🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Julho de 2020. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

Ivermectina, azitromicina e acetilcisteína não têm eficácia comprovada contra a Covid-19

Por Priscila Pacheco

8 de julho de 2020, 19h01

São enganosas postagens que circulam nas redes sociais estimulando a automedicação com azitromicina, ivermectina e acetilcisteína para tratar a Covid-19 (veja aqui). Nenhuma dessas substâncias tem eficácia comprovada cientificamente contra a doença e o uso inadequado pode causar danos à saúde, segundo especialistas e autoridades sanitárias.

Esta peça de desinformação acumulava ao menos 13.500 compartilhamentos nesta terça-feira (7) em postagens no Facebook que foram marcadas com o selo FALSO na ferramenta de verificação da rede social (saiba como funciona).


FALSO

Publicações que circulam nas redes sociais indicam a automedicação com os remédios azitromicina, ivermectina e acetilcisteína para combater a Covid-19. No entanto, além de autoridades de saúde e especialistas consultados pelo Aos Fatos afirmarem que não há evidências que essas drogas funcionem contra a infecção, sejam eles administrados juntas ou separadas, a automedicação pode trazer riscos à saúde.

Segundo a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), o fato de determinado remédio não exigir receita não significa que ele seja isento de orientação. "Como qualquer outro medicamento, eles apresentam riscos à saúde e podem ocasionar danos se utilizados de forma incorreta”, diz o órgão no 9ª boletim de farmacovigilância publicado em março.

Em artigo no site do HC (Hospital das Clínicas) de São Paulo, Jessé Eduardo Bispo, coordenador do Curso Técnico em Farmácia da unidade, comenta que medicamentos podem causar efeitos colaterais, e, em doses excessivas ou sem orientação adequada, prejudicar o tratamento e induzir a complicações irreversíveis. Nem mesmo remédios para tosse isentos de prescrição, como a acetilcisteína, são totalmente inofensivos.

Acetilcisteína. De acordo com a sua bula, o remédio é indicado para auxiliar na eliminação do muco em casos de tosse e catarro. A droga aparece com essa função mucolítica na lista da OMS de medicamentos usados em tratamentos experimentais para o novo coronavírus. Ou seja, ela tem sido usada apenas para aliviar um possível sintoma da infecção, não como cura para a Covid-19. Apesar de poucos efeitos adversos, a acetilcisteína pode causar incômodos gastrointestinais.

No informe diário de evidências publicado pelo Ministério da Saúde no dia 9 de junho, a substância é citada em uma avaliação feita na Grécia e no Chipre que afirma que seu uso combinado com remdesivir ou N4-hidroxicitidina, colchicina e óxido nítrico poderia inibir a replicação de vírus como o da MERS (Síndrome Respiratória do Oriente Médio) e o da SARS (Síndrome Respiratória Aguda Grave). Não foram feitos, porém, testes com o novo coronavírus nessa pesquisa. Também não há ainda resultados de outros estudos feitos sobre a atuação da substância contra o vírus causador da Covid-19.

Azitromicina. Como é um antibiótico, a azitromicina atua contra bactérias, não contra vírus, como é o caso do Sars-CoV-2. No entanto, conforme já checado pelo Aos Fatos, ela tem sido usada em pacientes com Covid-19 que também desenvolvem infecções bacterianas. Como explica o infectologista Gerson Salvador, além da pneumonia viral, pneumonias bacterianas eventualmente podem surgir em casos graves de Covid-19, o que justificaria a aplicação do antibiótico.

O uso da substância associada ao difosfato de cloroquina ou sulfato de hidroxicloroquina é recomendado pelo Ministério da Saúde para tratar pacientes com Covid19, mas também sob recomendação médica. Além disso, a própria pasta cita em seus boletins diários de evidências científicas que ainda não há estudos contundentes que confirmem que a combinação seja eficaz para o tratamento da infecção pelo novo coronavírus.

Por fim, o consumo excessivo de antibióticos é nocivo à saúde e pode fazer com que as bactérias criem resistência à substância. De acordo com a infectologista e professora da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) Raquel Silveira Bello Stucchi, a utilização indiscriminada "pode levar à resistência bacteriana e ser uma medicação que não possa mais ser usada para tratamentos daquele paciente”.

Ivermectina. Recorrentemente citada em peças de desinformação como uma droga eficaz contra a Covid-19, a ivermectina não faz sequer parte da relação do Ministério da Saúde de substâncias permitidas para uso em pacientes com Covid-19. No Brasil, a droga é liberada para humanos e animais para tratar verminoses e infestação de ácaros e insetos, como o piolho.

O medicamento também não foi incluído nos estudos co-patrocinados para tratamentos de Covid-19, o Solidarity Trial (Estudo de Solidariedade), mantido pela OMS. Segundo a entidade, os resultados laboratoriais até agora mostraram que, para reduzir eficazmente a carga viral do Sars-CoV-2 em células in vitro, a dosagem de ivermectina foi muito maior que recomendada hoje para tratar doenças parasitárias em humanos.

Há um estudo liderado pelo Instituto de Biomedicina da Universidade de Monash, na Austrália, que verificou que, em até 48 horas, as células que receberam ivermectina em laboratório tiveram uma redução de 99,8% do RNA viral, material genético responsável pela replicação do vírus. Entretanto, ainda não foram realizados testes em humanos e os pesquisadores pedem para que as pessoas não se automediquem.

A ivermectina possui poucos efeitos colaterais, mas não é indicada para pacientes com meningite ou outras doenças que atingem o sistema nervoso. Segundo Stucchi, pessoas que fazem uso de calmantes e ansiolíticos precisam ter cautela, pois a ivermectina pode aumentar a ação desses medicamentos.

“A pessoa pode correr risco se estiver dirigindo, por exemplo, porque pode ficar mais sonolenta pela interação das duas medicações”, explica.

O Aos Fatos checou outra peça de desinformação que recomenda a automedicação de azitromicina e ivermectina.

Referências:

1. Aos Fatos
2. Anvisa
3. Hospital das Clínicas
4. Consultas Remédios (Fontes 1 e 2)
5. OMS (Fontes 1, 2, 3 e 4)
6. Ministério da Saúde (Fontes 1, 2, 3, 4 e 5)
7. Universidade de Monash (Fontes 1 e 2)
8. Revista Elsevier
9. Portal Dráuzio Varella (Fontes 1 e 2)
10. UOL


Matéria alterada no dia 13 de julho às 13h49. Diferentemente do que afirmava a checagem, a ivermectina nunca foi incluída no Solidarity Trial (Estudo de Solidariedade) conduzido pela OMS. Essa correção não altera o selo da checagem.


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Esta reportagem foi publicada de acordo com a metodologia anterior do Aos Fatos.

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