Esta reportagem foi feita numa colaboração entre Agência Pública, Aos Fatos e Núcleo Jornalismo para a cobertura das eleições de 2022. A republicação só é permitida com a atribuição de crédito para todas as organizações.
Centenas de anúncios irregulares, que não poderiam ser veiculados pela Meta por terem sido pagos por apoiadores de Bolsonaro e Lula — e não pelas campanhas —, continuaram a circular no Facebook e no Instagram mesmo após o início do período em que a Lei Eleitoral proíbe qualquer propaganda de candidatos.
Levantamento feito por Agência Pública, Aos Fatos e Núcleo Jornalismo constatou que:
- 281 publicações de campanhas impulsionadas permaneciam ativas entre sexta-feira (28) e sábado (29).
- 155 anúncios (55%) declaram apoio a Bolsonaro ou atacam Lula;
- Outros 126 (44%) fazem campanha contra o presidente ou eram a favor de Lula.
Resolução do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) proíbe anúncios de candidatos na internet desde a meia-noite de sexta (28). Em cumprimento à norma, as candidaturas de Jair Bolsonaro (PL) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) interromperam impulsionamentos nas plataformas do Google e da Meta.
Além de desrespeitarem o prazo estipulado pela Justiça Eleitoral, os anúncios identificados pela reportagem são irregulares também por terem sido pagos por pessoas físicas ou jurídicas não associadas oficialmente às campanhas — a Lei Eleitoral somente permite que conteúdos de propaganda eleitoral sejam impulsionados por partidos e campanhas.
- Esses impulsionamentos irregulares custaram entre R$ 28 mil e R$ 57,1 mil;
- O alcance foi de no mínimo 163 milhões de visualizações.
Dentre o conteúdo analisado, há postagens que são explícitas em favor de um candidato. Um anúncio que está ativo e já registrou 40 mil impressões usa, inclusive, um vídeo oficial da campanha de Bolsonaro.
Mas há também conteúdo que é propositalmente genérico e que aparenta ter sido criado assim para burlar a moderação. É o caso de um anúncio em vídeo cuja legenda diz: “E agora, Lula ou Bozo?”. O vídeo deixa claro que se trata de uma peça favorável ao candidato à reeleição, mas só é possível saber assistindo ao vídeo.
O levantamento também encontrou anúncios que podem ser considerados de propaganda eleitoral negativa, ou seja, que fazem críticas aos candidatos, como conteúdos que chamam Lula de “ladrão” ou Bolsonaro de “corrupto”. O impulsionamento de propaganda negativa é proibido pelo Código Eleitoral.
A página Siga a Direita Maranhão, por exemplo, fez ao menos seis anúncios que continham críticas a Lula ou ao PT. Em um deles, compartilhou um vídeo produzido pela página com supostos “5 pontos negativos do governo do PT”.
A mesma página impulsionou anúncios que reproduziam narrativas enganosas usadas pelas campanhas para atacar os opositores. É o caso de peça que associa ao PT o assassinato do ex-prefeito de Santo André (SP) Celso Daniel, tráfico de drogas e outros crimes. O anúncio atingiu entre 175 mil e 200 mil impressões segundo estimativa da plataforma, e continuava ativo até a tarde deste sábado (29).
Até mesmo uma declaração de voto, se impulsionada, pode ser considerada infração eleitoral, conforme explica o advogado eleitoral Fernando Neisser: “Ninguém faz isso se não tiver pretensão de que essa declaração de voto ajude a convencer outras pessoas”.
Sobre a proibição de impulsionamento de propaganda eleitoral por pessoas e empresas que não sejam ligadas às campanhas, Neisser diz que é uma tentativa de dificultar a prática de caixa dois.
“O nosso modelo [eleitoral] concentra as despesas da campanha nos partidos. Isso vale pra qualquer coisa. Eu não posso fazer uma campanha falando: 'vamos lá gente, cada um contrate dois cabos eleitorais e mande distribuir panfletos pra mim nas ruas'. Isso é proibido, é caixa dois", afirmou.
"Isso pulveriza despesas que vão estar saindo dos bolsos de pessoas aleatórias e não estarão entrando no caixa da campanha nem no teto de gastos. Se eu não posso fazer isso [na campanha de rua], eu não posso fazer a mesma coisa na internet”, acrescentou. O impulsionamento ilegal é proibido pela lei eleitoral e pode levar a multas de no mínimo R$ 5.000.
Ao longo da sexta-feira, o Netlab (UFRJ) identificou e notificou o TSE de pelo menos 230 casos de anúncios impulsionados por candidatos que não disputam cargo nesse segundo turno, segundo reportagem do jornal O Globo. No primeiro turno, o Netlab já havia identificado que a Meta permitiu impulsionamento de anúncios por candidatos dentro do prazo proibido pela legislação eleitoral.
Procurada pela reportagem, a Meta não quis comentar.