A declaração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que no último domingo (18) comparou a guerra perpetrada por Israel na Faixa de Gaza ao Holocausto, gerou reações negativas da oposição no Congresso, de organizações judaicas e de líderes de outras religiões. Em resposta, petistas buscaram justificar a fala do presidente, exibindo imagens de crianças palestinas assassinadas. O Itamaraty não se pronunciou.
“O que está acontecendo na Faixa de Gaza e com o povo palestino não existe em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu: quando Hitler resolveu matar os judeus”, afirmou Lula em entrevista na Etiópia.
No âmbito diplomático, a fala levou o governo de Israel a convocar o embaixador brasileiro no país, que se encontrou com o chanceler israelense no Museu do Holocausto, em Jerusalém, para receber uma reprimenda pública. No evento, Lula foi declarado persona non grata por Israel.
Nesta segunda-feira (19), o governo brasileiro chamou de volta seu embaixador em Tel Aviv, e o presidente se reuniu com o assessor especial para assuntos internacionais da Presidência, o ex-chanceler Celso Amorim. O atual chanceler brasileiro, Mauro Vieira, não se pronunciou, bem como o Itamaraty, que não divulgou nota oficial.
O Hamas elogiou o posicionamento de Lula por meio de mensagem no canal oficial no Telegram. De acordo com o grupo, “a declaração surge no contexto de uma descrição precisa daquilo a que o nosso povo está exposto”.
CONGRESSO NACIONAL
Em resposta às críticas do governo israelense e de entidades judaicas, como a Conib (Confederação Israelita do Brasil) e o Museu do Holocausto, a base do governo se organizou nas redes para endossar a afirmaçãodo presidente e publicar imagens que reforçavam seu ponto de vista sobre o confronto no Oriente Médio:
- De acordo com a deputada federal Gleisi Hoffmann (PT-PR), “as palavras do presidente Lula sobre o extermínio da população de Gaza foram claramente dirigidas ao governo de extrema-direita de Israel, e não aos judeus, ao povo israelense, como tenta manipular Netanyahu”;
- O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), publicou um vídeo de crianças palestinas mortas para defender que a ação de Israel carateriza um genocídio.
Oposicionistas se valeram da fala para criticar Lula:
- A deputada Carla Zambelli (PL-SP), por exemplo, anunciou que está colhendo assinaturas para protocolar um pedido de impeachment contra o presidente por conta da declaração;
- Entre os políticos que já assinaram o pedido estão alguns que compararam a prisão de bolsonaristas durante os atos golpistas do 8 de Janeiro com a atuação nazista nos campos de concentração, como os deputados Bia Kicis (PL-DF) e Gustavo Gayer (PL-GO);
- Integrantes da Frente Parlamentar Evangélica no Congresso, a senadora Damares Alves (Republicanos-DF) e o deputado Marco Feliciano (PL-SP) também condenaram as declarações. “O Hamas quer a destruição do Estado de Israel e de todos os judeus. E pelo jeito é este tipo de gente que o Partido das Trevas quer como aliado”, afirmou Damares, que defendeu o impeachment do presidente.
O grupo parlamentar Brasil-Israel, presidido pelo senador Carlos Viana (Podemos-MG), classificou as falas de Lula como “tendenciosas e desonestas” em nota. “Declarações inconsequentes como esta, e outras nos últimos dias, mostram o desconhecimento histórico e a falta de equilíbrio para presidir o nosso país, reconhecido historicamente como uma nação negociadora da paz.”
Também integram o grupo parlamentares governistas, como o senador Jaques Wagner (PT-BA), que não se posicionou sobre o caso.
ORGANIZAÇÕES E LÍDERES RELIGIOSOS
As declarações de Lula motivaram diversas notas de repúdio entre comunidades judaicas brasileiras:
- A Conib afirmou em comunicado que não há paralelo entre o massacre de judeus pelo nazismo e a ação “de um grupo terrorista que invadiu o país” e que “essa distorção perversa da realidade ofende a memória das vítimas do Holocausto e de seus descendentes”;
- Já o Instituto Brasil-Israel afirmou que a fala de Lula “acaba por fomentar o antissemitismo”, o ódio contra judeus. “A comparação da tragédia em Gaza com o Holocausto nazista, feita por Lula neste domingo (18), é um erro grosseiro que inflama tensões, e mina a credibilidade do governo brasileiro como um interlocutor pela paz”, publicou a organização no X;
- Por fim, o Museu do Holocausto alegou que a comparação do presidente vulgariza e banaliza o Holocausto, alimenta o antissemitismo e usa uma “seletividade cruel” ao comparar os judeus a seus algozes.
Representantes do meio evangélico também se pronunciaram sobre o caso. Em vídeo publicado nas redes, o pastor Silas Malafaia chamou Lula de mentiroso e chegou a negar a morte de mais de 20 mil palestinos no conflito iniciado em outubro do ano passado. Embora os números de mortos e feridos no conflito sejam fornecidos por autoridades de saúde de Gaza, controladas pelo Hamas, eles foram replicados pela ONU.