Diferentemente do que sugerem publicações nas redes, não há registros públicos de que representantes do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) tenham dito que iriam “incendiar o agro no Brasil”. As peças de desinformação, que tentam responsabilizar o movimento pelas queimadas que ocorrem em São Paulo, distorcem um texto publicado em abril pelo A Província do Pará, que usa uma declaração apócrifa, ou seja, sem nenhuma atribuição sobre quem teria dito.
As peças que usam o conteúdo para acusar o MST sem provas acumulavam mais de 10 mil curtidas no Instagram e centenas de compartilhamentos no Facebook até esta terça-feira (27).
MST manda recado a Lula e seus ministros de governo ‘Vamos incendiar o agro no Brasil’
Publicações têm compartilhado fora de contexto o título de um texto do jornal A Província do Pará para sugerir que o MST seria o responsável pelas queimadas que têm ocorrido em municípios paulistas. As peças enganam ao distorcer diferentes informações:
- A reportagem citada foi publicada em abril e falava sobre a campanha Abril Vermelho, uma jornada de ocupações agrárias que ocorre todos os anos em diferentes estados brasileiros;
- A declaração “vamos incendiar o agro no Brasil”, que consta no título, não aparece no corpo da reportagem e nem tem sua fonte indicada.
Aos Fatos entrou em contato com A Província do Pará para questionar quem teria dito a declaração que aparece no título e quando ela teria sido feita. O repórter responsável disse que não sabia a fonte, já que a notícia havia sido replicada de outro site.
A reportagem, então, encontrou o registro original: o site Hora Brasília, que publicou um texto idêntico, mas que usava a palavra “inc3ndiar”, em vez de “incendiar”, para dificultar a busca. Também não havia no texto nenhuma fonte para a declaração “Vamos incendiar o Brasil”.
Aos Fatos tentou entrar em contato com o Hora Brasília na última segunda-feira (26), mas não houve resposta. Horas depois, no entanto, o texto original foi excluído do site.
Desinformação reciclada. Em busca por declarações semelhantes, a reportagem encontrou apenas uma peça de desinformação que circulou nas redes em 2020 e que atribuía ao líder do movimento, João Pedro Stédile, a frase: “Eu e meus companheiros do MST estamos dispostos a incendiar o Brasil para derrubar o Bolsonaro”.
Não há registros públicos de declaração semelhante de Stédile. Já a imagem que ilustra as peças de desinformação foi retirada de um vídeo publicado pelo Brasil de Fato em que o líder do movimento social defende a candidatura de Lula (PT) nas eleições de 2018.
Em nota publicada nas redes, o MST classificou as alegações como falsas e sem fundamento: “Têm como único objetivo desviar a atenção das verdadeiras causas dos incêndios e nos criminalizar por lutarmos por uma reforma agrária justa e sustentável”.
Só na última sexta-feira (23), foram registrados quase 2.000 focos de incêndio em municípios paulistas. Até o momento, duas pessoas morreram, 66 ficaram feridas e seis foram presas por suspeita de iniciarem o fogo. Não há nenhum indício de que os suspeitos sejam ligados ao MST.
O caminho da apuração
Aos Fatos buscou a reportagem original citada nas peças de desinformação e encontrou o texto publicado pelo A Província do Pará. Entrevistamos o repórter responsável pelo registro, que explicou que ele havia sido replicado de outro portal.
A reportagem então procurou por trechos da matéria e encontrou a publicação original no Hora Brasília. Tentamos contato com o responsável pelo portal via WhatsApp e email, mas não houve retorno.
Também pesquisamos a declaração “vamos incendiar o agro no Brasil” e não encontramos nenhum resultado relevante. Por fim, procuramos o MST. Como o movimento não respondeu, citamos a nota publicada em suas redes oficiais.