Não é verdade que inundações em cidades da Serra Gaúcha ocorreram após as comportas de uma barragem em Canela (RS) terem sido abertas, como alegam publicações enganosas. Um vídeo que circula nas redes para disseminar a informação falsa mostra, na verdade, a barragem de Canastra, também conhecida como barragem de Bugres, cheia de sujeira e lama acumuladas após as chuvas, segundo a empresa responsável. A estrutura não tem comportas ou mecanismos de abertura capazes de causar inundações, apenas uma válvula de fundo que, mesmo totalmente aberta, não teria vazão suficiente para inundar as cidades.
Publicações com o conteúdo enganoso acumulavam 3.000 curtidas no Instagram e centenas de compartilhamentos no Facebook até a tarde desta segunda-feira (27). As peças enganosas circulam também no Telegram.
Barragem de Bugres, Canela-RS, vazia! Alguém nos explique como esse “fenômeno natural" (vide aspas) ocorre??? Chuvas "torrenciais" geralmente enchem barragens e não esvaziam. O que aconteceu no RS? Até uma pessoa com dois neurônios consegue entender. Mas por que nenhuma imprensa está investigando isso? Por que estão silenciando o caso? Quem mandou abrir as comportas das barragens do Rio Grande do Sul?
Um vídeo que mostra um grande volume de sujeira e lama dentro do reservatório da barragem de Canastra, também conhecida como barragem de Bugres, tem sido difundido por publicações que enganam ao afirmar que inundações na Serra Gaúcha foram causadas pela abertura de comportas no local.
A CEEE Geração, empresa concessionária que pertence à CSN Energia, informou ao Aos Fatos que a estrutura não possui comportas, apenas uma válvula de fundo, cuja vazão é insuficiente para provocar enchentes, mesmo quando a válvula está totalmente aberta.
“As imagens dos vídeos mostram o volume de terra e detritos que deslizaram com as encostas para dentro do reservatório e também a enorme quantidade de sedimentos acumulados neste período de chuvas. A água foi escoada pela válvula de fundo, que permanece parcialmente aberta. O que se vê no vídeo é a vazão natural do rio”, afirmou a empresa.
Em nota ao Aos Fatos, a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) também descartou que a barragem tenha causado enchentes."A informação que as comportas foram abertas propositalmente não procede. O volume do reservatório é pequeno e a vazão defluente não possibilita ocorrência de alagamentos."
As atuais enchentes no Rio Grande do Sul são explicadas pela combinação de fenômenos meteorológicos, como o El Niño, que potencializa as chuvas na região Sul, e o agravamento das mudanças climáticas. Dados meteorológicos mostram que, em menos de 15 dias, o Rio Grande do Sul recebeu o equivalente a cinco meses de chuvas.
A lama vista nas imagens é uma situação esperada quando o solo perde a capacidade de absorver a água da chuva. O meteorologista Carlos Nobre, um dos maiores especialistas em mudanças climáticas, já explicou ao Aos Fatos que, quando o solo é utilizado muitas vezes e sem descanso por culturas agrícolas, fica saturado e incapaz de reter água. Assim, a água corre, causa erosão e arrasta o solo.
“Quando você desmata muito os biomas naturais, o mesmo volume de chuva que cai causa uma inundação maior, porque você tem muito menos água retida na vegetação, no solo”, disse Nobre.
A barragem de Canastra acumula água para a UHE (Usina Hidrelétrica) de mesmo nome e é uma das quatro usinas geradoras de energia elétrica do Sistema Salto. As demais usinas são a de Bugres, Herval, e UHE Passo do Inferno. Segundo o governo gaúcho, atualmente não há riscos que comprometam a estrutura da UHE Canastra no curto prazo.
Essa não é a primeira vez que peças de desinformação difundem que as recentes enchentes no Rio Grande do Sul teriam sido causadas pela abertura de comportas em barragens. Em checagem anterior, Aos Fatos desmentiu posts que compartilharam um vídeo no qual o apresentador Alexandre Garcia engana ao dizer que houve a abertura simultânea das comportas de três barragens no Rio Grande do Sul.
Risco de rompimento. A CSN Energia também é responsável pela barragem Salto, no município gaúcho de São Francisco de Paula. A estrutura acumula água para a UHE de Bugres e é a única que se encontra, há duas semanas, em nível de emergência — quando há risco iminente de rompimento.
Após as fortes chuvas, surgiram rachaduras em edificações particulares e vias públicas localizadas numa encosta nas proximidades da barragem. A CSN informou que trabalha em parceria com a Prefeitura de São Francisco de Paula na avaliação sobre a estabilidade do solo na região. “Até que seja concluída avaliação sobre a estabilidade da encosta, de forma preventiva e em coordenação com a Defesa Civil, a barragem continuará em status de emergência.”
Este texto foi atualizado às 17h33 desta segunda-feira (27) para incluir a nota da Aneel.