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🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Setembro de 2022. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

Gettr e Rumble mantêm Terça Livre, Monark e exaltação a golpe em evidência durante eleições

Por Luiz Fernando Menezes e Tai Nalon

26 de setembro de 2022, 11h03

Aplicativos de mensagens têm facilitado o compartilhamento de conteúdo mentiroso vindo de plataformas sem moderação de conteúdo, com ataques às urnas eletrônicas, a ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) e ao processo eleitoral como um todo.

Monitoramento do Radar Aos Fatos em 578 comunidades de Telegram e em 285 grupos de WhatsApp durante o primeiro mês de campanha revela que as redes sociais Gettr e Rumble, populares entre ativistas de extrema-direita, são centrais para a disseminação de ideias que não só colocam sob desconfiança as eleições deste ano, como também incentivam golpe de Estado para que o “comunismo” não retorne ao país.

Principal porta-voz dessa ofensiva, o influenciador Allan dos Santos é figura recorrente nos grupos públicos e canais de Telegram monitorados pelo Radar Aos Fatos. Banido de YouTube, Twitter e Twitch, além de serviços como PayPal e Wix, ele é foragido da Justiça brasileira nos Estados Unidos e mantém um perfil na Gettr com 195 mil seguidores. Cinco das 10 publicações dessa plataforma que mais circularam no Telegram são do canal dele, com ao menos 84 compartilhamentos no aplicativo e mais de 16.600 visualizações na plataforma.

Os vídeos de Santos mais compartilhados entre 16 de agosto e 16 de setembro listam mentiras como a de que as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) integram o Foro de São Paulo, organização composta por grupos de esquerda da América Latina — incluindo o PT — e que teria o objetivo de, segundo Santos, “transformar todo o continente em uma União Soviética 2.0”. Ele afirma que a vitória do candidato petista Luiz Inácio Lula da Silva facilitaria essa agenda.

O canal também disseminou o falso argumento de que a suspensão dos decretos de Bolsonaro que flexibilizam a compra e o porte de armas seria uma maneira de “facilitar” invasões de terra em um eventual governo Lula. Mas o texto que permite a posse estendida à área rural é a lei nº 13.870/2019, que não foi atingida pelas decisões do ministro do STF Edson Fachin. Essa versão da teoria conspiratória ainda flerta com a falsa alegação de que Fachin teria alguma ligação com o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra).

Além de compartilhar desinformação, Santos ataca rotineiramente os ministros do STF, que chama de “um bando de lixo tentando enterrar a democracia”. O foco é o presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Alexandre de Moraes, que ele apelida de “cabeça de ovo” e “cabeça de piroca”. O ministro é relator do inquérito das milícias digitais e foi responsável pela ordem de prisão de Santos, em outubro de 2021. O influenciador é acusado de integrar uma organização criminosa que incita instabilidade no país por meio de incentivos oferecidos ao site Terça Livre, que encerrou as atividades no mês em que Santos foi preso e de que ele era responsável. Desde então, Allan dos Santos insiste em retomar a publicação e continua a produzir conteúdos nas redes sociais que ainda o admitem.

Outro canal que veicula informações enganosas sobre o processo eleitoral é o Monark Talks, no Rumble, plataforma em que o influenciador Bruno Monteiro Aiub, conhecido como Monark, convida pessoas para entrevistas e responde perguntas de ouvintes. Em uma das edições mais compartilhadas nos grupos de WhatsApp monitorados, o apresentador lançou dúvidas em relação às urnas eletrônicas, disse que os equipamentos sem a impressão do voto só seriam utilizados no Brasil — o que não é verdade — e sugeriu que o TSE poderia instalar qualquer software após a lacração oficial — o que é impedido por meio das assinaturas digitais, inclusive a do procurador-geral da República, Augusto Aras, indicado por Bolsonaro.

No Rumble, também se destacam vídeos com teor golpista. Dentre as publicações mais compartilhadas desta plataforma nas comunidades de Telegram há gravações que pedem para que o presidente Bolsonaro determine uma intervenção militar e faça uma faxina no STF para “salvar o Brasil do comunismo e globalismo”. A rede também mantém no ar outras publicações que argumentam que o STM (Superior Tribunal Militar) deveria julgar “todos os bandidos do Legislativo e Judiciário”.

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COVID-19

Desinformação sobre Covid-19 também aparece entre os conteúdos mais compartilhados no Rumble. Em uma das edições do Monark Talks, por exemplo, o apresentador afirmou que a vacina “não imuniza” porque “você toma a vacina e você pega a porra da Covid”. A fala ignora que há estudos que comprovam que os imunizantes diminuem as chances de contágio, a gravidade dos casos e previnem a transmissão da doença.

Dentre os vídeos com maior número de compartilhamentos, também há um em que o ator e candidato a deputado federal Felipe Folgosi (PL-SP) sugere que as vacinas da Pfizer teriam causado abortos e “estariam atacando o sistema reprodutor tanto do homem quanto da mulher porque o objetivo é reduzir a população”. Nada disso é comprovado cientificamente. Na gravação, ele ainda desinforma sobre a varíola dos macacos, dizendo que seria uma doença exclusiva de homossexuais e transmitida apenas pelo sexo anal.

POR QUE FUNCIONA

Gettr e Rumble funcionam como uma alternativa a redes sociais com regras de comunidade e políticas de moderação públicas. Sua popularidade é consequência de ações mais rígidas de plataformas como Twitter, Facebook e Instagram contra desinformação e discursos extremistas. Por isso, a circulação de informações nesses ambientes fica restrita a usuários com interesses específicos, que formam grupos menores em torno de tópicos que, em outras redes, estariam sujeitos a advertências e punições.

Em setembro de 2021, o ministro do TSE Luis Felipe Salomão determinou a suspensão da monetização de 23 perfis bolsonaristas na Gettr, dentre eles o de Allan dos Santos. As contas atingidas pela decisão eram controladas por acusados de participar de um esquema criminoso de difusão de informações falsas contra instituições democráticas. Na ocasião, o ministro também ordenou que a plataforma deveria interromper o uso de algoritmos para indicar canais e vídeos de conteúdo político relacionado aos ataques ao sistema de votação e à legitimidade das eleições.

Essa decisão veio depois da visita do CEO da Gettr, Jason Miller, ao Brasil, para um evento ligado ao deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) no ano passado. Identificado com o bolsonarismo, Miller foi porta-voz do ex-presidente dos EUA Donald Trump e compareceu ao ato pelo bicentenário da independência do Brasil convocado por Jair Bolsonaro no Rio de Janeiro.

Para as eleições de 2022, nem Gettr nem Rumble integram o Programa de Enfrentamento à Desinformação, grupo de parceiros por meio do qual o TSE estabelece canais de comunicação com redes e aplicativos a fim de encaminhar denúncias de conteúdos fraudulentos. Em nota, o tribunal explica que o Sistema de Alerta de Desinformação contra as Eleições serve para que plataformas parceiras avaliem medidas de moderação a serem adotadas com base em seus próprios termos de uso.

OUTRO LADO

Aos Fatos entrou em contato com Folgosi por meio de sua assessoria na tarde de sexta-feira (23), mas não havia recebido resposta até a publicação desta reportagem. Como Santos e Monark não disponibilizam meios de contato em seus canais, Aos Fatos enviou questionamentos via mensagem direta em suas redes sociais.

A reportagem também procurou as duas plataformas citadas, mas, até a última atualização, apenas Gettr havia respondido.

Em nota, a rede social afirmou que é uma plataforma independente que “não censura usuários devido às suas opiniões políticas”. Diz acreditar que “debates acalorados” são pilares de democracias saudáveis. “Não toleramos o mesmo tipo de comportamento que pessoas poderosas adotam contra quem tem opiniões divergentes e sempre cumprimos leis locais e solicitações de autoridades.”

A reportagem permanece aberta ao registro de novas manifestações enviadas ao Aos Fatos.

Colaborou João Barbosa

sobre o

Radar Aos Fatos faz o monitoramento do ecossistema de desinformação brasileiro e, aliado à ciência de dados e à metodologia de checagem do Aos Fatos, traz diagnósticos precisos sobre campanhas coordenadas e conteúdos enganosos nas redes.

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