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🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Agosto de 2017. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

Estados e capitais repetem Planalto e ocultam dados de agenda de autoridades

Por Bárbara Libório

9 de agosto de 2017, 15h30

Ferramenta de transparência, gestão e prestação de contas, a divulgação da agenda de compromissos de autoridades públicas — obrigatória por lei em alguns casos e expressamente recomendada pela Comissão de Ética Pública —, não é comum. Quando a divulgação existe, falta detalhamento e há dificuldade para acessar informações. Os recentes casos de ocultação de compromissos na agenda do presidente Michel Temer são exemplo latente disso.

Como não existe norma específica que obrigue o Executivo estadual ou municipal a publicar esse tipo de dado, prefeitos e governadores também usam a brecha para omitir sua agenda de compromissos. De todas as capitais brasileiras, apenas duas prefeituras fazem a publicação, mas ainda de maneira incompleta. Entre os Estados, apenas 10 o fazem, também de forma incompleta.

Para analisar as agendas das autoridades, Aos Fatos se baseou em parâmetros relacionados às políticas de governo aberto. O primeiro ponto foi verificar se essa informação está acessível no site das prefeituras ou governos estaduais. Depois, se ela é atualizada diariamente, com periodicidade. Também verificamos se estão publicizados nos eventos o horário e local dos compromissos. Por último, se estavam disponíveis também as agendas de dias anteriores. O ideal é que estejam publicizados ainda o nome dos participantes e a justificativa da reunião, ou seja, a pauta. Esses requisitos tornam mais fácil o acompanhamento das ações dos mandatários por cidadãos, organizações da sociedade civil, imprensa, e pela sua própria equipe de gestão. Esses indicadores foram desenvolvidos em conjunto com a Escola de Políticas Públicas no curso Open Master de Governo Aberto.

“A divulgação da agenda é fundamental para quem acompanha e fiscaliza o poder público, mas a maneira como é apresentada é muito genérica: a sociedade não tem como saber a pauta das reuniões e nem tampouco sobre as decisões e encaminhamentos que elas geram”, afirma Ricardo Borges Martins, coordenador de mobilização da Rede Minha Sampa.

Leandro Consentino, cientista política e professor do Insper, endossa a importância da divulgação. “Do lado do gestor público, faz sentido pensar na agenda como uma ferramenta para mapear as ações, o que tem sido feito, onde ele tem ido, para onde ou para que tem dado mais atenção e se está priorizando um lado ou outro. É importante para saber onde a sua presença foi mais efetiva, se nos lugares que visitou mais, por exemplo, as políticas pública têm sido mais eficientes.”

Agenda ideal. Para atender as demandas básicas de imprensa, sociedade civil, e também de gestão dos próprios agentes do Poder Executivo, a agenda oficial precisa cumprir ao menos cinco quesitos: ser publicada em site oficial do órgão público; ser atualizada diariamente ou no dia anterior dos eventos, publicizar horário e local dos compromissos e ter disponíveis as agendas de dias anteriores. Ainda assim, esse não é o ideal. É muito importante que sejam divulgados também, no caso de encontros e reuniões, o nome dos participantes e a justificativa da reunião. Ou seja, a pauta.

Dentre as capitais, nenhuma faz a publicação completa. São Paulo e Recife o fazem, mas não cumprem todos os quesitos. O prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), não divulga a pauta de suas reuniões. Já o prefeito de Recife, Geraldo Júlio (PSB), não atualiza sua agenda desde maio deste ano. Em alguns casos, os links das agendas dos prefeitos não funcionam.

Nos Estados brasileiros, o mais comum é que a agenda dos governadores não seja publicada. Quando sim, há falhas na periodicidade e no registro sobre o assunto das reuniões. Nessa seara, nem o presidente da República e seus ministros publicam a pauta de seus compromissos.

Veja, abaixo, o que os indicadores contemplam e, nos mapas, os Estados e capitais por cor, conforme o cumprimento desses requisitos.

Obrigação legal. A Lei nº 12.813/2013, que trata de conflito de interesses e informações privilegiadas em cargos públicos, submete os ocupantes dos cargos de ministros, presidentes de autarquias, empresas e fundações públicas à obrigatoriedade da divulgação de sua agenda públicas, diariamente, por meio da internet. A orientação é reforçada pela Comissão de Ética Pública e pela Secretaria de Comunicação do governo federal. Isso porque, devido aos cargos que ocupam, eles estariam suscetíveis a se deparar com situações de “conflito de interesse” ou “informações privilegiadas”.

Registros como a identidade dos participantes e os assuntos tratados em reuniões são obrigatórios em determinados casos segundo o decreto 4.334, de agosto de 2002, que dispõe sobre as audiências concedidas a particulares por agentes públicos em exercício na administração pública federal direta, nas autarquias e fundações públicas federais. O texto obriga o governo federal a manter registro específico das audiências, com a relação das pessoas presentes e os assuntos tratados.

Há ainda o artigo 37 da Constituição Federal também estampa o princípio da publicidade, aplicável a todos os Poderes, em todos os níveis de governo. Como regra geral, os atos praticados pelos agentes administrativos não devem ser sigilosos: o processo administrativo deve ser público, acessível ao público em geral, não apenas às partes envolvidas.

Diferentes esferas. Não existe norma que obrigue o Executivo estadual ou municipal a publicar esse tipo de dado. O Ministério Público Federal, no entanto, está tentando mudar isso. O procurador no Ceará Oscar Costa Filho, ingressou, em março de 2015, com uma ação civil pública para garantir a publicidade das agendas de compromissos oficiais de agentes públicos do Poder Executivo em todo o país. A ação pede ainda que os efeitos da lei sejam estendidos ao Poder Judiciário, ao Poder Legislativo e ao Ministério Público da União.

“A iniciativa surgiu pelo fato de não haver transparência em relação as ações oficiais. Isso diz respeito a democracia, e a democracia morre no escuro. Entendemos que a publicidade é indispensável em toda a esfera do poder. A lei de conflito de interesses não é suficiente. O presidente [Michel Temer] recebe 11h da noite no palácio do Jaburu uma pessoa [Joesley batista, do grupo J&F] e deu no que deu. É uma falta de proteção dos próprios agentes públicos.”

No Rio de Janeiro, a falta de publicidade não é novidade. O antigo prefeito Eduardo Paes não divulgava seus compromissos oficiais nem a pedido da imprensa. A falta de publicidade motivou uma campanha popular no site Panela de Pressão. Intitulada “Libera a agenda, Paes!”, os idealizadores pediam mais transparência. “A gente financia a máquina pública, o salário deles, e se pagamos temos direito de saber. Lancei a campanha, mas nunca tive resposta da prefeitura”, afirma Jose Antonio Perez Rojas Mariano de Azevedo, cientista político e assessor parlamentar no Rio de Janeiro.

A gestão de Crivella mantém a tradição da falta de transparência. Em abril deste ano, quando o Aos Fatos tentou avaliar a gestão do prefeito escrutinando sua agenda, a reportagem foi obrigada a recorrer ao perfil pessoal do prefeito no Facebook, onde ele faz o registro de seus compromissos. No site oficial da prefeitura, a equipe de imprensa limita-se a postar notícias esporádicas sobre os eventos em que Crivella esteve presente.

Segundo a assessoria de imprensa do prefeito, isso acontece pelo “dinamismo” de sua agenda. “O prefeito Marcelo Crivella tem uma agenda dinâmica e intensa e, assim que seus compromissos são confirmados, sua assessoria os divulga aos órgãos de imprensa para que se tornem de conhecimento público. A prefeitura, dessa forma, atua com a transparência que norteia a atual administração”, disse.

A divulgação das agendas está de acordo com os princípios de governo aberto. Segundo a Parceria para Governo Aberto ou OGP (do inglês Open Government Partnership), iniciativa internacional que pretende difundir e incentivar globalmente práticas governamentais relacionadas à transparência dos governos, ao acesso à informação pública e à participação social, para um governo ser considerado aberto, ele deve buscar alcançar quatro objetivos: aumentar a disponibilidade de informações sobre atividades governamentais, apoiar a participação social, implementar os padrões mais altos de integridade profissional na administração, ampliar o acesso a novas tecnologias para fins de abertura e prestação de contas.


Veja a tabela com o levantamento completo e detalhado.

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