No dia seguinte à votação do primeiro turno, passou a circular nas redes sociais um suposto print de um tuíte de Ciro Gomes (PDT) declarando voto em Jair Bolsonaro (PL). A imagem tinha o template exato de postagens no Twitter, com a foto do candidato derrotado, selo de verificado, nome de usuário e fonte de texto idêntica à da rede social — porém era uma montagem.
Dois dias depois, outra imagem manipulada simulava o título de uma notícia do G1 sobre uma suposta fala de Lula em jantar com aliados em que ele dizia que “nem Deus tira essa eleição” dele, o que teria desagradado religiosos. A montagem somou 1,7 mil curtidas no Instagram e foi compartilhada também no WhatsApp.
- Desde o início da campanha eleitoral, em 16 de agosto, o Aos Fatos desmentiu 14 montagens imitando publicações em redes sociais ou notícias como essas;
- A maioria (12) foi feita após o primeiro turno das eleições.
Montagens como essas podem ser feitas facilmente em programas de edição de imagem comuns, mas a produção é ainda mais fácil com sites que geram templates prontos para preenchimento. O Aos Fatos identificou dois deles, que somaram mais de 33 mil acessos mensais, em média, levando em consideração os últimos três meses, segundo dados da ferramenta Similar Web.
O mais popular permite a fabricação de imagens e links que imitam sites noticiosos. Basta escolher a seção que se deseja imitar e preencher o título da notícia, a data de publicação e a imagem de destaque, que a ferramenta gera uma imagem e um link para ser compartilhado nas redes.
O link leva a uma página do site que diz que tudo passa de uma pegadinha, mas a imagem com a montagem pode ser compartilhada separadamente. “Seja cuidadoso e não espalhe conteúdo ilegal, desrespeitoso ou prejudicial a outros. Divirta-se com responsabilidade”, convida o site, que também sugere “pegadinhas entre amigos” e “uso educacional”.
O portal ainda diz que não é parceiro de nenhum site de notícias e que os layouts usados são fictícios, embora se assemelhe nas cores, fontes e estrutura com as publicações do G1, do Grupo Globo.
No Twitter, usuários denunciaram que uma montagem com fala inventada de Lula sobre a Venezuela foi feita através de uma dessas ferramentas. Outras mensagens nas redes propõem que autoridades investiguem o portal. “Investigação sobre isso vem a calhar!”, tuitou um usuário que marcou o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e o deputado eleito Nikolas Ferreira (PL-MG) em link para o site.
O site Gerador de Fake News foi registrado em maio de 2020, mas não é possível descobrir com dados públicos a quem pertence. O Aos Fatos entrou em contato por meio de um formulário disponibilizado no site, mas não obteve resposta até a publicação desta reportagem — e o formulário foi tirado do ar.
Depois da tentativa de contato da reportagem, o site bloqueou a geração de templates de política e economia, idênticos aos do G1, permitindo apenas a criação de montagens com o template da sessão “futebol”. “Em virtude do mau uso por campanhas eleitorais, agora é possível criar notícias apenas na categoria FUTEBOL”, anunciou.
Isso não impediu, porém, que o gerador continuasse sendo usado maliciosamente. Entre 12 e 14 de outubro, circulou nas redes montagem que dizia que o ator José Dumont, preso acusado de pedofilia, teria declarado voto em Lula após sair da cadeia — o que não é verdade. No topo da imagem lia-se “futebol”, editoria em que estaria publicada a falsa notícia. A montagem também circulou com o título cortado.
Os acessos ao site são monetizados com o serviço Ezoic, que dispõe anúncios no topo da página. O site também pede doações pela plataforma de financiamento coletivo Ko-fi.
Outro site identificado pelo Aos Fatos permite a criação de montagens que imitam postagens de Twitter e Instagram. É possível escolher foto de perfil, nome, data e personalizar o texto e anexos das publicações falsas, além de personalizar quantidade de curtidas, retweets e comentários. Ao final, é criada uma imagem que pode ser compartilhada nas redes sem qualquer aviso de tratar-se de conteúdo falso.
Site convida usuários a escreverem “uma mensagem convincente” na geração de tuítes falsos.
Esse gerador pertence a uma iniciativa de programação digital em Portugal chamada Populu, cujo domínio está registrado no nome de Pedro Oliveira, em um endereço na cidade de Matosinhos, no norte do país. O grupo também é dono de sites de língua portuguesa e utilidades, como dicionários online e conversores de unidades de medida.
A reportagem também tentou entrar em contato com Oliveira e Populu, mas não houve resposta.
Não é possível ter certeza que as montagens falsas de tuítes que circulam nas redes foram feitas usando a ferramenta. No entanto, o site permite a geração de peças idênticas às desmentidas pelo Aos Fatos essa semana, como tuíte falso em que Lula teria publicado sobre bloquear poupanças para manter o Auxílio Brasil e montagem de publicação de Bolsonaro com críticas a padres e bispos.