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🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Abril de 2021. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

Fui vacinado contra Covid-19, e agora? Conheça riscos e cuidados após a imunização

Por Marco Faustino

20 de abril de 2021, 16h35

A vacinação contra Covid-19 no Brasil caminha a passos lentos em meio ao veloz ritmo de mortes causadas pela doença no país. Desde que foi iniciada a campanha de imunização, em janeiro deste ano, apenas 26 milhões de pessoas receberam a primeira dose, o que corresponde a cerca de 16,6% da população acima de 18 anos. Na segunda dose, a situação é ainda mais crítica: 10,1 milhões ou 6,3% dos aptos a serem vacinados. Os dados são do consórcio de veículos de imprensa e referentes a 20 de abril de 2021.

A demora tem suscitado dúvidas entre os que já foram vacinados e não sabem ao certo se a imunidade está de fato garantida em um momento de escalada nos casos e mortes pela Covid-19 no país. A seguir, respondemos oito perguntas essenciais sobre o tema.

  1. A vacina contra Covid-19 pode causar algum efeito colateral?
  2. Posso adoecer mesmo depois de vacinado?
  3. É possível morrer de Covid-19 após tomar a vacina?
  4. Perdi o prazo para tomar a segunda dose, e agora?
  5. Vou poder me reunir livremente com amigos e familiares após ser vacinado?
  6. Posso tomar a vacina contra a gripe logo depois da de Covid-19?
  7. Vale a pena fazer exames para saber se já desenvolvi anticorpos após a vacina?
  8. As vacinas já estão surtindo efeito no Brasil?

A vacina contra Covid-19 pode causar algum efeito colateral?

Sim, mas a maioria das reações é considerada leve. O mais comum é sentir dor no local onde a vacina foi aplicada, mas também já foram relatados casos de fadiga, febre, dor muscular, diarreia, náusea e dor de cabeça. Esses sintomas costumam passar de 24h a 48h após a imunização.

No caso da CoronaVac, os estudos clínicos que avaliaram a segurança, a resposta imunológica e a eficácia da vacina também identificaram que os efeitos colaterais mais recorrentes eram leves e os mais incomuns foram vômito, vermelhidão e hematoma. Além disso, uma pesquisa com 50 mil voluntários na China apontou que apenas 5,36% tiveram efeitos colaterais, todos sem gravidade. Em caso de reação a essa vacina, o Instituto Butantan, que produz a vacina, recomenda ligar para o número 0800 722 6001, da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).

Em relação ao imunizante Oxford/Astrazeneca, foram relatados 175 eventos graves na terceira fase de testes, mas apenas três (anemia hemolítica, mielite e febre alta) foram considerados como possivelmente relacionados à vacina. A Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), que produz o imunizante no Brasil, disponibiliza o número 0800 210 310 para que se entre em contato em caso de reação à vacina.

No início de abril, a EMA (Agência Europeia de Medicamentos) confirmou uma relação entre o imunizante de Oxford/AstraZeneca e a formação de coágulos sanguíneos, que podem obstruir artérias ou veias, mas manteve a recomendação de uso, pois os casos são muito raros: 0,0003% do total de vacinados. Para se ter uma ideia, é mais fácil ser atingido por um raio no Brasil ao longo de toda sua vida (0,004%), do que desenvolver esse quadro após tomar a vacina. A Anvisa também manteve a recomendação de uso.

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Posso adoecer mesmo depois de vacinado?

Sim. Nenhuma vacina, seja contra Covid-19 ou outra doença, é 100% eficaz. No entanto, a imunização reduz o risco de adoecimento e, quando aplicada em larga escala, diminui a circulação do vírus, ou seja, a chance de uma pessoa ser infectada também cai à medida que mais gente é vacinada.

De acordo com o Instituto Butantan, a CoronaVac tem uma eficácia global – probabilidade de uma pessoa vacinada não adoecer – de 50,7% e reduz em 83,7% as chances de uma pessoa desenvolver um quadro da doença que necessite de assistência hospitalar. Já a eficácia global do imunizante de Oxford/AstraZeneca é de 82,4% e, caso uma pessoa contraia a doença, a vacina reduz em 76% as chances de que apresente sintomas.

Essa eficácia, porém, não é alcançada de forma imediata. Embora a produção de anticorpos comece no momento da vacinação, o organismo precisa de alguns dias para criar as defesas suficientes contra o vírus, e a infecção pode ocorrer antes de o corpo ter tido tempo hábil para desenvolver a proteção esperada.

As duas vacinas usadas no momento no Brasil dependem da aplicação de duas doses para gerar a resposta imune prevista, que só é alcançada, no mínimo, 14 dias depois da última dose. Entre as duas aplicações, o vacinado ainda não apresenta defesas suficientes e pode, além de adoecer, apresentar quadro grave de Covid-19.

Segunda dose. Mesmo passados 14 dias da segunda dose, ainda é possível adoecer, mas não há dados consolidados sobre isso. As vacinas dependem de muitos fatores para funcionar. Um deles é que as pessoas podem ter respostas imunológicas diferentes, ou seja, desenvolver mais ou menos defesa contra o vírus. Novas variantes também podem ser capazes de burlar a proteção induzida pelos imunizantes e interferir em sua eficácia.

“Entramos na fase IV dos testes clínicos, que é a fase do mundo real, onde teremos essas respostas. O Brasil está desafiando o vírus ao permitir uma alta circulação viral, e isso também pode impactar na efetividade das vacinas”, explica a infectologista Rosana Richtmann, do Instituto Emílio Ribas.

Segundo Anna Sara Levin, infectologista e coordenadora do Grupo de Controle de Infecção Hospitalar do Hospital das Clínicas da FMUSP (Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo), ainda não há dados consistentes de casos de Covid-19 pós-vacinação. “Estamos trabalhando nisso, mas não temos números confiáveis ainda”, disse. A médica coordena um estudo com mais de 20 mil profissionais de saúde do hospital, cujo resultado preliminar apontou uma eficácia de 73,8% da CoronaVac.

Outras unidades de saúde, como Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, ligado à USP, o Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, vinculado à UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e o Instituto de Infectologia Emílio Ribas, informaram não ter dados de vacinados infectados após a segunda dose entre seus pacientes e funcionários.

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É possível morrer de Covid-19 após tomar a vacina?

Sim. Especialistas ouvidos pelo Aos Fatos não descartam que isso possa acontecer, embora considerem que tais casos seriam raros. Como foi dito antes, a alta circulação viral, a presença de novas variantes e o fato de as vacinas não serem 100% eficazes fazem com que a morte ainda seja possível. "Com milhões de pessoas vacinando é possível que apareçam os escapes imunológicos, que é quando o corpo não gera a defesa esperada contra o vírus. Porém, isso é exceção à regra”, disse a infectologista Rosana Richtmann.

O Instituto Butantan considera “prematura” e “temerária” qualquer afirmação sobre hospitalizações e mortes por Covid-19 após a vacinação completa. "Cada caso, individualmente, deve passar obrigatoriamente pelo processo de investigação, que não considera apenas a imunização de forma isolada, e sim o conjunto de aspectos clínicos, como comorbidades e outros fatores não relacionados à vacinação”, diz um trecho da nota enviada ao Aos Fatos.

Já a Fiocruz afirma desconhecer casos de adoecimento ou óbitos após a vacinação. “Até o momento, nossa farmacovigilância não possui nenhuma informação com associação comprovada de óbito ao uso dessa vacina”, diz a instituição.

A infectologista Natasha Nicos, do Hospital Estadual de Serrana, no interior de São Paulo, disse que não tem conhecimento de pessoas com as duas doses da vacina, com tempo suficiente para gerar imunidade, que tenham necessitado de internação em UTI ou morrido. “Mas não acho impossível que isso aconteça”, ressaltou. Ela é a principal pesquisadora do Projeto S, do Instituto Butantan, que analisa o impacto da vacinação em massa feita experimentalmente no município paulista. Os primeiros resultados devem sair em maio.

Perdi o prazo para tomar a segunda dose, e agora?

A segunda dose da CoronaVac deve ser administrada entre 14 e 28 dias depois da primeira. No caso da Oxford/Astrazeneca, o intervalo é de 90 dias. A data correta consta do cartão de vacinação de quem tomou a primeira dose. Segundo o Ministério da Saúde, quem perder o prazo deve procurar uma unidade de saúde o quanto antes para completar a imunização.

A infectologista Rosana Richtmann explica que não há necessidade de recomeçar a vacinação do zero: “Dose dada nunca é dose perdida. O mais importante é que as pessoas tomem a segunda dose das vacinas, não importa que tenham perdido o prazo”.

Vou poder me reunir livremente com amigos e familiares após eu ser vacinado?

Infelizmente, não. Mesmo vacinado, ainda é possível transmitir a doença a outras pessoas. Por isso, é essencial que não se descuide do uso de máscaras faciais, da higienização frequente das mãos e do distanciamento social.

O mecanismo de contágio por meio de vacinados ainda não está muito claro, mas cientistas afirmam que somente após a ampla imunização da população será possível retomar as atividades presenciais normalmente. Ainda que não haja um consenso, cientistas estimam que os efeitos da proteção coletiva só serão mais perceptíveis quando de 40% a 50% da população total do país receber o total de doses recomendadas pelos fabricantes.

O posicionamento é corroborado pela Fiocruz, que indica uso de álcool em gel, máscara e distanciamento social mesmo após a vacinação, até que se atinja esses percentuais.

“Estamos vivendo uma situação muito grave da pandemia por todo o Brasil, com uma alta transmissão e um número muito grande de pessoas se contaminando. Mesmo com as duas doses da vacina, as pessoas devem aderir às medidas de enfrentamento”, diz Mellanie Fontes-Dutra, biomédica e pesquisadora da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul).

“Embora já tenhamos observado alguma imunidade somente com uma dose da vacina, só é possível garantir a imunidade a partir da segunda dose. E, mesmo assim, não podemos relaxar com as medidas de controle da disseminação do vírus”, afirma Letícia Sarturi, mestre em Imunologia e doutora em Biociências e Fisiopatologia pela UEM (Universidade Estadual de Maringá).

Posso tomar a vacina contra a gripe logo depois da de Covid-19?

Não. O Ministério da Saúde recomenda que haja, no mínimo, um intervalo de 14 dias entre a vacina contra a Covid-19 e qualquer outra imunização. Em situações de urgência, como a administração de soros antiofídicos ou vacina antirrábica para prevenção pós-exposição, esse intervalo poderá ser desconsiderado.

Vale a pena fazer exames para saber se já desenvolvi anticorpos após a vacina?

Não. A SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações) não recomenda a testagem por sorologia para saber se você desenvolveu defesas contra o vírus. “Não se avalia a proteção desenvolvida após vacinação apenas por testes laboratoriais através da dosagem de anticorpos neutralizantes”, diz a instituição em nota publicada em março.

Segundo a biomédica Mellanie Fontes-Dutra, a resposta imunológica é muito complexa e é formada por diferentes componentes, não só anticorpos. Especialistas esclarecem que as técnicas científicas para quantificar de forma plena a imunidade adquirida pela vacinação não são de acesso comercial.

As vacinas já estão surtindo efeito no Brasil?

De certo modo, sim. Segundo a Anvisa, as vacinas têm comprovadamente reduzido a incidência de óbitos e de casos graves. A avaliação da agência é corroborada por dados de secretarias de saúde estaduais, levantamentos nacionais e resultados preliminares de pesquisas.

Um estudo que envolveu 20 mil profissionais do HC-FMUSP (Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP) mostrou que a CoronaVac reduziu o risco de adoecimento em 73,8% a partir de cinco semanas da aplicação da segunda dose. Com duas semanas essa taxa ficou em 50,7%, próximo da eficácia global do imunizante, de 50,38%.

Com a vacinação, caiu também o número de mortes e de afastamentos de profissionais de saúde Hospital Sírio-Libanês e da Santa Casa de Araraquara (SP) em decorrência da Covid-19. Além disso, um levantamento feito no Ceará apontou uma relação direta entre a vacinação e a diminuição do número de casos da doença entre profissionais de saúde.

As internações em UTI no Distrito Federal também caíram 59% entre idosos com mais de 80 anos de janeiro a abril. Alvo do “Projeto S”, a cidade paulista de Serrana também vê sinais de queda em casos graves e na busca por atendimento.

Ao Aos Fatos, a pesquisadora Ariane Abreu do IVI (Instituto Internacional de Vacinas), instituição ligada à OMS (Organização Mundial de Saúde), disse que a estratégia de vacinação em massa aliada às medidas de proteção contra a Covid-19 são as principais formas que temos hoje de combater a pandemia e que já se nota a redução de casos e mortes nos grupos prioritários (profissionais da saúde e idosos com mais de 60 anos).

Porém, o epidemiologista Jesem Orellana do ILMD (Instituto Leônidas & Maria Deane), a unidade técnico-científica da Fiocruz Amazônia, ressalta que ainda é cedo para falar sobre desaceleração da pandemia. “Estamos em um momento muito difícil, o pior até agora. A pífia vacinação que vem sendo feita no Brasil não tem a menor chance de desacelerar a pandemia. Estamos há mais de três meses vacinando grupos prioritários, que deveria ser uma política transitória”.

Referências:

1. The Lancet (Fontes 1 e 2)
2. SSRN
3. Governo de SP
4. G1 (Fontes 1, 2 e 3)
5. Revista Galileu
6. Agência Brasil (Fontes 1 e 2)
7. Medrxiv
8. Aos Fatos (Fontes 1 e 2)
9. GaúchaZH
10. USP
11. Instituto Butantan
12. Estadão
13. Governo Federal
14. SBIm
15. O Globo
16. Governo do CE
17. IVI

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