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🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Março de 2022. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

Quais são os medicamentos aprovados para prevenir e tratar a Covid-19

Por Priscila Pacheco

18 de março de 2022, 11h25

Dois anos depois do início da pandemia e de uma corrida científica sem precedentes por vacinas e remédios, ainda persistem desinformações sobre o que realmente funciona contra a Covid-19. Algumas substâncias inicialmente aventadas como promissoras tiveram seu uso descartado após estudos, como a hidroxicloroquina, que, mesmo assim, segue propagandeada pelo presidente Jair Bolsonaro (PL).

Por outro lado, alguns medicamentos se mostraram úteis no combate à doença, tanto na fase inicial como em situações graves. Atualmente, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) autoriza seis remédios para tratar a Covid-19, como anticorpos monoclonais e corticoides.

Aos Fatos consultou estudos, órgãos de saúde e especialistas para explicar quais são essas substâncias e os avanços da ciência no enfrentamento da pandemia.

  1. O que pode prevenir a Covid-19
  2. O que pode ser usado na fase inicial da doença
  3. Quais remédios são usados em quadros graves
  4. O que está disponível no sistema público de saúde
  5. O que a ciência já descartou

1. O que pode prevenir a Covid-19

A principal maneira de prevenir a Covid-19 é por meio da vacinação. Há evidências científicas robustas, baseadas em testes e analisadas por autoridades sanitárias em diversos países, de que os imunizantes hoje em uso são seguros e eficazes para evitar a doença e o seu agravamento.

No Brasil, quatro vacinas foram autorizadas pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária): AstraZeneca, Janssen, Pfizer e CoronaVac. As duas últimas também são permitidas para adolescentes e crianças a partir de cinco anos. A aplicação a partir de seis meses de vida ainda é estudada.

A OMS (Organização Mundial da Saúde) alerta que, com o tempo, as farmacêuticas devem atualizar os imunizantes para que continuem eficazes contra novas formas do vírus. Desde o final de 2021, o surgimento de variantes e a redução progressiva da proteção tem levado à necessidade de doses de reforço. Em alguns locais, inclusive, tem sido aplicada mais de uma, como em Israel e nos Estados Unidos.

Medicamentos. Não há remédios disponíveis para venda em farmácias com eficácia comprovada para prevenir a Covid-19 — ou seja, evitar o contágio. Estudos robustos já descartaram, por exemplo, o uso da hidroxicloroquina contra a doença (leia mais abaixo). Da mesma forma, nenhum alimento ou vitamina se mostrou capaz de evitar a infecção pelo novo coronavírus.

No entanto, um tratamento com anticorpos monoclonais criados em laboratório mostrou eficácia de 83% para evitar a doença sintomática. No Brasil, evusheld, que tenta impedir que o vírus entre nas células humanas, já recebeu registro emergencial e temporário da Anvisa.

Ele não substitui a importância da vacina e é recomendado apenas para maiores de 12 anos que tenham o sistema imunológico debilitado em razão de outras doenças ou condições de saúde, ou que não possam ser vacinados devido a algum histórico de reação adversa grave. O tratamento só pode ser aplicado com prescrição médica e em unidades particulares de saúde – não está disponível no sistema público.

2. O que pode ser usado na fase inicial da doença

Três tratamentos com anticorpos monoclonais foram aprovados no Brasil para tratar a fase inicial da Covid-19, que compreende os primeiros dias de sintomas — o tempo exato varia de acordo com cada medicamento.

Todos eles são de aplicação intravenosa e nenhum é vendido em farmácias, uma vez que só são administrados em unidades de saúde. Além disso, eles são indicados prioritariamente para quem tem risco de progressão da doença, como imunossuprimidos ou pessoas com comorbidades.

Um deles é o coquetel composto por casirivimabe e imdevimabe, que, segundo estudos, pode reduzir em 70% as chances de hospitalização e mortes se administrado no início da Covid-19. Não há dados, porém, que atestem a sua eficácia contra a variante ômicron.

Já o sotrovimabe tem potencial contra a infecção causada pela variante e é recomendado pela OMS como uma alternativa ao coquetel. Pesquisas sobre o medicamento constataram que ele reduz em 79% as hospitalizações e mortes decorrentes da Covid-19.

Outro tratamento com anticorpos monoclonais autorizado no país é o regkirona (regdanvimabe), que pode reduzir em 72% o risco de progressão da doença, mas que não apresenta capacidade de neutralização da variante ômicron.

No exterior. Há também dois antivirais que ainda não foram aprovados para uso no Brasil, mas já tiveram eficácia comprovada em estudos clínicos e são administrados em países da União Europeia, Estados Unidos, Canadá, entre outros: o molnupiravir e o paxlovid. Como antivirais, eles agem para impedir a multiplicação do vírus nas células humanas.

O molnupiravir foi o primeiro remédio oral incluído nas diretrizes da OMS para tratar a Covid-19. Segundo os estudos, ele reduz em 30% o risco de hospitalização, mas a organização pondera que o uso precisa ser monitorado pelas autoridades nacionais de farmacovigilância, pois os dados de segurança ainda são poucos. Já o paxlovid, também de uso oral, mostrou eficácia de 87,8% para reduzir as chances de progressão da doença.

3. Quais remédios são usados em quadros graves

A Covid-19 se torna grave quando o novo coronavírus se espalha pelos tecidos e causa inflamações em vários órgãos do corpo. Para esses casos, quando o tratamento já envolve internação, três remédios demonstraram resultados positivos e estão autorizados para uso no Brasil. Todos eles precisam de prescrição médica e são administrados apenas em ambiente hospitalar.

O baricitinibe, indicado para tratar artrite reumatóide e dermatite, mostrou potencial para diminuir as inflamações decorrentes da Covid-19, desde que usado em conjunto com corticoides (substâncias sintéticas que simulam a ação do hormônio cortisol em processos inflamatórios), conforme orientação da OMS.

O remdesivir, antiviral previamente usado para tratar o ebola, teve efeitos positivos em pacientes com Covid-19 internados, o que foi demonstrado em dois estudos publicados em dezembro de 2021. A OMS, no entanto, não recomenda o seu uso contra a doença, porque outras pesquisas demonstraram pouco ou nenhum efeito em pacientes hospitalizados. No Brasil, esse uso está liberado.

Outro remédio usado no país para Covid-19 aguda, e que já era indicado para casos de inflamação, inclusive dos pulmões, é a dexametasona. Segundo um estudo produzido e publicado há um ano pelo Recovery, iniciativa liderada pela Universidade de Oxford com foco na pesquisa de medicamentos contra a doença, o remédio reduziu a mortalidade em até um terço dos hospitalizados com complicações.

4. O que está disponível no sistema público de saúde

Um medicamento apresentar resultado promissor em pesquisas e ter sido aprovado pela Anvisa não significa que a população terá acesso a ele no sistema público de saúde. Após a autorização da agência, a Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde) avalia fatores como evidências científicas, custos e logística de distribuição para definir se ele será fornecido pelo SUS (Sistema Único de Saúde).

Dos remédios citados nesta reportagem, apenas a dexametasona integra a lista de medicamentos fornecidos pelo SUS. O coquetel de casirivimabe e imdevimabe foi avaliado pela Conitec duas vezes em 2021, mas não entrou no sistema.

Segundo o órgão, o tratamento reduz o risco de hospitalização e a duração dos sintomas, mas ainda faltam informações sobre segurança e eficácia em pessoas já vacinadas. A Conitec também argumenta que a implementação do tratamento apresenta desafios logísticos, já que ele deve ser realizado em unidades de saúde.

A instituição também não liberou o fornecimento gratuito do remdesivir com o argumento de que a confiança na eficácia do antiviral é baixa e que o impacto orçamentário estimado é elevado.

O baricitinibe teve parecer favorável para ser integrado no SUS, mas ainda está em fase de consulta pública e precisa de aprovação do Ministério da Saúde. O evusheld, a regkirona e o sotrovimabe ainda não tiveram a análise iniciada. Aos Fatos entrou em contato com o Ministério da Saúde para obter mais informações sobre a inclusão dos medicamentos na rede pública, mas não obteve retorno.

5. O que a ciência já descartou

Alguns medicamentos não receberam respaldo da comunidade científica para prevenir ou tratar a Covid-19. Estão entre eles cloroquina, azitromicina, doxiciclina e plasma convalescente.

Citada como eficaz em uma nota técnica de janeiro deste ano do Ministério da Saúde e presente em um documento de manuseio de medicamentos da pasta, a cloroquina foi protagonista de diversos estudos clínicos, mas teve sua eficácia contra a doença descartada.

Em fevereiro de 2021, uma metanálise (análise de resultados de pesquisas) publicada pela Cochrane, entidade especializada em revisões, concluiu que cloroquina e hidroxicloroquina não são eficazes para diminuir o risco de morte ou a progressão para ventilação mecânica.

Nos meses seguintes, a OMS e a revista científica Nature também publicaram revisões que descartaram as duas substâncias como seguras e promissoras para prevenir ou tratar a Covid-19. Em 2020, pesquisa do projeto Recovery já havia sinalizado que o uso da hidroxicloroquina não havia apresentado resultados em pacientes hospitalizados.

A azitromicina e a doxiclina, antibióticos para tratar pneumonia bacteriana, não demonstraram utilidade no tratamento da Covid-19, seja quando usadas isoladas ou combinadas com hidroxicloroquina. O Principle, projeto também liderado pela Universidade de Oxford voltado para tratamentos que possam ser feitos em casa, concluiu que os antibióticos são ineficazes.

Por fim, o uso de plasma convalescente, que consiste na transfusão da parte do sangue de uma pessoa que já teve Covid-19 e tem anticorpos para outra, também foi descartado. No final de 2021, a OMS afirmou que o tratamento não aumentava as chances de sobrevivência. Antes, um estudo do Recovery e uma metanálise da Cochrane já haviam ressaltado a falta de utilidade da transfusão.

Ivermectina. Propagado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) como um medicamento eficaz para prevenir e tratar a Covid-19, o antiparasitário ivermectina ainda não tem resultados suficientes para validar ou descartar seu uso. Um documento publicado em janeiro de 2022 pela OPAS (Organização Pan-Americana da Saúde) destacou a necessidade de mais pesquisas.

Um artigo publicado pela Nature em dezembro concluiu que, embora atividades antivirais da ivermectina tenham sido relatadas em estudos pré-clínicos desde 2008, ainda não está claro se alguma dessas ações observadas é capaz de prevenir ou tratar a Covid-19. Metanálise publicada em julho pela Cochrane também havia dito que as conclusões existentes não sustentavam a eficácia e a segurança do antiparasitário.

Atualmente, 51 ensaios clínicos estão em andamento para avaliar se a ivermectina pode ser usada no tratamento da Covid-19. Universidades como Oxford, Duke e Minnesota ainda pesquisam o seu potencial.

Aos Fatos entrou em contato com o Ministério da Saúde para verificar quais medicamentos estão no protocolo atual de tratamento contra a doença, mas não obteve retorno.

Referências:

1. Aos Fatos (Fontes 1, 2 e 3)
2. Anvisa (Fontes 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15 e 16)
3. Imperial College
4. Fiocruz (Fontes 1 e 2)
5. FDA (Fontes 1, 2 e 3)
6. Pfizer (Fontes 1 e 2)
7. ONU (Fontes 1 e 2)
8. G1
9. Folha de S. Paulo (Fontes 1 e 2)
10. AstraZeneca
11. OMS (Fontes 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7)
12. GSK
13. EMA
14. NEJM (Fontes 1, 2, 3, 4 e 5)
15. Revista Galileu
16. MSD Manuals
17. CNN Brasil
18. Recovery (Fontes 1, 2 e 3)
19. Conitec (Fontes 1, 2, 3, 4 e 5)
20. UOL
21. Ministério da Saúde
22. Cochrane (Fontes 1, 2 e 3)
23. BMJ
24. Nature (Fontes 1 e 2)
25. The Lancet (Fontes 1 e 2)
26. NIH
27. Principle (Fontes 1 e 2)
28. OPAS
29. Clinical Trials
30. Activ-6 study
31. Covid out

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