Aprovada pelo Congresso e sancionada pelo presidente Lula (PT) no último dia 13, a lei que proíbe o uso de celulares e outros dispositivos portáteis pessoais nas escolas passa a valer já no início do ano letivo de 2025. O objetivo da proposta é proteger a saúde mental e física de crianças e adolescentes.
Nas redes, uma parcela dos usuários criticou a medida, alegando que ela supostamente faria parte de um projeto de censura do governo. Publicações desinformativas no X (ex-Twitter), por exemplo, afirmavam que a motivação por trás da sanção seria proteger “professores doutrinadores” de filmagens feitas por alunos.

Rodrigo Nejm, especialista em educação digital do Instituto Alana, nega que a lei tenha qualquer relação com a censura, já que as escolas já possuem regimentos internos que determinam o que pode ou não ser feito dentro da sala de aula.
Segundo ele, a iniciativa é bem-vinda para frear a exploração comercial das plataformas sobre crianças e adolescentes. “Há muitos benefícios no aspecto digital, mas esse modelo de negócios que concentra praticamente todo o tempo de tela dos estudantes não é uma experiência que tenha favorecido a aprendizagem e tampouco a socialização dentro e fora das escolas”.
A seguir, Aos Fatos esclarece as principais dúvidas sobre a nova norma:
- O que diz a lei?
- Todas as escolas serão obrigadas a adotar a medida?
- Há exceções?
- A lei proíbe o uso de redes sociais por menores de 14 anos?
1. O que diz a lei?
A lei nº 15.100/2025 proíbe que estudantes usem aparelhos eletrônicos portáteis pessoais, como celulares e tablets, em estabelecimentos de ensino. A regra, originada do PL 4.932/2024, do deputado federal Alceu Moreira (MDB-RS), deve ser aplicada tanto no período das aulas quanto no recreio e nos intervalos.
Relator do projeto no Senado, o senador Alessandro Vieira (MDB-SE) justificou que todos países que instituíram medidas semelhantes apresentaram melhoria no desempenho escolar, na disciplina e na redução do bullying. A proibição já ocorre em locais como a França, a Espanha, a Itália e a Dinamarca.
Válida para os ensinos público e privado, a proibição ocorre em todos os níveis da educação básica: infantil, fundamental e médio. A mudança entra em vigor já no ano letivo de 2025 e terá um cronograma de implementação gradual:
- Em janeiro, será concluído todo o processo jurídico-legal;
- Em fevereiro, o MEC (Ministério da Educação) disponibilizará uma cartilha e promoverá eventos com a rede de ensino para divulgar boas práticas;
- Em março, deve ocorrer o processo de adaptação junto das comunidades escolares, das famílias e dos alunos.
A lei também determina que as escolas devem criar estratégias e instituir espaços de atendimento a crianças e adolescentes que apresentarem sofrimento psíquico em decorrência da falta de acesso aos aparelhos eletrônicos.
Diferentemente do que afirmam peças desinformativas nas redes, a norma não proíbe que alunos levem celulares para a escola, apenas que eles sejam usados durante a permanência nos estabelecimentos de ensino. Regras sobre a posse dos dispositivos podem ser definidas posteriormente pelas próprias instituições.
Essa não é a primeira norma neste sentido aprovada no Brasil. Em dezembro de 2024, o governo do estado de São Paulo aprovou uma medida que veda o uso de dispositivos eletrônicos portáteis inclusive no intervalo. Outros seis estados também já possuem iniciativas semelhantes.
2. Todas as escolas serão obrigadas a adotar a medida?
Sim, todos os estabelecimentos de ensino da educação básica devem adotar as novas diretrizes. No entanto, o texto não especifica uma penalidade para escolas que não adotarem a medida.
De acordo com Rodrigo Nejm, a lei também não prevê nenhum tipo de punição ou multa para alunos que descumprirem as regras — afinal, não se trata de um crime, e sim de uma conduta escolar. “Isso não significa que não vai acontecer nada, mas que vai ocorrer da mesma forma que acontece para outras violações de regras na escola”, explica.
Nesse contexto, é possível que os alunos que desrespeitarem as regras sejam advertidos ou tenham seus responsáveis convocados pelo colégio. Podem ocorrer também punições mais severas em caso de recorrência, a serem definidas pela própria escola.
3. Há exceções?
Sim. A lei prevê que os aparelhos podem ser usados:
- Em sala de aula, para fins pedagógicos ou didáticos, conforme orientação dos professores;
- Para garantir acessibilidade e inclusão;
- Para atender questões de saúde dos alunos;
- Em situações excepcionais, como estado de perigo, necessidade ou casos de força maior.
Não há orientações no texto sobre como deve ocorrer a comunicação com os responsáveis nestes casos. Cabe às instituições de ensino a criação de um protocolo determinando se estudantes podem usar os aparelhos eletrônicos para falar diretamente com os responsáveis ou se a comunicação ocorrerá somente com a escola.
4. A lei proíbe o uso de redes sociais por menores de 14 anos?
Não, a lei não faz qualquer menção ao uso de redes sociais por menores de 14 anos, diferentemente do que afirmam publicações desinformativas nas redes. O texto aborda estritamente o uso de aparelhos eletrônicos em estabelecimentos escolares.
A preocupação vem na esteira de decisões que não têm relação com o Brasil. Em novembro de 2024, a Austrália aprovou uma lei inédita que proíbe o uso de redes sociais por menores de 16 anos.

Outros governos têm adotado diferentes estratégias para regular o acesso de crianças e adolescentes às redes. Na União Europeia, por exemplo, as plataformas devem requerer autorização dos pais para processar dados de menores de 16 anos — em alguns países do bloco, esse limite pode ser reduzido para até 13 anos.
Nos Estados Unidos, alguns estados também estão criando leis neste sentido. Na Flórida, um reduto conservador, uma norma local proíbe o acesso às redes sociais por menores de 14 anos. Já os adolescentes de 14 e 15 anos devem ter o consentimento dos pais para acessar as plataformas.
No Brasil, há propostas similares em tramitação no Congresso, mas nenhuma norma similar foi aprovada.
O caminho da apuração
Aos Fatos analisou a lei sancionada pelo presidente Lula e apurou informações sobre o tema junto a pesquisadores em educação. Entrevistamos o doutor em psicologia social e especialista em educação digital do Instituto Alana, Rodrigo Nejm.
Além disso, buscamos na imprensa dados sobre propostas de proibição do uso de redes sociais em outros países.