma vez.

O tratamento para treinamento de IA só será feito com informações públicas. Por regra, usuários que possuam perfis fechados no Instagram ou no Facebook não terão dados coletados – salvo exceções, como comentários feitos em postagens públicas.

Também ficou acordado que a Meta precisará disponibilizar um formulário para que pessoas que não possuam contas na plataforma, mas que possam ter dados seus disponibilizados nelas por terceiros, também informem que não querem que essas informações sejam coletadas. Nesse caso, porém, será necessário passar mais informações sobre as postagens que estariam afetando a privacidade do requerente.

O despacho que liberou a coleta de dados foi publicado nesta sexta (30) no Diário Oficial da União e, agora, a Meta tem cinco dias para atualizar o cronograma de implantação da medida.

Ficou acordado que o aviso aos usuários precisará ser feito pelo menos 30 dias antes do início efetivo da coleta dos dados. Os usuários, porém, poderão pedir a interrupção do uso de seus dados a qualquer momento.

Em comunicado enviado para divulgar a decisão da ANPD, a Meta disse estar “trabalhando arduamente para construir a próxima geração de recursos de IA em seus serviços, garantindo que isso seja feito de maneira segura, responsável e consciente, e que atenda às expectativas de privacidade das pessoas”.

Íntegra do comunicado da Meta

Em resposta às recomendações da Autoridade Nacional de Proteção de Dados, a Meta está oferecendo transparência adicional para ajudar os usuários do Facebook e do Instagram no Brasil a entenderem como a empresa treina os modelos que alimentam as suas experiências de Inteligência Artificial generativa, como:

- Nos próximos dias, a empresa mostrará notificações no Facebook e no Instagram e enviará e-mails para que os usuários no Brasil saibam como a Meta planeja expandir as suas experiências de IA.

- A Meta utilizará informações públicas de contas de usuários em suas plataformas para desenvolver e melhorar modelos de IA generativa para recursos e experiências de IA na Meta no Brasil.

- A empresa está atualizando a sua Política de Privacidade e o Aviso de Privacidade do Brasil para refletir essas mudanças e data em que entrarão em vigor, mas os usuários ainda poderão se opor a elas a qualquer tempo.

- As notificações e os e-mails incluirão links para o formulário de oposição, para que os usuários que desejarem possam exercer seu direito de se opor ao uso de suas informações públicas pela Meta, como postagens e comentários públicos, para o propósito de desenvolver e melhorar modelos generativos para a IA na Meta.

- A empresa colocar banners na Central de Privacidade da Meta, bem como na Política de Privacidade, para conscientizar os usuários que estão no Brasil sobre como tratamos os dados dos usuários e com links direcionando para o formulário de oposição.

A Meta está trabalhando arduamente para construir a próxima geração de recursos de IA em seus serviços, garantindo que isso seja feito de maneira segura, responsável e consciente, e que atenda às expectativas de privacidade das pessoas. O objetivo da empresa sempre foi que todos os usuários tenham o mesmo nível de experiência com o assistente de IA gratuito mais inteligente disponível hoje.

Salvaguardas

Para que a ANPD autorizasse a retomada do tratamento de dados pela Meta, a empresa teve de apresentar uma série de medidas prometendo garantir a segurança dos usuários.

“A gente não está dando uma carta branca, o que a gente está fazendo é se certificando que existam salvaguardas e proteções, sobretudo quando houver uso de dados pessoais sensíveis”, declarou a diretora da ANPD Miriam Wimmer, ao comentar a decisão.

Entre as salvaguardas está a desidentificação dos usuários — ou seja, os dados coletados não poderão ser vinculados a um perfil específico. A empresa também não poderá taggear dados pessoais considerados sensíveis pela legislação, como biometria e todos os que dizem respeito a religião, origem racial ou étnica, saúde e sexualidade, dentre outros.

A coleta de dados continuará suspensa para perfis de crianças e adolescentes, mas Wimmer ponderou que isso poderá ser revisto no futuro, após um aprofundamento da análise.

A diretora da ANPD afirma que o tratamento de dados de crianças e adolescentes é uma reivindicação das empresas, que argumentam que não poderão calibrar tecnologias para lidar com esse público se não tiverem acesso a esses dados.

A ANPD promete continuar acompanhando a implementação da IA da Meta, inclusive quando a tecnologia entrar em sua fase de testes, para verificar se os compromissos serão respeitados. Usuários que se depararem com informações pessoais sendo fornecidas pela IA também poderão fazer denúncias à ANPD e, caso se constate que a empresa descumpriu as medidas de proteção, ela está sujeita a sanções.

Concorrentes

Desde que suspendeu a coleta de dados da Meta, a ANPD ressaltou que o caso serviria de parâmetro para estabelecer uma política para lidar com outras empresas de tecnologia.

Na quinta-feira (29), a autarquia realizou sua primeira reunião com representantes da OpenAI, para que a empresa comece a fornecer informações sobre o tratamento dos dados usados para treinar suas tecnologias de IA generativa, incluindo o ChatGPT.

Como o Aos Fatos mostrou, no final de julho a ANPD também enviou um pedido de esclarecimento ao X (ex-Twitter) após a plataforma também iniciar o tratamento de dados para IA.

O pedido foi feito quando a empresa de Elon Musk ainda tinha representantes no Brasil e, segundo Wimmer, a plataforma chegou a enviar as informações solicitadas.

No último dia 17, porém, Musk anunciou que acabaria com a representação do X no Brasil e, nesta semana, disse que não cumpriria a determinação do STF (Supremo Tribunal Federal) para restabelecê-la, o que levou o ministro Alexandre de Moraes a determinar a suspensão da rede nesta sexta-feira (30).

O caminho da apuração

Aos Fatos recebeu, por email, avisos de pauta sobre o fim da suspensão da coleta de dados tanto da ANPD como da Meta.

A reportagem participou da entrevista coletiva concedida de forma virtual por autoridades da ANPD para tirar dúvidas sobre a medida.

Referências

  1. Aos Fatos (1, 2, 3 e 4)
  2. Meta
  3. Diário Oficial da União
  4. g1

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