É falso que revogação de portarias facilitou contaminação por HIV de transplantados

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É falsa a alegação difundida nas redes de que duas portarias publicadas pelo Ministério da Saúde durante o governo Jair Bolsonaro, mas revogadas pela gestão Lula, teriam impedido a transmissão do HIV a pacientes transplantados no Rio de Janeiro. A pasta afirmou que as portarias não previam etapas para o controle de qualidade de exames de doadores de órgãos, o que foi corroborado pela ABTO (Associação Brasileira de Transplante de Órgãos).

Publicações com o conteúdo enganoso acumulavam 110 mil curtidas no Instagram até a tarde desta quarta-feira (16).

A revogação das Portarias nº 3264/22 e nº 3265/22, realizada pela Ministra da Saúde Nísia Trindade, removeu regras essenciais do Programa de Qualidade de Doação de Órgãos, criado no governo anterior. Essas portarias eram fundamentais para garantir a segurança e a qualidade dos transplantes no Brasil, estabelecendo diretrizes rigorosas de testagem sorológica de doadores e permitindo o monitoramento de falhas críticas no sistema.

Posts nas redes enganam ao fazer crer que portarias do Ministério da Saúde revogadas durante o governo Lula resultou na transmissão do HIV a transplantados

Não procede que a revogação, em setembro de 2023, das portarias 3264/22 e 3265/22, publicadas pelo Ministério da Saúde no último ano do governo Bolsonaro, tenha permitido ou facilitado a transmissão do vírus HIV a pacientes transplantados no Rio de Janeiro.

Em nota, o Ministério da Saúde diz que são infundadas e não correspondem à realidade interpretações sugerindo que revogações e alterações nas normas contribuíram para o incidente. A pasta afirmou ainda que os conteúdos das portarias revogadas não estão relacionados à testagem, o que foi corroborado pela médica e presidente da ABTO, Luciana Haddad, ao Aos Fatos.

“Nenhuma das portarias previa etapas relacionadas a exames de doadores de órgãos ou controle de qualidade nesse processo. As portarias anteriores, e depois a nova portaria, são relativas à avaliação da qualidade dos serviços de transplantes para incremento financeiro. Não há relação ou impacto com fato ocorrido”, afirmou Luciana Haddad.

As portarias 3264/22 e 3265/22 instituíram o QualiDot (Programa de Qualificação do Sistema Nacional de Transplantes). O programa consistia no monitoramento e avaliação dos serviços de transplantes de órgãos e de medula óssea, mediante acompanhamento de indicadores quali-quantitativos e a concessão de incentivo financeiro.

Já a nova portaria do Ministério da Saúde a que a presidente da ABTO se refere é a 1.262, de 12 de setembro de 2023. A medida é uma readequação de medidas presentes nas portarias anteriores. Entre as principais mudanças estão:

  • Mudança de nome do incremento: de Qualidot para Incremento Financeiro para Qualidade do Sistema Nacional de Transplantes;
  • Reforço na participação das Comissões Intergestores Bipartite, para fortalecer a gestão e auxiliar no monitoramento do repasse de incentivos financeiros públicos;
  • Reformulação na classificação dos serviços de transplantes, a fim de esclarecer melhor os parâmetros;
  • Reajuste dos valores, ampliando os recursos destinados a cada nível de classificação em relação às portarias revogadas;
  • Definição de indicadores a serem monitorados pelas centrais estaduais de transplantes como contrapartida dos incrementos, como realização de vistorias técnicas e acompanhamento da sobrevida dos pacientes.

Entenda o caso. Seis pacientes contraíram o vírus HIV após passarem por transplantes de órgãos no Rio de Janeiro. Segundo as investigações, dois doadores fizeram exame de sangue no laboratório PCS Lab, na Baixada Fluminense, e os resultados deram negativos — embora os doadores fossem portadores do HIV. O laboratório foi contratado pelo governo do Rio de Janeiro para atender o programa de transplantes.

As investigações realizadas pela Polícia Civil indicam que os laudos foram falsificados, o que induziu equipes médicas ao erro e levou à contaminação dos pacientes. Já o laboratório alega que os resultados preliminares de uma sindicância interna apontam indícios de erro humano na transcrição dos resultados de exames.

Na terça-feira (15), a ministra da Saúde Nísia Trindade afirmou que o laboratório não apresentou as condições necessárias para o cuidado que se tem que ter com os transplantes, e que não há um problema com o regramento existente.

O Ministério da Saúde, no entanto, pretende rever uma portaria que regulamenta o Sistema Nacional de Transplantes, segundo o jornal Folha de S.Paulo. As discussões sobre a revisão da portaria começaram no Fórum Nacional para Revisão do Regulamento Técnico do Sistema Nacional de Transplantes, realizado em setembro deste ano.

A legislação, que vigora desde 2017 — penúltimo ano do governo de Michel Temer (MDB) — não define critérios para a escolha dos laboratórios que realizam esses testes. As normas determinam apenas que pessoas soropositivas para HIV são excluídas de forma automática como doadoras de órgãos, tecidos ou células humanas.

O caminho da apuração

Consultamos as duas portarias revogadas e mencionadas nos post enganosos, bem como a nova portaria sobre o tema. Entramos em contato com o Ministério da Saúde e a ABTO, para esclarecimentos sobre o teor das medidas revogadas. Consultamos também o noticiário sobre a contaminação por HIV de pacientes transplantados.

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