Não é verdade que uma norma publicada pelo presidente Lula diz que policiais só podem atirar depois de serem alvejados por criminosos. As peças de desinformação distorcem o decreto 12.341/2024, que disciplina o uso da força na segurança pública. O texto, na realidade, determina que armas de fogo sejam usadas como último recurso, quando houver risco à segurança do agente ou de terceiros.
As peças enganosas somavam centenas de compartilhamentos no Facebook e 5.000 curtidas no Instagram até a tarde desta segunda-feira (6).
Com novo decreto do Presidente Lula, policiais só podem atirar se forem alvejados (...) Bandido com arma em punho, policiais não pode sacar a arma (...)

Posts nas redes mentem ao alegar que o decreto 12.341/2024, publicado na última terça-feira (24), diz que agentes de segurança só podem atirar contra criminosos se forem alvejados. Não há qualquer trecho do texto — uma atualização normativa da lei 13.060, de 2014 — que faça menção a essa proibição, o que foi corroborado por Davi Tangerino, professor de direito penal da Uerj.
De acordo com o decreto, o emprego de arma de fogo deve ser considerado apenas como último recurso. Devem ser priorizadas a comunicação, a negociação e o emprego de técnicas que impeçam uma escalada da violência, como instrumentos de menor potencial ofensivo — projetados para conter pessoas temporariamente, com baixo risco de lesão grave ou morte.
Segundo Tangerino, o decisivo é se a conduta do sujeito está colocando em risco o policial ou a segurança pública, o que é explicitado no decreto.
“É um pouco extremado esperar que haja um disparo para só então a gente dizer que a polícia pode reagir. Então o sujeito empunha a arma em direção a pessoa e a polícia, isso já é suficiente para poder reagir. Não é preciso esperar o primeiro disparo”, afirmou o professor.
Tanto em 2014 quanto agora, o uso de armas de fogo é considerado ilegítimo em duas situações:
- Contra pessoa em fuga que esteja desarmada ou que não represente risco imediato de morte ou de lesão aos profissionais de segurança pública ou a terceiros;
- Contra veículo que desrespeite bloqueio policial em via pública, exceto quando o ato represente risco de morte ou lesão aos profissionais de segurança pública ou a terceiros.
Ainda segundo o decreto, os agentes de segurança devem atuar de forma não discriminatória, sem preconceitos de raça, etnia, cor, gênero, orientação sexual, idioma, religião, nacionalidade, origem social, deficiência, situação econômica e opinião política ou de outra natureza.
O documento também concede ao Ministério da Justiça e Segurança Pública a competência para editar normas complementares, além de custear, criar, implementar e monitorar ações relacionadas ao assunto.
Vídeo. As peças de desinformação também enganam ao compartilhar como se fosse recente e sobre o decreto de Lula um trecho de um evento promovido pela AGU (Advocacia-Geral da União) e pelo MPF (Ministério Público Federal), em que uma palestrante diz a policiais que só devem atirar se alvejados.
Por meio de busca reversa, Aos Fatos verificou que o registro circula ao menos desde novembro de 2014. Durante o evento, a palestrante cita um crime ocorrido em São Paulo, em setembro de 2014, o que permite afirmar que o evento ocorreu entre esses dois meses.
Aos Fatos entrou em contato com a AGU e o MPF, que não souberam informar detalhes sobre o evento nem sobre a palestrante.
O caminho da apuração
Consultamos o decreto 12.341/2024 e verificamos que não há qualquer trecho que diga que policiais só podem usar armas de fogo contra criminosos caso sejam alvejados. Por meio de busca reversa de imagens, tentamos localizar a origem do vídeo compartilhado pelas publicações, e verificamos que o evento foi realizado em 2014 e não tem relação com o decreto de Lula.