Ao longo da última semana, as redes foram inundadas de ilustrações de bichinhos geradas por IA. “Veja que gatinhos fofos!”, diziam as legendas. Um olhar atento, no entanto, desvendaria que se tratavam de fotos artificiais — os olhos desalinhados e as patas faltantes são alguns detalhes que entregam a farsa.
Mas a brincadeira, nesse caso, não era instigar os usuários a compartilharem gatos falsos.
Gatinhos. Imagem que esconde expressão de cunho sexual foi compartilhada milhares de vezes e teve 60 milhões de visualizações no X (Reprodução)
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Essas imagens foram geradas sobre textos com mensagens de cunho sexual: ao apertar os olhos ou observar a foto acima, de uma certa distância, por exemplo, é possível enxergar claramente as letras que formam a expressão “gay sex”.
Daí em diante, virou terra de ninguém. Dezenas de imagens diferentes de gatinhos e outros cenários geradas por IA passaram a esconder mensagens “secretas”. No Brasil, sobrou até para o cantor Jão.
Mais recentemente, porém, a geração digital de imagens não foi usada apenas para fins humorísticos.
Zelenski. Uma desinformação recente que circulou principalmente no X (ex-Twitter) e no TikTok foi um vídeo que supostamente mostraria o presidente ucraniano realizando uma apresentação de dança do ventre (veja abaixo). Algumas publicações, inclusive, diziam que o show teria ocorrido durante a Assembleia Geral da ONU.
'Dança de bilhões'. Vídeo editado foi compartilhado para zombar do presidente ucraniano (Reprodução/TikTok)
O vídeo, no entanto, é fruto de edição. O registro original mostra o dançarino argentino Pablo Acosta em uma apresentação publicada por ele próprio no Instagram, em junho.
A montagem foi compartilhada por usuários para questionar a seriedade de Zelenski e deslegitimar sua tentativa de conseguir US$ 24 bilhões em ajuda militar e humanitária do governo dos Estados Unidos.
Camisinha. Outra publicação muito compartilhada nas redes foi uma imagem do Obelisco de Buenos Aires vestido com uma camisinha gigantesca, para divulgar a nova e última temporada da série Sex Education, da Netflix (veja abaixo). A imagem foi originalmente publicada no perfil da própria empresa no Instagram.
Camisa de Vênus. Foto e vídeo da camisinha no Obelisco foi compartilhada pelo perfil oficial da Netflix na Argentina (Reprodução/X)
Enquanto algumas pessoas elogiaram a jogada de marketing, houve quem criticou a propaganda por banalizar o mais importante monumento argentino, culpando, inclusive, a “geração woke” — expressão pejorativa usada principalmente nos Estados Unidos para definir pessoas que defendem políticas progressistas.
O fato, no entanto, é que não houve camisinha gigante nenhuma. As imagens que circularam nas redes foram feitas pela Vertex CGI, uma empresa de efeitos especiais, a pedido da Netflix.
Vale ressaltar, no entanto, que o Obelisco argentino já usou um preservativo. Em 2005, a Secretaria de Saúde do governo da capital colocou uma camisinha rosa no monumento para realizar uma campanha de conscientização no Dia Internacional contra o HIV.
Eles estão entre nós. Também receberam milhões de visualizações no Instagram e no TikTok vídeos e fotos de robôs no meio da plateia de um jogo de futebol americano ocorrido no dia 15 de setembro.
'Substituídos.' Imagens dos robôs no jogo de futebol circularam com legendas que sugeriam que humanidade estaria perdendo seu espaço (Reprodução/TikTok)
As imagens foram compartilhadas junto de textos e mensagens que beiram a conspiração, tanto em termos tecnológicos — “estamos sendo substituídos” — quanto religiosos — “o fim está próximo, procure a salvação”.
Alguns usuários nas redes até chegaram a afirmar que o vídeo teria sido produzido por ferramentas de IA, mas o pior é que são reais: trata-se de atores fantasiados de robôs contratados para divulgar o filme “The Creator” (“Resistência”, no Brasil). O uniforme dos falsos androides, inclusive, possui o nome da produção.
A camisinha no Obelisco e os robôs no jogo de futebol têm objetivo claro: chamar a atenção para os produtos de entretenimento ao qual faziam alusão. É possível até mesmo que, originalmente, a montagem com o rosto de Zelenski fosse uma brincadeira sem motivação política.
A capacidade de descontextualização das redes, no entanto, é clara: conforme já apontado pelo Aos Fatos, não importa se um vídeo gerado por IA ou por edição digital foi feito para fins de entretenimento ou propaganda. Se a origem e o objetivo não estiverem muito evidentes, usuários mal intencionados podem usá-los para desinformar.